© PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121
Vol. 12 N.o 4. Págs. 673-684. 2014
www .pasosonline.org
* Doutoranda em Administração de Empresas – Fundação Getulio Vargas/EAESP/FGV, e‑mail:
cristianne.brandao@gmail.com
** Doutor em Administração de Empresas EAESP/FGV e‑mail:
jose.barbieri@fgv.br
*** Doutor em Administração de Empresas/UFRR, e‑mail:
edgarreyes2000@yahoo.com.br
**** Mestre em Administração de Empresas – EAESP/FGV, e‑mail:
crismoura81@gmail.com
Resumo: O turismo indígena é um segmento que vem crescendo no mundo todo. Este artigo apresenta
um estudo bibliométrico que analisa a produção científica sobre o campo de estudo do turismo indígena em
periódicos internacionais entre 1990 e 2013. Este estudo faz‑se
relevante dada à tendência crescente em im-plantar
o turismo para possibilitar o desenvolvimento econômico em comunidades indígenas, utilizando seu
território, cultura e história como atrativos potenciais. Ao analisar os artigos publicados, foram identificados
temas centrais, como ecoturismo e turismo sustentável, bem como temas periféricos, como governança e
política pública de turismo. Além disso, a presente pesquisa mostra a centralidade do tema desenvolvimento
sustentável no conjunto dos artigos analisados. O artigo esboça uma agenda de pesquisa, com indicações de
lacunas e sugestões para incentivar pesquisas nesse campo de estudo e assim contribuir para o desenvolvi-mento
sustentável das comunidades indígenas.
Palavras‑chave:
Turismo indígena, desenvolvimento sustentável, turismo sustentável, ecoturismo, produção
científica.
Analysis of the Scientific Production International Indigenous Tourism 1990 to 2013: A bibliomet‑ric
study and proposal of a research agenda
Abstract: Indigenous tourism is a growing segment worldwide. This paper presents a bibliometric study
that analyzes the scientific literature on the field of study of indigenous tourism in international journals
between 1990 and 2013. This study is relevant given the growing trend in tourism deploy to enable economic
development in indigenous communities, using their territory, culture and history as potential attractions.
While parsing published articles central themes such as ecotourism and sustainable tourism were identified
as well as peripheral issues such as governance and public tourism policy. Furthermore, this research shows
the centrality of the issue of sustainable development in all analyzed articles. The article outlines a research
agenda, with indications of gaps and suggestions to encourage research in this field of study and contribute
to the sustainable development of indigenous communities.
Key Words: Indigenous tourism, sustainable development, sustainable tourism, ecotourism, scientific pro-duction.
Análise da produção científica internacional sobre turismo
indígena de 1990 a 2013: um estudo bibliométrico e
proposição de uma agenda de pesquisa
Cristiane Nascimento Brandão* José Carlos Barbieri**
Edgar Reyes Junior*** Cristina de Moura João****
EAESP/Fundação Getulio Vargas (Brasil)
Cristiane Nascimento Brandão, José Carlos Barbieri, Edgar Reyes Junior, Cristina de Moura João
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
674 Análise da produção científica internacional sobre turismo…
1. Introdução
Conforme menciona Weaver (2010), o turismo
indígena é uma modalidade consolidada no contexto
internacional, especialmente na Austrália, Nova
Zelândia e Canadá. Para o autor, tal fato pode ser
constatado no aumento das publicações acerca desse
campo de estudo nesses países. Nesse contexto,
uma tendência observada é que o turismo vem
sendo introduzido nas comunidades indígenas e
outras comunidades étnicas com o objetivo de criar
oportunidades de melhoria nos padrões de vida e
emprego, além de possibilitar o desenvolvimento
econômico desses povos, aproveitando sua cultura,
história e seu território como atrativos potenciais.
Cada vez mais, nota‑se
na produção científica
referente ao tema o aumento da preocupação com a
sustentabilidade da atividade turística. O conceito
de turismo sustentável vem ganhando popularidade
como sendo uma forma de mitigar os efeitos negativos
do turismo e incentivar suas influências positivas.
Porém é ampla a variedade de teorias utili-zadas
para o entendimento dessa realidade. Daí
a necessidade de se realizar o mapeamento dos
temas estudados e publicados a respeito do turismo
indígena, bem como eles se relacionam com outras
formas assemelhadas de turismo, como turismo
de base comunitária, ecoturismo, e etnoturismo e
outros. Da mesma forma é ampla a variedade de
atores sociais envolvidos no fenômeno.
O objetivo deste artigo é, assim, analisar a
produção científica sobre o campo de estudo do
turismo indígena, com vistas a apontar a fronteira
do conhecimento no turismo indígena, dado que
o conhecimento gerado por meio das produções
científicas proporciona a expansão e disseminação
dos estudos da área, bem como apresenta suas
tendências e variações.
Após esta breve introdução, este artigo está
estruturado da seguinte maneira: inicialmente, são
abordadas algumas considerações sobre turismo;
turismo indígena; turismo sustentável; turismo de
base comunitária e desenvolvimento sustentável.
Na sequência, apresenta‑se
a metodologia utilizada
para realizar a pesquisa bibliográfica, os resulta-dos
encontrados e sua análise e uma avaliação
das limitações da pesquisa. Ao final do artigo são
apresentadas considerações sobre eventual agenda
pesquisa sobre turismo indígena com base nos
achados da pesquisa.
2. Referencial teórico
O turismo é um fenômeno de grande importância
social e econômica da sociedade moderna e está
diretamente ligado aos aspectos históricos, como:
aumento do tempo livre, melhorias das comuni-cações,
transporte moderno e urbanização (UN,
2008). Ele ganhou fama de ser uma atividade que
cria oportunidades de negócios, empregos, renda e
divisas, proporcionando serviços como transporte,
alojamento, alimentação, bebidas, viagens, dentre
outros (TIMUR, 2004).
Associado a ideia de que gera desenvolvimento
econômico, o turismo tomou a fama de ser uma
panaceia, solucionando todos os problemas econô-micos
e sociais de localidades em desenvolvimento,
além de auxiliar na proteção de áreas ambientais
(BINNS e NELT, 2002). Entretanto, esta atividade
pode causar impactos negativos, como deterioração
do meio ambiente e distorção de padrões culturais
locais (CABEZAS, 2008). Sendo assim, Alberton et
al. (2009) destaca que é necessário avaliar e plane-jar
sua utilização, tendo em vista as adversidades
que podem ser consequências de uma atividade
turística mal planejada.
Segundo a definição da Organização Mundial do
Turismo (OMT), turismo é o conjunto de atividades
que as pessoas realizam durante viagens e estadas
a lugares distintos de seu entorno habitual, por
um período inferior a um ano, com fins de lazer,
negócios e outros motivos não relacionados com o
exercício de uma atividade remunerada no lugar
visitado (OMT, 2001; UN, 2008).
O Ministério do Turismo adota o conceito defi-nido
no Congresso da Associação Internacional dos
Cientistas Especializados em Turismo (AIEST), em
1981: “turismo é o movimento de pessoas, por tempo
determinado, para destinações fora de seu local de
residência, e as atividades realizadas durante o
tempo de permanência nas localidades visitadas.”
O Ministério também classifica o turismo em doze
segmentos, a saber: turismo cultural, ecoturismo,
turismo de aventura, turismo náutico, turismo de
pesca, turismo de esportes, turismo social, turismo
de estudos e intercâmbio, turismo de sol e praia,
turismo de negócios e eventos, turismo rural e
turismo de saúde (BRASIL, 2007).
Como se vê, apesar da marcante presença da
cultura indígena no Brasil, o turismo indígena
não está entre as modalidades priorizadas pelo
Ministério do Turismo. Esse fato é preocupante
porquanto se sabe que as comunidades indígenas
veem o turismo em suas áreas como uma forma de
desenvolvimento local e divesas iniciativas tribais
já estão em curso no momento para implementação
do turismo nestas áreas, como mostra Brandão
(2013). A ausência do turismo indígena na relação
do Ministério do Turismo denota uma falta de
atenção do poder público para essa modalidade de
turismo que pode ser considerada uma atividade
econômica importante para as comunidades indí-genas
e, consequentemente, de políticas públicas
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
Cristiane Nascimento Brandão, José Carlos Barbieri, Edgar Reyes Junior, Cristina de Moura João 675
específicas para essa modalidade. Muitas dessas
áreas dispõem de atrativos naturais, culturais
e históricos próprios que favorecem a atividade
turística e pode proporcionar benefícios econômicos
significativos a toda comunidade local (OMT, 2001).
2.1. Turismo indígena
O turismo indígena, como campo de estudo
científico, teve início nas pesquisas em antropologia
na década de 1970 (HINCH; BUTLER, 1996) e
apenas em 1990 foi inserido no contexto do desen-volvimento
econômico e estratégico por meio do
estudo da relação entre comunidades indígenas,
áreas protegidas e ecoturismo (SMITH, 2006).
Para a ONU, mais precisamente para o Fórum
Permanente das Nações Unidas sobre Questões
Indígenas de 2009, comunidades, povos e nações in-dígenas
são aqueles que se reconhecem a si mesmos
como pertencentes a um setor distinto da sociedade
e preocupam‑se
em perpetuar às gerações futuras
sua identidade, padrões culturais, territórios an-cestrais,
identidade étnica, instituições sociais e
sistemas jurídicos. Assim, o indígena é aquele que
se identifica como tal e, para sua comunidade, a
continuação de sua cultura e sociedade depende
da manutenção de aspectos importantes, como por
exemplo, o território.
A Agenda 21 ressalta o relacionamento histórico
entre as comunidades indígenas e suas terras.
Segundo a Seção III, Capítulo 26 da Agenda 21,
os indígenas vivem no mesmo território que seus
habitantes originais, garantindo a manutenção e
a continuação do desenvolvimento de um conheci-mento
tradicional e holístico dos recursos naturais
e do meio ambiente que já vinha sendo aperfeiçoado
por seus antecedentes.
A Convenção da Biodiversidade (CDB) estabelece
que cada Estado signatário deve na medida do pos-sível
respeitar, preservar e manter o conhecimento,
inovações e práticas das comunidades locais e
populações indígenas com estilo de vida tradicionais
relevantes à conservação e á utilização sustentável
da diversidade biológica (art. 8º). Ou seja, a CDB
reconhece que as comunidades indígenas estabe-lecem
uma relação importante com o território.
Conforme Swarbrooke (2000) a cultura e o modo
de vida dos pode contribuir para a conservação do
meio ambiente e da biodiversidade local.
Segundo Hinch e Butler (1996), turismo indígena
é uma atividade onde a comunidade indígena está
diretamente envolvida por meio do controle desta
atividade ou por meio da cultura como essência
da atração turística. Assim, os autores destacam
dois conceitos chave para a identificação deste tipo
de turismo: (1) controle pela própria comunidade
que monitora o desenvolvimento da atividade de
acordo com os fatores que considera críticos; e (2)
cultura indígena como atrativo. A ausência da
cultura descaracteriza o turismo indígena que passa
considerado turismo étnico ou outra modalidade
turística. Nesse contexto, Butler (1999) ressalta
a importância do desenvolvimento de um turismo
sustentável, monitorado por indicadores precisos
e confiáveis, de modo que se possam minimizar os
riscos de que a atividade turística não seja benéfica
para os povos indígenas.
2.2. Turismo Sustentável
O conceito de turismo sustentável surgiu ao final
da década de 1960, com a explosão das viagens
e do turismo em massa. Em 1970, começa uma
preocupação com os impactos negativos causados
por esta atividade e então, na década de 1980, com
a influência do conceito de desenvolvimento susten-tável,
o turismo de massa começa a ser questionado
e a expressão “turismo sustentável” passa a ser
utilizada. Dez anos depois, esta expressão torna‑se
frequente, bem como, o papel das comunidades
locais e indígenas começa a ser reconhecido como
facilitadoras deste processo (SWARBROOKE, 2000)
Diferente das outras modalidades classificadas
pelo Ministério do Turismo, o turismo sustentável
pode ser aplicado a todos os outros tipos, ou seja,
esta não é uma forma básica de turismo ou modali-dade
de turismo como seria, por exemplo, turismo
cultural, de esporte ou de pesca, mas uma maneira
de realizar qualquer uma das existentes (NETO,
2003). Essa ideia é central entre as entidades da
ONU como a UNESCO, o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (UNEP) e a Organi-zação
Mundial do Turismo (OMT). Alguns autores
da área defendem que não há definição exata para
o conceito de turismo sustentável e que muitas
vezes ele é entendido como uma ideologia ou ponto
de vista, e não como uma definição operacional
exata (SAARINEN, 2006). Swarbrooke (2000)
corrobora com este ponto de vista, ressaltando
que a interpretação do termo permanece vaga e
sem definição de métodos para sua implementação.
O entendimento mais utilizado e aceito na
literatura de turismo sustentável foi desenvol-vido
pela OMT, para quem o turismo sustentável
favorece uma gestão na qual conserva os recursos
de maneira a satisfazer as necessidades econômicas,
sociais e estéticas mantendo, simultaneamente, a
cultura, o meio ambiente e seus processos vitais e
a biodiversidade. O objetivo deste tipo de turismo
é atender as necessidades atuais dos turistas e
das comunidades receptoras, sem comprometer a
capacidade de atender igualmente as necessidades
das gerações futuras (WTO, 2005). Como se vê esse
entendimento faz eco da amplamente conhecida
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
676 Análise da produção científica internacional sobre turismo…
definição de desenvolvimento constante no Relatório
Brundtland ou também denominado Nosso Futuro
Comum (CMMAD, 1987), assunto que voltará a
ser tratado mais adiante.
Douglas (2006), Ruhanen (2006), Lim e Coo-per
(2009) defendem que os processos de gestão
dos destinos turísticos devem estar sobre uma
estrutura que englobe política, planejamento e
desenvolvimento, para assegurar a distribuição
equitativa dos benefícios do turismo para todas
as partes interessadas, ou seja, os resultados do
turismo sustentável devem satisfazer ambiental,
social e economicamente a todos os stakeholders,
de maneira a encontrar um ponto de equilíbrio
entre as partes envolvidas. Byrd (2007) ressalta
que o turismo possui a natureza intrínseca de gerar
efeitos tanto positivos quanto negativos sobre a
comunidade receptora, sua economia e ao meio
ambiente na localidade. Deste modo, a OMT (2004)
declara que para possibilitar o desenvolvimento de
um turismo sustentável, é necessário monitorar
constantemente os impactos, inserindo medidas
preventivas ou corretivas sempre que necessário,
visando à diminuição dos impactos negativos e a
valorização dos positivos.
Dessa maneira, percebe‑se
que as diretrizes
de desenvolvimento e das práticas de gestão do
turismo sustentável podem ser aplicadas a todas
as modalidades de turismo e para qualquer destino
em que as dimensões ambientais, sociais e econômi-cos
da sustentabilidade devem estar equilibradas
para permitir que a atividade turística em uma
localidade permaneça gerando fatores positivos
por um longo prazo (OMT, 2002).
2.3. Turismo de Base Comunitária
Lopez‑Guszmán
et al (2011) observam que no
início do século XXI, ocorreu uma mudança no
gosto dos turistas, que passaram a buscar por
novas modalidades de turismo. Tal fato pode ter
sido impulsionado pela descoberta de destinos
desconhecidos e inexplorados pela maioria dos
turistas ou até pela vontade de conhecer locais e
comunidades com diferentes costumes, cultura e
história. As comunidades, por sua vez, perceberam
neste interesse uma fonte alternativa de renda e,
portanto, uma possibilidade de diminuir a pobre-za.
Estes dois fatores juntos possibilitaram que
o turismo em comunidades permanecesse até os
dias atuais.
Butts e Singh (2010) definem o turismo de base
comunitária (TBC), como uma maneira de fazer
com que as comunidades se envolvam e participem
ativamente da gestão dos recursos ambientais e
culturais de sua localidade, além de desenvolverem
práticas que incentivem a conservação destes recur-sos.
Dessa maneira, o turismo de base comunitária
contribui para o desenvolvimento sustentável no
longo prazo, além de trazer benefícios imediatos
para as comunidades e para os visitantes (KAL-SON,
2009). O TBC ainda pode ser considerado
um instrumento potencial de inclusão social e de
promoção do desenvolvimento sustentável por
meio de uma participação ativa da população local,
como afirmam Cordioli (2001) e Coriolano (2003).
O TBC, segundo Simpson (2008), difere dos
outras modalidades de turismo principalmente
pelo princípio da transferência de benefícios para
a comunidade receptora, que é a preocupação e o
objetivo central deste tipo de turismo. Segundo o
autor, o TBC está centrado no forncecimento de
meios de subsistência e outros benefícios para
a comunidade como um todo. Lopez‑Guzmán
et
al (2011) salientam que a decisão de explorar os
recursos naturais e culturais da localidade por meio
da elaboração de políticas de desenvolvimento,
deve vir da própria comunidade. Assim, segundo
Maldonado (2009) a atividade turística entra como
um complemento a qualquer atividade tradicional,
fazendo com que esta seja potencializada, ao invés
de ser suprimida. Dessa maneira, o TBC não só
preserva a cultura e os costumes locais por meio
da capacitação e incentivos, mas também desen-volve
novas oportunidades de emprego, reforça
a economia local e proporciona a perpetuação do
conhecimento tradicional, das práticas tradicionais
e, principalmente, incentiva a conscientização
pública (CORDIOLI, 2001; CORIOLANO, 2003;
e BUTTS, 2010).
Dessa maneira, observa‑se
a importância do
TBC para o turismo indígena, onde a conservação
e o uso sustentável do meio ambiente e da cultura
são as engrenagens para o desenvolvimento desta
atividade. Assim, para as comunidades indígenas
em particular é indispensável que a importância
da cultura seja reconhecida. Neste contexto, Fuller
et al, (2007) recomenda que no turismo indígena
sejam incluídos: os componentes natural e cultural;
a sustentabilidade e a educação. Maldonado (2009)
ressalta que o TBC é uma forma de organização
empresarial que tem como base a propriedade e a
autogestão dos recursos das comunidades, sejam
eles ambientais ou culturais. Esta constatação
também converge com a atividade do turismo
indígena, que só é caracterizado como tal quando
possui a participação efetiva da comunidade local
na sua gestão, como destacado anteriormente.
Snow (1998) destaca que, por meio de um pla-nejamento
claro e orientado pelos próprios líderes
(fato que incentiva a comunidade a reconhecer o
planejamento vindo dela própria e não imposto por
atores externos), é menos provável que o turismo
cause impactos negativos. Neste sentido, o TBC é
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
Cristiane Nascimento Brandão, José Carlos Barbieri, Edgar Reyes Junior, Cristina de Moura João 677
um grande aliado, pois incentiva a comunidade a
se apropriar dos recursos endógenos e da atividade
turística.
2.4. Desenvolvimento Sustentável
A ideia de preservar o meio natural e social sem
prejudicar o desenvolvimento econômico tomou for-ma
a partir da década de 1970, quando numerosos
informes abordando o tema foram publicados. Um
dos primeiros e mais relevantes documentos até os
dias atuais é a declaração final da Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano,
realizada em 1972 em Estocolmo. A declaração
ressalta a necessidade de unir a humanidade no
esforço da preservação e melhoria do ambiente
humano e traz a preocupação com a manutenção
deste ambiente para as gerações futuras (UNEP,
1972).
A preocupação com as próximas gerações foi
também citada em 1987, no lançamento do Re-latório
Brundtland, comentado anteriormente,
que ressaltou a necessidade de um novo modelo
de desenvolvimento, mais efetivo no sentido de
integrar o crescimento econômico, a distribuição
mais igualitária de riquezas e a conservação do meio
ambiente, de modo a satisfazer as necessidades do
presente sem comprometer as gerações futuras,
conforme a famosa definição de desenvolvimento
sustentável (CMMAD, 1991). Contudo, foi em 1992
na Conferência das Nações Unidas para o Meio
ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), também
conhecida como “Rio‑92”
ou “Cúpula da Terra”, que
a expressão desenvolvimento sustentável passou
a ser mais conhecida e utilizada. Foi também
nesta Conferência que foi aprovada a Agenda 21,
a Convenção da Mudança do Clima, a Convenção
da Biodiversidade e a Declaração do Rio de Janeiro
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento contendo
27 princípios para orientar as nações a buscar um
desenvolvimento eqüitativo que respeite o meio
ambiente. O princípio 22 da Declaração estabelece
que:
“... as populações indígenas e suas comunidades,
bem como outras comunidades locais, têm papel
fundamental na gestão do meio ambiente e no de-senvolvimento,
em virtude de seus conhecimentos e
práticas tradicionais. Os Estados devem reconhecer
a identidade, cultura e interesses dessas populações
e comunidades, bem como habilitá‑las
a participar
efetivamente da promoção do desenvolvimento
sustentável.”
Lelé (1991) afirma que movimento do desenvol-vimento
sustentável não configurou um conjunto
de conceitos, políticas critérios robustos. Segundo
ele, a eliminação da pobreza e da degradação am-biental
não seria apenas por meio do crescimento
econômico, pois a ocorrência delas é motivada
também por causas estruturais, tecnológicas e
culturais. Assim, ele ressalta que a sustentabi-lidade
possui múltiplas dimensões e que devem
ser desenvolvidos critérios, padrões, princípios
compatíveis com níveis de sustentabilidade que,
por sua vez, seriam baseados nas diferentes noções
de equidade e justiça social.
Sachs (1993), diante desta complexidade,
desdobra a sustentabilidade do desenvolvimento
em dimensões que devem ser operacionalizadas
simultaneamente. A dimensão ambiental tem
por objetivo a redução do consumo de recursos
naturais, de emissões de poluentes e de produção
de resíduos; a dimensão social visa a melhoria
das condições de vida das populações por meio
da redução das diferenças sociais e garantia dos
direitos humanos; a dimensão econômica busca
alcançar uma gestão eficiente dos e a manutenção
de fluxos de regulares de investimentos públicos
e privados; a dimensão cultural refere‑se
á busca
de concepções endógenas de desenvolvimento que
respeitem as peculiaridades de cada ecossistema,
de cada cultura e cada local; a dimensão especial
visa a obtenção de um equilíbrio espacial basea-do
em uma melhor distribuição rural e urbana
do território. A Comissão Mundial de Cultura e
Desenvolvimento criada pela UNESCO mostra
que as formas de desenvolvimento também são
determinadas por fatores culturais e não devem ser
considerados como conceitos separados e estanques,
pois o desenvolvimento e a economia fazem parte ou
constituem aspectos da própria cultura de um povo.
Passado mais de 40 anos, os entendimentos sobre
desenvolvimento sustentável continuam gerando
polêmicas intermináveis, as críticas são muitas
e variadas, como as que sublinham o seu caráter
propositadamente vago com vistas a alcançar uma
ampla adesão. Apesar disso, segundo a opinião de
Barbieri et al (2010) o desenvolvimento sustentável
ensejou um dos movimentos sociais mais importan-tes
deste início de século como pode ser atestado por
incontáveis iniciativas em todo mundo conduzidas
por empresas, governos, entidades da sociedade
civil, comunidades de todo tipo e tamanho, inclusive
as tradicionais e indígenas. As questões centrais do
desenvolvimento sustentável, como aquecimento
global, segurança alimentar, redução da miséria em
todo o mundo, educação para todos durante toda
a vida, estão entre as principais preocupações dos
seres humanos na atualidade. Outro fato que atesta
a importância desse movimento é a incorporação dos
seus princípios e objetivos em todas as atividades
importantes como é caso do turismo sustentável
comentado anteriormente.
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
678 Análise da produção científica internacional sobre turismo…
3. Metodologia
Para se analisar o campo do turismo indígena
fez‑se
uma análise das publicações em periódicos
internacionais da área, no período de 1990 a 2012.
Para tal, utilizou‑se
a bobliometria, que segundo
Pritchard (1969) e Spinak (1998) consagrou‑se
como
método multidisciplinar que analisa os aspectos
mais importantes da produção científica com
aplicação de análises estatísticas e matemáticas.
Nesse contexto, o método é aplicado quando se
pretende conhecer o estado da arte de diferentes
áreas do conhecimento, bem como estudar as carac-terísticas,
evolução, tendências e elaborar mapas
que representem de forma adequada os aspectos
quantitativos do conhecimento científico (Araújo,
2006; Santos e Kobashi, 2009).
A pesquisa estabeleceu um corte de vinte e dois
anos. As buscas foram realizadas nas seguintes
bases de dados: EBSCOhost, EMERALD, JStor; e
Science Direct ‑
principais bases de dados onde se
encontram estudos sobre administração e turismo.
Para a seleção dos artigos foram utilizadas uma
combinação de palavras chave, entre elas: “eth-nic
tourism”; “indigenous tourism”; “tourism in
protected areas+indigenous people”; “sustainable
indigenous tourism”; “indigenous ecotourism”;
“community‑based
tourism+ indigenous people”;
“sustainable development + indigenous people”
e “indigenous ecological tourism”. Como critério
de seleção, o artigo analisado deveria citar, no
resumo e no corpo do trabalho, pelo menos uma das
palavras mencionadas acima. Foram selecionados
125 artigos, os quais foram lidos e classificados
conforme mostra o Quadro 1.
Dos artigos selecionados, foram identificadas 90
variáveis dos critérios apresentados no Quadro 1,
que foram tabuladas de forma a assumir um valor
dicotômico, ou seja, o valor “1” para a existência no
artigo e o valor “0” para a não existência. Sendo
que mais de uma variável poderia ser escolhida
para uma mesma dimensão de análise, conforme
características do artigo analisado.
Para a análise dos dados, utilizou‑se
a Análise
de Redes Sociais ‑
ARS (Social Network Analysis),
por meio dos softwares UCINET 6.171 e Netdraw
2.065. A ARS foi utilizada com o objetivo de entender
como as teorias abordadas nos artigos se relacionam
(Wasserman e Faust, 1994) no campo de estudo
do turismo indígena, bem como identificar temas
centrais e periféricos nessa área de estudos. Nesse
contexto, visando à comparação da centralidade dos
temas abordados, foram utilizadas três medidas,
a saber: centralidade de grau (Degree), centrali-dade
geodésica (Eigenvector) e a centralidade de
intermediação (Betweenness).
Segundo Wasserman e Faust (1994), no grau de
centralidade os atores centrais possuem a maioria
dos laços, sendo, portanto, os mais ativos. Já a
centralidade de intermediação indica o grau em
que uma teoria focal está localizada no caminho
mais curto de ligação entre qualquer outra teoria.
De outro modo, um ator atua como o elo entre duas
variáveis que não estejam diretamente conecta-das
(Wasserman e Faust, 1994). A centralidade
geodésica de um conceito é igual à soma de suas
conexões com outros conceitos, ponderada pela
centralidade de cada um destes outros conceitos
(Bonacich, 1972, 1987 apud Oliver e Ebers, 1998).
Quanto maior for a centralidade geodésica de um
determinado conceito, maior será o seu poder, em
função de seu contato com atores distribuídos por
toda a extensão da rede. De acordo com Wasserman
e Faust (1994), a denominação “ator” pode se referir
a pessoas, grupos, organizações, entre outros. Nesse
trabalho, os atores são as abordagens teóricas
identificadas na análise dos artigos.
4. Resultados
Nessa sessão, é apresentada a análise descritiva
dos artigos publicados nos últimos vinte e dois anos,
referentes ao campo de pesquisa sobre turismo
indígena. Quanto aos periódicos em que os artigos
foram publicados, a maioria encontra‑se
no Annals of
Classificação Descrição
Ano Ano em que o artigo foi publicado.
Periódico Periódico em que o artigo foi publicado.
Tipo de artigo Teórico, empírico ou revisão de literatura.
Abordagem teórica Quais teorias ou tópicos obtiveram maior relevância no escopo do artigo.
Procedência geográfica Continente ou região em que o artigo foi realizado (Europa, África, Ásia,
Oceania, América do Sul, América Central, América do Norte).
Unidade de análise Atores sociais considerados nos estudos: comunidade local, setor privado
ONGs, Governo, turistas, parque nacional, outros.
Quadro 1. Critérios de classificação dos artigos
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Cristiane Nascimento Brandão, José Carlos Barbieri, Edgar Reyes Junior, Cristina de Moura João 679
Tourism Research com 25,60% dos artigos. Seguido
pelo Journal of Sustainable Tourism com 12% (am-bos
do Reino Unido) e pelo Tourism Management que
apresentou 10,40% do total de artigos analisados,
conforme se observa na Figura 1.
Na sequência, com 5,60% está o Worldwide
Hospitality and Tourism; com 4% o International
Journal of Contemporary Hospitality Management;
com 3,2% o Sustainable Development e, por fim,
com 2,4% o Journal of Enterprising Communities.
Juntos, os periódicos mencionados são responsáveis
por mais de 60% de toda a publicação do campo de
pesquisa do turismo indígena.
Figura 1. Participação dos diferentes
periódicos na divulgação do campo
Outros 36,8% das publicações são provenientes
de periódicos diversos que contabilizaram apenas
um artigo cada. A maioria desses periódicos não está
diretamente relacionada ao estudo do turismo, como
por exemplo, o Human Rights Quartely, Pacific
Affairs, Journal of the Southwest, Social & Cul‑tural
Geography, American Geographical Society,
Geographycal Review. Exceto os três últimos, que
por serem da área de geografia, facilmente abordam
o turismo.
Quanto à evolução da produção científica do
campo de estudo do turismo indígena, a Figura
2 mostra que o número de artigos publicados
manteve‑se
baixo durante a primeira metade da
década de 1990, tendo aumentado rapidamente
a partir de 1995. Nos anos seguintes, a produção
manteve‑se
com uma de três artigos por ano.
A partir de 2000 a produção de estudos na área
volta a aumentar e, se manteve crescente até os
dias atuais, fato que demonstra um interesse reno-vado
entre autores internacionais em disseminar
conhecimento nesse campo de estudo. Esses dados
estão de acordo com as observações de Hinch; Butler
(1996) e Smith (2006), comentadas na seção 1.1
deste artigo.
Figura 2. Evolução e tendência da
produção científica do campo (1990 – 2013)
Figura 3. Teorias/temas de maior
relevância no escopo dos trabalhos
15%
13%
11%
9%
8%
7%
5% 5% 4% 4% 4%
3%
2% 2% 2%
1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1%
0%
2%
4%
6%
8%
10%
12%
14%
16%
18%
A análise dos artigos identificou 24 tópicos de
relevância (teorias), conforme Figura 3. As abor-dagens
teóricas que apresentaram os maiores
percentuais foram: turismo (presente em 15% dos
artigos), seguida por turismo sustentável com 13%.
O tema Desenvolvimento sustentável está presen-te
em 12% das publicações, etnoturismo e turismo
indígena apareceram em 9% e 8%, respectivamente,
e turismo de base comunitária esteve presente
em 7% dos artigos analisados. Por meio da ampla
gama de artigos que abordaram as temáticas tu‑rismo
sustentável e desenvolvimento sustentável,
verifica‑se
que, apesar do conceito turismo ser o
grande campo de pesquisa, existe uma precupação
crescente com a sustentabilidade dessa atividade.
A análise seguinte refere‑se
ao poder relacional
das abordagens teóricas, ou seja, mapear e identifi-car
as relações de poder entre as diferentes teorias
que permeiam o campo de estudos do turismo
indígena. A teoria com maior grau de centralidade
é a de desenvolvimento sustentável com 0,783,
seguida pelo turismo sustentável com 0,739, o
que significa que essas duas temáticas são as que
mais influenciam as demais teorias do subcampo.
De outra maneira, são abordagens teóricas que
possuem a maioria dos laços e são, portanto, as
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
680 Análise da produção científica internacional sobre turismo…
Grau Geodésica Intermediação
Desenvolvimento Sustentável 0,783 0,448 0,135
Turismo Sustentável 0,739 0,445 0,137
Turismo Indígena 0,696 0,398 0,141
Turismo 0,696 0,441 0,052
Turismo de Base Comunitária 0,696 0,428 0,096
Ecoturismo 0,609 0,364 0,08
Ecoturismo Indígena 0,609 0,406 0,032
Sustentabilidade 0,533 0,353 0,015
Empoderamento 0,478 0,328 0,012
Planejamento Participativo do Turismo 0,435 0,300 0,008
Stakeholder 0,435 0,302 0,011
Gestão do Turismo 0,391 0,264 0,012
Etnoturismo 0,348 0,183 0,022
Parceria Público Privada 0,304 0,209 0,000
Impactos do Turismo 0,304 0,194 0,002
Indicadores de Sustentabilidade do Turismo 0,261 0,192 0,000
Empreendedorismo 0,261 0,194 0,000
Política Pública de Turismo 0,261 0,188 0,001
Outros temas 0,261 0,177 0,002
Governança 0,217 0,105 0,005
Ecoturismo de Base Comunitária 0,174 0,08 0,002
Marketing 0,130 0,054 0,001
Redução da Pobreza 0,130 0,081 0,000
Pegada Ecológica 0,087 0,041 0,000
Medidas de Centralidade
Temas abordados
Tabela 1. Poder relacional das abordagens teóricas
mais ativas na rede, conforme mostra a Tabela 1.
Em seguida, estão presentes o turismo indígena;
turismo e turismo de base comunitária, todas
com 0,696. Na sequência, com 0,609, ecoturismo
e ecoturismo indígena, respectivamente.
Observa‑se
que turismo indígena; turismo e
turismo de base comunitária (TBC) também são
atores conectados a um grande número de outras
abordagens teóricas, bem como, as temáticas ecotu‑rismo
e ecoturismo indígena. Quanto à centralidade
geodésica, os temas desenvolvimento sustentável
(0,448); turismo sustentável (0,445); turismo (0,441);
TBC (0,428) e ecoturismo indígena (0,406) são
considerados pontes teóricas, ou seja, estão ligadas
a um grande número de outras teorias. São temas
centrais, dado seu contato com outros atores na
rede, como é possível observar na Tabela 1.
Quanto à centralidade de intermediação, apre-sentaram
os maiores valores o turismo sustentável
(0,175); turismo indígena (0,141) e desenvolvimento
sustentável (0,135). O resultado indica que estas
abordagens teóricas apresentam‑se
como elos
entre outros atores dispostos na rede, ou seja,
são capazes de conectar outros temas que não
estejam diretamente ligados. Por exemplo, o tema
turismo sustentável é um elo entre a temática
pegada ecológica do turismo e desenvolvimento
sustentável (Tabela 1).
A Figura 4 é representação do conjunto de
relações desta análise. Nesse contexto, foram
identificadas cinco facções, ou seja, cinco diferen-tes
grupos. Sendo um grupo central (cor preta)
formado por desenvolvimento sustentável, parceria
público‑privada,
indicadores de sustentabilidade
do turismo e redução da pobreza. Uma segunda
facção (azul) é formada por turismo sustentável,
turismo, turismo de base comunitária, ecoturismo
indígena, planejamento participativo do turismo,
stakeholder, empoderamento, sustentabilidade e
pegada ecológica do turismo.
O terceiro grupo (vermelho) envolve os temas
turismo indígena, empreendedorismo e política
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
Cristiane Nascimento Brandão, José Carlos Barbieri, Edgar Reyes Junior, Cristina de Moura João 681
pública de turismo; a quarta facção (cinza) é re-presentado
por ecoturismo, ecoturismo de base
comunitária, governança e gestão do turismo e, por
fim, o quinto grupo (rosa), onde estão presentes as
discussões acerca do etnoturismo indígena, marke‑ting,
impactos do turismo, dentre outros temas.
Vale ressaltar que alguns temas mais periféricos,
que são os mais distantes dos centrais (por exemplo:
gestão do turismo, planejamento participativo do
turismo, parceria público‑privado
e indicadores de
sustentabilidade) apareceram com diversos laços e,
ainda que intermediados por teorias mais centrais,
acabam se relacionando com turismo sustentável e
desenvolvimento sustentável. Esse resultado está
de acordo com diversos autores ligados à pratica do
turismo que afirmam ser de fundamental impor-tância
o planejamento do turismo, a elaboração e
utilização de indicadores de sustentabilidade para
melhorar a gestão do turismo, a participação da
comunidade local no planejamento e monitoramento
das atividade, e as parcerias que reúnam governo,
iniciativa privada e comunidades (Douglas, 2006;
Ruhanen, 2006; Lim e Cooper, 2009).
Quanto ao tipo de artigo, verificou‑se
que os
esforços de publicação são maiores em termos empí-ricos
(66,4%), o que pode indicar uma preocupação
em conhecer a realidade do turismo indígena como
parte da um campo de estudo. Já as revisões de
literatura totalizaram 18,4% e os estudos teóricos
compreenderam 14% dos artigos, conforme Figura
5 (cor azul).
A Figura 5 destaca na cor verde a distribui-ção
geográfica das publicações. Parte expressiva
dos artigos publicados é proveniente da Oceania
(23,44%), especificamente da Austrália e Nova
Zelândia onde o turismo indígena se apresenta
como um segmento consolidado, com forte apoio go-vernamental
e investimentos vultosos da iniciativa
privada. Em seguida, se destaca a Ásia (20,31%)
e as demais publicações estão representadas pela
América do Norte (14,06%), seguida pela América
do Sul (13,28%).
Figura 5. Tipo de artigo, distribuição
geográfica e objeto de analise das
publicações do campo
Nota‑se
também a participação da América do
Sul, especificamente Chile, Colômbia e Guiana,
cujas comunidades indígenas foram objeto de estudo
de diversos artigos. No entanto, o percentual de
publicações desses países não faz jus a importância
das suas comunidades indígenas com iniciativas
em turismo. O Brasil não aparece representado.
A África, apesar de apresentar diversos casos de
etnoturismo, foi mencionada em apenas 4,69% dos
Figura 4. Mapa relacional e facções das teorias
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
682 Análise da produção científica internacional sobre turismo…
artigos; a América Central em 3,91% dos casos,
com destaque para o Panamá e, por fim, a Europa
com 2,34%.
Quanto aos objetos de análise considerados nos
artigos pesquisados, a Figura 5 mostra destacado na
cor laranja, que grande parte dos estudos envolveu
o termo comunidade local (indígena) onde o turismo
é praticado (57,79%). Em seguida, com menos de
10% cada, estão governo, turistas, setor privado,
ONGs e parques nacionais. Por fim, 18,83% não
especificaram (NE).
5. Discussão
A análise da produção científica acerca da
temática sobre o turismo indígena possibilitou
diversas reflexões que reforçam a importância e
permitem a proposição de uma Agenda de Pesquisa
para este campo de estudo. A necessidade de uma
agenda de pesquisa se deve em primeiro lugar ao
nível incipiente desta área de estudo. Apesar das
diversas iniciativas de turismo indígena espalha-das,
poucas foram estudadas do ponto de vista da
ciência da administração. Os estudos que abordam
a questão são, em sua maioria, provenientes da área
de antropologia, influenciados pelas atividades de
órgãos governamentais responsáveis pela execução
de políticas indigenistas. Dessa maneira, o turis-mo
indígena como negócio capaz de possibilitar o
desenvolvimento endógeno das comunidades, como
colocam Lopez‑Guzmán
et al (2011), Butts; Singh
(2010) e Kalson (2009), tem sido pouco explorado.
Outro motivo para a agenda de pesquisa é neces-sidade
de interagir com pesquisadores dessa área
em diferentes países para atuação conjunta, no
intuito de identificarem‑se
similaridades históricas,
culturais e ambientais.
O campo parece explorar o tema desenvolvimento
sustentável, entretanto, a subárea desenvolvimento
local permanece pouco mencionada. Alguns temas
como empoderamento e redução da pobreza foram
abordados em poucos artigos, cabendo um maior
aprofundamento, tendo em vista sua relação com
o desenvolvimento local sustentável. Já a área do
turismo, foi desdobrada em três subáreas: gestão
do turismo, segmentação do turismo e turismo
sustentável.
Diversos temas com abordagem periférica nos
estudos revisados foram alocados dentro das su-báreas
acima mencionadas, assim, recomenda‑se
o
aprofundamento das pesquisas nesses temas. Por
exemplo, políticas públicas de turismo é um tema
que merece atenção dada à urgência de se criar
uma política de turismo que contemple o turismo
indígena como uma modalidade reconhecida; ou-tro
exemplo é o caso do etnoturismo, geralmente
mencionado como sinônimo de turismo indígena,
quando na verdade, este último é uma modalidade
de etnoturismo (Smith, 1989). Tais esclarecimentos
precisam ser desfeitos com o objetivo de alcançar
um melhor entendimento sobre estes conceitos.
O tema pegada ecológica no turismo é utilizado
como indicador para comparar diferentes opções
de hospedagem, transportes, lazer e alimentação,
esclarecendo ao turista qual das opções é a mais
sustentável ou ecológica, pode ser mais adequa-damente
explorado. Outro tema relevante e que
tem recebido pouca atenção (no caso das pesquisas
sobre turismo indígena), refere‑se
aos impactos
do turismo, pois para desenvolver um turismo
sustentável, é necessário monitorar constantemente
os impactos, por meio de medidas preventivas e/
ou corretivas visando à diminuição dos impactos
negativos e a valorização dos positivos (OMT, 2004).
Por fim, o ecoturismo de base comunitária, que
para Butts e Singh (2010) é uma forma de fazer
com que as comunidades se envolvam e participem
ativamente da gestão dos seus recursos ambientais
e culturais e desenvolverem o ecoturismo como
forma de incentivar a preservação destes recursos,
da mesma forma, permanece pouco estudado.
6. Conclusões
Essa pesquisa teve como objetivo analisar a
produção científica sobre o turismo indígena per-mitindo
a compreensão do conhecimento da área
de estudo do turismo indígena. Foram analisados
os tipos de artigo, os periódicos, sua localização
geográfica, bem como temas de maior relevância
nos estudos.
A pesquisa explicita as relações entre os temas
turismo, povos indígenas e o desenvolvimento
sustentável. Verificou‑se
que na maior parte dos
trabalhos, o conceito de desenvolvimento sustentá-vel
está presente, assim como turismo sustentável,
o que mostra uma constante preocupação com a
sustentabilidade indígena.
Com relação à agenda de pesquisa, a mesma se
propõe a preencher algumas lacunas observadas
na produção científica da área de turismo indígena.
Ressalta‑se
que esses gaps indicam a possibilidade
de expansão do campo de estudo de forma a ampliar
e disseminar conhecimento, bem como caracte-rizam
oportunidades de pesquisas e publicações
futuras. Tais estudos poderiam ainda, subsidiar
a elaboração de projetos e políticas públicas para
a consolidação do turismo indígena como uma
modalidade reconhecida pelo governo brasileiro.
Quanto às limitações deste estudo, pode‑se
ressaltar que não foram analisados os métodos
de pesquisa, autores e afiliação. Como esperado,
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. 12 (4). 2014 ISSN 1695-7121
Cristiane Nascimento Brandão, José Carlos Barbieri, Edgar Reyes Junior, Cristina de Moura João 683
não foram encontrados artigos de pesquisadores
brasileiros publicados em nenhum dos periódicos
analisados neste estudo. Como não faltam iniciati-vas
de turismo indígena no País, pode‑se
inferir que
os acadêmicos ligados à administração e turismo
ainda não despertaram para esse assunto, talvez
porque as questões indígenas ainda entendidas
como territórios exclusivos dos antropólogos vincu-lados
aos órgãos governamentais ligados á política
indigenista.
Ressalta‑se
que um estudo bibliométrico poderia
ainda relacionar os principais autores de uma área,
bem como sua afiliação e relação com outros autores
do campo, porém optou‑se
por não abordar tais
características, que podem ser tópicos de pesquisas
futuras. Para pesquisas futuras, sugere‑se
verificar
a concordância e adesão de outros pesquisadores da
área acerca da agenda proposta. Este artigo pre-tende,
ainda, incentivar o aumento da publicação
de pesquisas apresentando iniciativas de turismo
indígena, que poderiam enriquecer o campo. Outra
sugestão é a elaboração de pesquisa conjunta com
pesquisadores internacionais da área.
O turismo indígena é uma modalidade de turis-mo
importante não apenas pelo número crescente
de iniciativas que estão surgindo como alternativas
para o desenvolvimento econômico e social das co-munidades
indígenas e o fim da tutela estatal, mas
também pelo que significa em termos ambientais
e das culturas tradicionais que se mostraram ser
apropriadas para a conservação dos ecossistemas.
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Recibido: 16/03/2012
Reenviado: 15/01/2014
Aceptado: 17/03/2014
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