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Turismo e fronteira: integração cultural e tensões identitárias
na divisa do Brasil com o Paraguai
Álvaro Banducci Júniori
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Resumo: As fronteiras espaciais são contextos significativos de demarcação de diferenças e de
classificações da alteridade entre povos e culturas contíguos. Constituem-se em locais de integração
e de hibridismos e ao mesmo tempo em ambiente de conflitos. A atividade turística, de forma
semelhante, ao movimentar grandes contingentes humanos, em busca de lazer e de entretenimento,
propicia o contato freqüente entre povos e culturas, desencadeando distintos contextos de diálogo e
de confronto intercultural. Constituem-se assim, tanto os territórios geográficos limítrofes quanto
os territórios turísticos, em espaços formadores de fronteiras simbólicas, contextos privilegiados
para a investigação da natureza das identidades, na medida em que fomentam relações de alteridade
e a dinâmica das representações de si e do “outro”. Este trabalho visa discutir o modo como o
turismo, num território de fronteira política, nas cidades gêmeas de Ponta Porã (BR) e Pedro Juan
Caballero (PY), tem contribuído para instituir contextos de fronteiras simbólicas em Mato Grosso
do Sul.
Palavras-chave: Fronteira; Turismo; Diálogo cultural; Confronto; Identidade.
Title: Tourism and frontiers: cultural integration and identity tension at Brazil –Paraguay border
Abstract: Spatial boundaries are significant contexts for the demarcation of difference and
otherness between adjacent peoples and cultures. They consist of local integration and hybrids,
but also are environments of conflict. Tourism, while moving large numbers of human beings in
search of leisure and entertainment, provides also frequent contacts between peoples and cultures,
triggering distinct contexts of intercultural dialogue and confrontation. So geographic frontier
territories as well as tourism territories turn into places of symbolic boundaries, privileged contexts
for investigating the nature of identities, to the extent that they foster relations of otherness and
the dynamics of representations of self and “other “. This paper aims to discuss how tourism, in a
territory of frontier at the twin cities of Ponta Pora (BR) and Pedro Juan Caballero (PY), has helped
to establish the contexts of symbolic boundaries in Mato Grosso do Sul
Keywords: Frontier; Tourism; Cultural dialogue; Confrontation; Identity.
© PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121
iDoutor em Antropologia Social. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail: banducci@uol.com.br
Vol. 9(3) Special Issue págs. 7-18. 2011
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(3). Special Issue. 2011 ISSN 1695-7121
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Introdução
Antropólogos, envolvidos com a temáti-ca
do turismo, têm dedicado especial aten-ção
à mobilidade de grandes contingentes
humanos, em busca de lazer e de entrete-nimento,
e dos efeitos desses deslocamen-tos
sobre as sociedades receptoras e sobre
os próprios viajantes e seu ambiente de
origem. Como tal, os estudos nesse cam-po
da antropologia têm trazido novos e
instigantes elementos para as discussões
sobre contatos, trocas e conflitos étnicos e
sociais, que têm lugar nas sociedades hu-manas,
ao mesmo tempo em que apontam
para novas abordagens sobre temas caros
à antropologia, tais como mudança cultu-ral,
autenticidade, identidade, etnicidade,
entre outros.
O enfoque dessas pesquisas freqüente-mente
circunscreve-se ao âmbito das po-pulações
em contato, tratando, sobretudo,
dos impactos sofridos pelas populações
receptoras em decorrência da presença
estrangeira. As reações desses grupos
quando em interação com estrangeiros,
as mudanças e resistências sociais e cul-turais
que mobilizam diante do “outro”,
as releituras e ressignificações de seus
valores são, do mesmo modo, objeto de es-tudo
de sociólogos e antropólogos. Mas, a
presença do turismo não apenas promove
o contato do “nativo” com o estrangeiro,
desencadeando processos culturais de in-teração
e de resistência, mas constitui-se
num mecanismo complexo de criação de
barreiras sociais e espaços liminares, seja
de tensão ou encantamento, que muito se
aproximam das situações de fronteiras
políticas e espaciais, que se materializam
nos contextos mais diversos onde se de-senvolve
a atividade.
De um lado, ao promover o contato
entre povos distintos constitui um ter-ritório
fértil em relações de alteridade,
importante para se conhecer a dinâmica
das identidades, pois ao mesmo tempo em
que interagem as culturas dialeticamente
afirmam suas diferenças e contradições.
De outro, insere as localidades no contex-to
do mercado global e da cultura mun-dializada,
desencadeando processos de
interações transnacionais, de dimensões
significativas, que mobilizam parâmetros
e representações locais e de âmbito nacio-nal
a fim de dialogar e se contrapor às re-ferências
externas.
Partindo desse princípio, de que o tu-rismo
é um formador de fronteiras, este
trabalho se propõe buscar, nos enfoques
antropológicos dispensados à análise e
compreensão das relações fronteiriças,
elementos que sirvam como indicadores
que auxiliem na interpretação de novas
dimensões do fenômeno turístico. Para
tanto se vale de uma experiência turís-tica
em território fronteiriço sul-mato-
-grossense, a que acontece na divisa entre
Ponta Porã (BR) e Pedro Juan Caballero
(PY).
Localização das cidades fronteiriças
de Pedro Juan Caballero (PY) e Ponta
Porã (BR). (Fonte: www.google.com.br/
imgres?imgurl=http://www.biblioteca.ifc-
-camboriu.edu.br – modificado; 2011).
Fronteira: breve aporte conceitual
A noção de fronteira não raro é asso-ciada
à idéia de limite, de barreira, que
determina territórios e estabelece descon-tinuidades,
impedindo a livre comunica-ção
e contato entre os povos que habitam
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esses espaços. De outro lado, a visão ro-mântica
associa fronteira a populações
unidas fraternalmente, ainda que sepa-radas
por uma linha divisória que lhes é
exteriormente imposta. Mais que isso, po-rém,
a fronteira, como salienta Raffestin
(2005), é um fato social de uma riqueza
considerável, que compreende aspectos
físicos, morais, políticos, religiosos e cul-turais
de diversas ordens. É um espaço
de tensão e contradição entre aquele que
cruza a fronteira e o que a reforça (Albu-querque,
2009).
No campo da antropologia, se, há
muitas décadas1, a temática da fronteira
desperta a atenção de seus pensadores,
é a partir do final do século XX e início
do século XXI, com o advento da chama-da
globalização e dos processos a ela as-sociados
– tais como a migração intensa,
a ampliação das zonas de contato e, em
contrapartida, as imposições de barreiras
territoriais e identitárias – que o tema ga-nha
destaque e inspira um volume cres-cente
de investigações.
As pesquisas voltaram-se para o le-vantamento
e interpretação das microrre-lações
e das trocas econômicas e culturais
que acontecem em decorrência dos fluxos
transfronteiriços de bens, pessoas e sím-bolos
e, da mesma forma, preocuparam-se
em identificar o papel dos territórios e das
populações “periféricos/as” na construção
do estado e da nacionalidade, que antes
restringiam-se às zonas consideradas cen-trais.
De acordo com Grimson (2005),
o enfoque contemporâneo, que estimu-la
esses estudos, visa analisar como as
negociações identitárias nas fronteiras
afetam a construção de novos senti-dos
da nacionalidade e, inversamente,
como as novas políticas definidas desde
os centros político-econômicos trans-formam
a vida cotidiana e a experiên-cia
das populações locais (p. 22).
É nesse aspecto que, ao ressaltar a im-portância
do estudo da fronteira, Sahlins
(2000) destaca a sua contribuição no sen-tido
de evidenciar o papel dos grupos lo-cais
como agentes e atores históricos na
formação de identidades e territórios.
Encontrar nas fronteiras – nacionais
ou turísticas – espaços dinâmicos e de-mocráticos,
de livre circulação e contato
intenso entre pessoas e culturas é, des-se
modo, tão factível e produtivo para a
análise quanto revelar os elementos que
identificam e mantêm separados os gru-pos
em interação. O conceito de fronteira
étnica tem se mostrado uma ferramenta
teórica importante no sentido de alertar
o pesquisador, em meio à complexidade
que permeia os ambientes de contato cul-tural
intenso, para a necessidade de se
ater tanto aos setores de articulação local
quanto às dicotomias dos sistemas que in-vestiga.
Tal como afirma Fredrik Barth
(1998: 196)
onde indivíduos de culturas diferentes
interagem poder-se-ia esperar que [as]
diferenças se reduzissem, uma vez que
a interação simultaneamente requer
e cria uma congruência de códigos e
valores [...] Assim, a persistência de
grupos étnicos em contato implica não
apenas critérios e sinais de identifica-ção,
mas igualmente uma estrutura-ção
da interação que permite a persis-tência
das diferenças culturais
Ao se perceberem como estrangeiros,
os grupos étnicos [compostos de pesso-as
que compartilham comportamentos e
critérios de avaliação e julgamento par-ticulares],
reconhecem diferenças que os
singularizam. Interesses, valores, juízos
acerca do outro, são parâmetros exercita-dos
no dia-a-dia e que tendem a limitar as
interações sociais, ao mesmo tempo que
reforçam a coesão interna dos grupos em
contato.
A relevância da contribuição de Barth
para o estudo da fronteira advém desse
autor separar como distintas, em seus es-tudos
sobre identidade étnica, a dimensão
da ‘organização social’ e da cultura (Car-doso
de Oliveira e Baines, 2005). Barth
argumenta que a ordem cultural pode
mudar significativamente sem que mu-danças
equivalentes ocorram na identida-de
étnica do grupo, tal como Cardoso de
Oliveira demonstrou em relação aos Te-rena
que, mesmo havendo migrado para
as cidades, mantinham suas referências
identitárias indígenas.
Álvaro Banducci Júnior
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(3). Special Issue. 2011 ISSN 1695-7121
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Isso significa que a natureza da iden-tidade
étnica não guarda qualquer homo-logia
com a da cultura, ainda que ambas
mantenham estreita interação. A rigor, os
elementos ditos culturais sempre estarão
a serviço da identidade como sinais dia-críticos,
diferenciadores, manejados pelos
indivíduos e grupos para marcar simboli-camente
suas respectivas especificidades
(Cardoso de Oliveira e Baines, 2005: 11).
Os sistemas interétnicos, por seu lado,
guardam, em termos estruturais, estreita
relação com os sistemas de interação en-tre
nacionalidades, tal como os que ocor-rem
em áreas de fronteira internacional.
Para Grimson (2000), a noção de fronteira
étnica, tal como definida por Barth, é bas-tante
útil no estudo das fronteiras inte-restatais,
na medida em que as identida-des
fronteiriças, numa situação de contato
permanente entre povos, não necessaria-mente
remetem ao compartilhar de sím-bolos
e referências homogêneas, mas, ao
contrário, mesmo quando sujeitas a influ-ências
culturais e de mercado externas
pautadas em lógica semelhante, são as
suas diferenças e singularidades que se
vêem estimuladas no âmbito das relações
cotidianas (Grimson, 2000). O autor en-tende,
no entanto, que a fronteira étnica
é um fenômeno situacional e não primor-dial
na análise das relações transfrontei-riças.
Para ele, é necessário considerar
que as fronteiras são produto de acordos
históricos e de relações de força que di-zem
respeito não apenas às populações
locais, mas expressam políticas e relações
de força de estados nacionais. Assim, não
se deve ignorar, na análise das realidades
transfronteiriças, as relações centro-peri-feria
que acontecem em âmbito nacional,
atentando para as influências dos centros
de poder na vida dos núcleos de fronteira,
bem como as políticas internacionais que
influenciam nas decisões internas de cada
nação.
Cardoso de Oliveira, por sua vez, cor-robora
essa visão afirmando que, no caso
da situação de fronteira, mais do que a et-nicidade,
o determinador social, político e
cultural, passa a ser a nacionalidade dos
agentes sociais. O antropólogo chama a
atenção para a existência de um quadro
de referência internacional, configurado
por um processo transnacional, que apon-ta
para o caráter dinâmico das relações
sociais nesses territórios limítrofes. As-sim,
como diz o autor,
da mesma maneira que na confron-tação
entre identidades étnicas (...),
agora, no caso de nacionalidades, será
num espaço internacional marcado
pela contigüidade de nacionalidades
distintas (e no interior dessas, supos-tamente,
de etnias diversas) que surge
o foco privilegiado de investigação: não
mais o sistema interétnico, (...) mas o
sistema inter e transnacional, visto
em termos das nacionalidades em con-junção
(Cardoso de Oliveira e Baines,
2005: 15).
Pode-se inferir, com base no que foi
exposto até o momento, que as fronteiras
constituem, primeiramente, espaços de
contato social e de intercâmbio cultural,
ao mesmo tempo em que são territórios de
tensão e contradições. Estão ligadas aos
centros político-econômicos de cada país,
sofrendo influências das políticas nacio-nais
e, ao mesmo tempo, contribuindo
para a construção de novos sentidos de
nacionalidade. Por fim, que operam con-forme
determinações de políticas inter e
transnacionais, cujas flutuações orientam
comportamentos e sentimentos mútuos
na vida cotidiana dos núcleos humanos
contíguos. Em outros termos, as frontei-ras
compreendem redes de relações e de
influências sociais, culturais e políticas
que transcendem os espaços locais para
abranger contextos nacionais e interna-cionais
mais amplos.
O turismo, da mesma forma, na me-dida
em que propicia o contato entre dis-tintas
culturas, não apenas promove o
encontro e o diálogo de identidades, mas
cria ambientes de negociações e conflitos
sociais, de resistência e confrontos
políticos que advêm de condições históricas
internas, assim como das contradições co-locadas
pela situação de contato entre so-ciedades
e culturas diversas. O benefício
de se recorrer ao enfoque das fronteiras
para se compreender essas dimensões do
Turismo e fronteira: integração cultural e tensões identitárias na divisa do Brasil com o Paraguai
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PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(3). Special Issue. 2011 ISSN 1695-7121
fenômeno turístico, decorre, pois, do fato
de remeter a um contexto que expõe ten-sões
dialéticas tanto das relações locais
e cotidianas quanto da modernidade oci-dental,
que impõe a presença estrangei-ra,
sua cultura e referência de mundo, e
a lógica de mercado que regulamenta sua
presença. Se o turismo desencadeia tais
redes de relações e significados, o faz, so-bretudo,
em decorrência das situações de
confronto social e cultural que promove
entre povos distantes, criando contextos
liminares e tensos, próprios dos espaços
fronteiriços. Cabe, por fim, revelar como
esta situação se manifesta empiricamente
a partir da observação de um empreendi-mento
turístico de Mato Grosso do Sul.
Fronteira Brasil – Paraguai e o Tu-rismo
em Pedro Juan Caballero (PY)
A experiência a ser observada neste es-tudo
é a do turismo que se desenvolve em
território de fronteira entre o Mato Gros-so
do Sul e o Distrito de Amambay (PY),
compreendendo as cidades gêmeas de Pon-ta
Porã (BR) e Pedro Juan Caballero (PY).
Esses dois núcleos caracterizam-se por um
elevado e constante fluxo de pessoas e de
mercadorias, facilitado por sua condição
de conurbação. A linha de fronteira, que
demarca o limite internacional no con-texto
urbano, constitui-se numa estreita
faixa de terra, com aproximadamente 13
km de extensão, tangenciada pela Aveni-da
Internacional, no lado brasileiro, e pela
Rua Dr. Francia, no lado paraguaio. As
duas cidades se desenvolveram ao longo
dessa linha divisória, através da qual se
estabeleceram as casas comerciais e as
residências de paraguaios e de brasileiros
(Lamberti e Oliveira, 2008).
A disposição das cidades permite o
transitar constante da população através
da linha de fronteira, em função de traba-lho
ou em busca de serviços públicos, como
saúde e educação, propiciando uma ex-pressiva
interação entre seus moradores,
que compartilham vivências, costumes
e valores, configurando o que os geógra-fos
costumam denominar territorialida-de
fronteiriça (Oliveira, 2005; Martins,
2007; Müller, 2008). A convivência pací-fica
não se traduz, entretanto, num conví-vio
fraterno e harmonioso entre os povos
paraguaio e brasileiro. Existe uma riva-lidade
histórica, que advém do período da
Guerra com o Paraguai2, em função da
qual são disseminadas imagens negativas
do Brasil, visto como nação imperialista
e usurpadora de territórios, enquanto que
seu povo é tido como arrogante e presun-çoso.
Os brasileiros, por seu lado nutrem
uma imagem do Paraguai como país atra-sado,
subdesenvolvido, com um povo pou-co
empreendedor, violento e desleal.
Essas representações e estereótipos
são alimentados pela presença marcante
do turismo de compras em Pedro Juan
Caballero que, centrado no comércio de
produtos importados, mobiliza a economia
e o cotidiano das duas cidades, atraindo
Álvaro Banducci Júnior
Mercado informal presente na principal via de
comércio de Pedro Juan Caballero (PY). (Foto:
Álvaro Banducci Jr. 2008)
Marco divisório das cidades conurbadas de Ponta
Porã (BR) e Pedro Juan Caballero (PY). (Foto:
Álvaro Banducci Jr. 2008).
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para a região um volume considerável de
visitantes provenientes de Mato Grosso
do Sul e de estados vizinhos. É também o
turismo, e o comércio de importação a ele
associado, que coloca esse pequeno terri-tório
fronteiriço no contexto mais amplo
da economia global e em sintonia com as
novidades do mercado internacional. Jun-tamente
com a importação de produtos da
mais alta tecnologia atrai para a região
capital estrangeiro, desencadeando um
movimento migratório importante, que
inclui comerciantes de origem árabe, asi-ática
e brasileira que ali instalam peque-nos
negócios e empresas.
Esses investimentos mobilizam, por
sua vez, trabalhadores fronteiriços brasi-leiros
e do interior paraguaio, que para ali
se dirigem em busca de oportunidades de
emprego para si e seus familiares. O tu-rismo,
portanto, promove novos arranjos
territoriais, mobilizando pessoas, capital
e bens simbólicos, alimentando as refe-rências
sobre o “outro” e reordenando as
situações de contato e interação. Do mes-mo
modo, induz a que práticas ilegais ou
não regulamentadas, tais como o comércio
informal e o contrabando, ganhem novos
atores, que modificam as relações de força
entre os mandatários locais, obrigando a
sociedade a se ajustar às novas conforma-ções
sociais ditadas pelo crime e a ilega-lidade.
As referências globais e a agitação do
turismo em Pedro Juan Caballero, que
impõem um ritmo acelerado ao ambiente
do comércio local, contrastam com um co-tidiano
pacato e provinciano da cidade. De
um lado, impera não apenas a referência
tecnológica e a atualidade dos produtos,
que por si mesmos exigem o domínio de
uma linguagem específica e conhecimen-to
técnico especializado, mas a lógica de
sua comercialização, que impõe um rit-mo
diferenciado à vida do trabalhador,
obrigando-o a mudar de hábitos e adaptar
costumes para atender à demanda do co-mércio
re-exportador. De outro lado, exis-te
a vida imperturbável, que nas tardes
calorentas atrai para as calçadas paren-tes
e amigos nas “rodas de tereré”3; há os
quintais arborizados, com o imprescindí-vel
“tataquá”, forno de barro no qual as
donas-de-casa, em trabalho geralmente
coletivo, assam os quitutes costumeiros,
como chipa e sopa paraguaia4, para o con-sumo
da família e das visitas; e existe a
tradição religiosa de um povo, que ao mes-clar
elementos da cultura hispânica com a
herança guarani, faz de suas celebrações
religiosas ocasiões festivas e de forte de-voção
popular (Banducci e Romero, 2005).
Os paraguaios são reconhecidos, inclu-sive
pelos moradores de Ponta Porã, por
seu fervor religioso, a ponto de atrair fiéis
da cidade vizinha para participar de seus
cultos e celebrações5.
Em meio a uma multiplicidade de re-ferências
simbólicas e temporais, de espa-cialidades
que remetem a ritmos distintos
e de territorialidades construídas a par-
Turismo e fronteira: integração cultural e tensões identitárias na divisa do Brasil com o Paraguai
Celebração da Sexta-feira da Paixão no Paraguai.
A população acorre em grande número aos
cemitérios a fim de homenagear seus mortos,
participar de cultos e rituais católicos e encontrar-se
com parentes e amigos. (Foto: Álvaro Banducci
Jr., 2008)
Tataquá com uma forma de sopa paraguaia (à
esquerda) e de chipas (ao centro). (Foto: Álvaro
Banducci Jr., 2005).
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tir de processos de interação e confronto
entre dois povos, o turismo, tanto desen-cadeia
o diálogo intercultural quanto pro-move
mobilizações internas, como proces-sos
migratórios, gerando tensões sociais
e políticas, e acirrando os sentimentos
nacionalistas, seja em relação aos brasi-leiros,
vizinhos históricos, seja em rela-ção
aos novos imigrantes estrangeiros ali
instalados em função do comércio de pro-dutos
importados. Os conflitos culturais
entre imigrantes e nativos paraguaios,
os estereótipos construídos nesse cenário
de fronteiras simbólicas e territoriais e o
quadro de expansão do capital tendem a
acirrar as tensões entre as comunidades
nacionais, orientando comportamentos e
sentimentos específicos das populações
de ambos os lados da fronteira, como se
poderá observar nas experiências que se
seguem.
Migrações internas e fluxos frontei-riços
Se a fronteira do Brasil com o Paraguai
é local de trânsito permanente de bens e
pessoas, uma série de outros fluxos têm
lugar na divisa entre os dois países, des-de
o comércio de produtos ilícitos, o tráfi-co
de drogas, até o movimento de capital
e de força de trabalho estrangeiros. Nas
últimas décadas, os movimentos migrató-rios,
que acontecem nos dois sentidos da
fronteira, têm contribuído para acirrar os
conflitos entre os moradores fronteiriços.
O baixo preço da terra no Paraguai e
a facilidade de crédito agrícola atraíram o
interesse de latifundiários brasileiros que
passaram a adquirir terras nos departa-mentos
limítrofes do Brasil, dentre eles
Canindeyú e Amambay que fazem divi-sa
com Mato Grosso do Sul6. Juntamente
com os grandes proprietários – e os tra-balhadores
por eles arregimentados para
derrubar matas, plantar pastos ou culti-var
os campos – houve uma considerável
penetração de pequenos agricultores e ar-rendatários
brasileiros que, em função de
indenizações recebidas com a implantação
da usina de Itaipu7, acabaram por adqui-rir
terras e se instalar no Paraguai8.
A investida do capital sojicultor – gran-des
empresários produtores de soja, inte-ressados
em terras de baixo custo – sobre-tudo
de origem brasileira, mas também
alemã e italiana, provocou um processo
de concentração de terras, que desenca-deou
um amplo movimento migratório do
campo para a cidade, cujos efeitos se fi-zeram
sentir na fronteira do Brasil com
o Paraguai. De acordo com Albuquerque
(2009), com a chegada do capital interna-cional,
A partir do final da década de 1970 e
início dos anos 1980, ampliam-se os pro-cessos
de mecanização e de concentração
da propriedade da terra [na] faixa de
fronteira. [...] Nesse contexto, aumentam
as compras de terra aos camponeses pa-raguaios
e aos pequenos produtores brasi-leiros.
A pequena produção diversificada
e de subsistência (milho, mandioca etc.)
passa a ser substituída pelo plantio de
soja. Nesse processo, começam os desloca-mentos
de camponeses paraguaios e bra-sileiros
para outras frentes agrícolas no
interior do Paraguai e para as periferias
das cidades de fronteira (p. 143).
As cidades de Pedro Juan Caballero,
Ciudad del Leste e Salto Guairá, na di-visa
com o Brasil, e Encarnación, na di-visa
com a Argentina (Oliveira, 2005 e
Albuquerque, 2009), tornaram-se pólo de
atração desses imigrantes camponeses,
que chegam à cidade, após um período
de resistência às frentes de expansão do
capital no campo, trazendo as marcas de
um confronto de dimensões não apenas de
classe, mas internacional e civilizatório9.
As disputas entre camponeses e plan-tadores
de soja se transformam num con-fronto
entre brasileiros e paraguaios. Os
sentimentos nacionalistas em relação ao
território e à língua guarani e os ressenti-mentos
do período da ‘Guerra do Paraguai’
afloram nos discursos dos camponeses pa-raguaios
e os brasileiros são acusados de
‘invasores’, ‘novos bandeirantes’, ‘herança
de Stroessner’ etc. (Albuquerque, 2009:
9).
Os imigrantes brasileiros, por seu
lado, ao assumirem também uma pos-tura
nacionalista, disseminam, para
Álvaro Banducci Júnior
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(3). Special Issue. 2011 ISSN 1695-7121
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além do campo, uma imagem negativa
do povo paraguaio, espelhados no que
consideram ser sua superioridade tec-nológica
e cultural. Provenientes de
um país moderno e desenvolvido, os
bem-sucedidos fazendeiros e empresá-rios
brasileiros em terras paraguaias,
compartilham o sentimento de serem
eles próprios agentes redentores, mis-sionários
da civilização, exemplo de
trabalho e pioneirismo a ser seguido
pelos naturais da terra (Albuquerque,
2009).
As imagens do povo paraguaio, com-partilhadas
e difundidas pelos brasilei-ros,
seja no contexto da disputa pela terra
ou do mercado turístico, desencadeiam re-ações
políticas e identitárias que confron-tam
as diferenças culturais e de poder.
Como diz Albuquerque (2009), a auto-
-identificação dos imigrantes como ‘traba-lhadores’,
‘pioneiros’ e a classificação dos
paraguaios como ‘preguiçosos’, ‘corruptos’
e ‘subdesenvolvidos’ simbolizam assime-trias
de poder entre as classes sociais e
as nações. Mas as relações de poder en-tre
os grupos sociais não são estáticas e
consolidadas. Os grupos subordinados
podem adquirir força política e atacar os
interesses e as identidades dos grupos es-tabelecidos.
A dinâmica de poder entre os
grupos redefine as identidades coletivas
(p 10).
Em meio às disputas políticas e iden-titárias,
ao confronto cultural e naciona-lista,
o Brasil não raras vezes é acusado,
nas vozes de políticos, sindicalistas e jor-nalistas
paraguaios, de país imperialista
(Sprandel, 2000). A língua, a história,
as práticas religiosas, os valores e tra-dições
do povo paraguaio, passam a ser,
então, exaltados como parâmetro de na-cionalidade
frente ao avanço da cultura
e da pretensa superioridade do “outro”.
À modernidade imposta pelo estrangei-ro,
narcísico e arrogante, contrapõe-se a
tradição, um fator relevante de afirmação
identitária e resistência ideológica.
No entanto, é essa mesma modernida-de,
negada, que se difunde, de forma cres-cente
no ambiente do turismo, afetando o
cotidiano do trabalhador do comércio de
importados de Pedro Juan Caballero. Ele
tende a articular e negociar com freqüên-cia
crescente as referências de significado
em torno de um “nós” tradicional, que a
princípio estaria apegado aos costumes e
valores nacionais, e um “outro” moderno,
pouco confiável e distante, porém tanto
mais próximo desde que o trabalhador,
ele próprio, tem seu cotidiano dominado
por um contexto de mudanças que impõe
de forma crescente a lógica da alteridade
como parâmetro de mundo.
Se as contradições da modernidade
repercutem e ganham sentido em âmbito
local, a tradição, ou as práticas e valo-res
que se constituem em parâmetro de
representação da identidade local, pode
Turismo e fronteira: integração cultural e tensões identitárias na divisa do Brasil com o Paraguai
Estacioneras cantam em cemitério por ocasião da
Sexta-feira da Paixão no Paraguai. (Foto: Álvaro
Banducci Jr., 2008).
A presença de estacioneros se faz sentir também em
território brasileiro, como na região rural de Bela
Vista (MS), quando saem em romaria na noite da
Quinta-feira Santa, detendo-se para rezar diante de
altares previamente armados pela população para
recebê-los. (Foto: Álvaro Banducci Jr,, 2009).
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induzir, também, a novos e inusitados ar-ranjos
sociais. O imigrante camponês, por
exemplo, o elemento marginalizado ou,
na perspectiva do trabalhador do comér-cio
formal, o competidor desleal por atuar
no comércio informal, pode se constituir
no depositário dos valores mais caros à
tradição e, como tal, no portador das re-ferências
simbólicas que se contrapõem
à alteridade. Em pesquisas anteriores
(Banducci Jr e Romero, 2005 e Banducci
Jr e Amizo, 2009), identificou-se entre os
trabalhadores da linha de fronteira, que
haviam migrado havia pouco tempo para
a cidade de Pedro Juan Caballero, alguns
representantes ativos – não raro líderes
– de práticas religiosas que vinham per-dendo
vigor na comunidade pedrojuanina,
como é o caso dos rituais dos estacione-ros,
cantores das estações de Cristo que
se apresentam por ocasião da Semana
Santa em várias localidades do Paraguai.
O domínio dessas práticas, profundamen-te
arraigadas aos costumes religiosos do
povo paraguaio, ainda que venham per-dendo
vitalidade, instrumentalizam esses
trabalhadores nas negociações em torno
de sua inserção no contexto social fron-teiriço,
constituindo eles próprios em de-positários
das referências mais caras da
nacionalidade paraguaia.
Assim, compreender a experiência tu-rística
nesse espaço implica em conhecer
os inúmeros fluxos, de pessoas e de capital
que mobiliza, bem como os fluxos de signi-ficado
que alimentam as redes de relações
do povo paraguaio entre si e deste com os
estrangeiros, sejam os vizinhos morado-res
de Ponta Porã (MS), sejam os turistas
que para ali afluem em número crescen-te.
Nesse contexto, dicotomias tais como
centro e periferia, nacional e estrangeiro,
rural e urbano, tradição e modernidade
ganham novas articulações e sentido no
âmbito, e por influência, do turismo, ins-taurando
novos parâmetros de represen-tação
acerca de si e do outro.
Conclusão
No momento em que grandes proje-tos
de integração regional se consolidam
através do mundo, tais como União Eu-ropéia,
MERCOSUL, Nafta, Comuni-dade
Andina (Masi, 2008), entre outros,
alimentando discursos políticos e acadê-micos
sobre um possível desaparecimen-to
das fronteiras, autores como Rafestin
(2005) e Oliveira (2005), no campo da ge-ografia,
e Canclini (1998), Grimson (2000
e 2005), Albuquerque (2009), entre outros
nas ciências sociais, argumentam que se
trata de um fenômeno bastante mais com-plexo
e repleto de contradições. Conforme
demonstram em seus estudos, mesmo que
constituam locais de encontros e de trocas
materiais e simbólicas, as fronteiras con-tinuam
a impor barreiras e limites, sejam
alfandegários, migratórios ou identitá-rios,
e a desencadear conflitos entre povos
em contato intenso (Grimson, 2000).
O turismo, ao promover o contato entre
povos distintos, estimulando trocas cultu-rais
e o confronto de identidades, cria, tal
como nos territórios fronteiriços, espaços
liminares, permeados de diálogos e ten-sões,
que remetem tanto às condições do
contato em si, quanto às ingerências de
ordem nacional e transnacional que o tor-nam
possível.
Nesse sentido, o que as experiências
aqui expostas pretenderam demonstrar
é que no estudo das interações sociocul-turais
propiciadas pelo turismo, ademais
dos aspectos da identidade, da etnicidade,
do intercâmbio e mudanças culturais ad-vindos
do contato com o “outro”, a expe-riência
turística revela, e permite obser-var,
como as relações políticas, sociais e
culturais decorrentes do contato entre po-vos
distintos, evidenciam tanto as regras
e contradições próprias da experiência
histórica e social interna de cada grupo,
quanto refletem as determinações nacio-nais
e internacionais mais amplas, sejam
de caráter econômico ou político, que re-percutem
no cotidiano e na prática do con-tato
com o estrangeiro nos espaços onde a
atividade se desenvolve.
No caso do turismo na fronteira do
Brasil com o Paraguai, condições históri-cas
ditam as regras do contato, alimenta-das
por acontecimentos conjunturais, que
conformam a dinâmica da representação
Álvaro Banducci Júnior
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e da relação com a alteridade, que é ao
mesmo tempo o vizinho e o estrangeiro.
Políticas nacionais e internacionais, como
a ocupação do território paraguaio por
produtores de soja brasileiros, acabam por
definir novas visões e relações dos para-guaios
com os turistas e os próprios mora-dores
de Ponta Porã. Ao mesmo tempo, o
comércio de produtos importados e o con-tato
com a tecnologia globalizada, induz
no habitante do território paraguaio, uma
nova percepção de mundo e de si mesmo,
trazendo novos parâmetros para o diálo-go
entre povos e identidades nesse espaço
fronteiriço.
Cabe destacar, por fim, que o turismo,
tal como os territórios de fronteira, ao
mesmo tempo em que demonstra ser um
fenômeno propiciador de intensas relações
interculturais, implicando em trocas ma-teriais
e simbólicas, constitui-se também
num ambiente de tensão e de contradições
sociais. A experiência do contato propicia-da
pelo turismo é uma circunstância de
permanentes negociações identitárias e
políticas, um contexto marcado por uma
linha tênue entre o intercâmbio e o confli-to
de idéias e valores históricos, sociais e
culturais.
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NOTAS
1 E. Leach, em seu estudo sobre Burma, de 1960, já proble-matizava
a noção convencional de fronteira política (Han-nerz,
1997) e, como salienta Grimson (2000:13), no livro
Ritos de passagem Van Gennep nos legou um dos mais bri-lhantes
trabalhos sobre fronteira num sentido metafórico.
2 A Guerra com o Paraguai, ou Guerra Grande, foi um
dos maiores conflitos armados ocorridos na América do
Sul, envolvendo o Paraguai e os países da Tríplice Aliança
(Brasil, Argentina e Uruguai), seus adversários. O confli-to,
que durou de 1864 a 1870, desencadeou-se sobretudo
em razão de disputas em torno de limites territoriais, do
interesse pela navegação nos rios da Bacia do Prata e de
antigas rivalidades entre os países envolvidos. O Paraguai,
país protagonista da guerra, teve que enfrentar a resistên-cia
e contra-ofensiva da Tríplice Aliança, sucumbindo a
suas forças no ano de 1870, estando o país economicamen-te
arrasado e abalado pela perda substantiva de vidas, fosse
de militares ou civis, acometidos pela fome e por doenças.
3 Muito comum nas cidades paraguaias, e disseminada
também por todo o Mato Grosso do Sul, a roda de tereré
é uma espécie de ritual de sociabilidade, em que grupos
de pessoas se reúnem periodicamente para desfrutar da
bebida e manter longas e aprazíveis conversas. O tereré é
uma bebida à base de erva mate, à qual se adiciona água
gelada, que é sorvida com o uso de uma bomba, ou canudo
de metal destinado a esse fim.
4 Chipa e sopa paraguaia constituem dois itens muito po-pulares
na culinária paraguaia, sendo a primeira uma es-pécie
de bolo feito de queijo e polvilho e a segunda uma
torta salgada de milho assada.
5 Do mesmo modo, é muito comum encontrar, em terri-tório
sul-mato-grossense fronteiriço, nas pequenas ci-dades
que fazem divisa com o Paraguai, cultos e rituais
religiosos daquele povo sendo praticados por brasileiros,
descendentes ou não de paraguaios, influenciados pela
cultura religiosa do país vizinho. Assim, existem grupos
organizados de estacioneros que atuam na cidade de Bela
Vista (MS), vizinha de Bella Vista Norte (PY); há grandes
celebrações dedicadas à Virgem de Caacupé, padroeira do
Paraguai, em inúmeras cidades de Mato Grosso do Sul;
os cemitérios de Ponta Porã e de Bela Vista abrem suas
portas, na Sexta-feira Santa, para receberem visitantes pa-raguaios
e brasileiros, que ali celebram a Paixão de Cristo;
entre outras manifestações e costumes próprios do país
vizinho.
6 De acordo com Sprandel (2000), as primeiras entradas
de grandes proprietários de terras brasileiros em territó-rio
paraguaio aconteceram na década de 1950, no início
do governo de Alfredo Stroessner, ditador que presidiu o
Paraguai por 35 anos, entre 1954 e 1989. Mas foi a partir
da década de 1970 que a migração brasileira em direção
ao Paraguai se intensificou, criando-se colônias e até cida-des
com população majoritariamente brasileira, tais como
Santa Rita, Santa Rosa de Monday, Naranjal, San Alberto,
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entre outras.
7 A maior usina geradora de energia elétrica do mundo,
Itaipu, concebida a partir de um acordo binacional Brasil
– Paraguai, foi construída entre os anos de 1975 e 1982 na
fronteira entre os dois países. O reservatório gerado com a
instalação da usina inundou uma área de aproximadamen-te
1300 km2, desalojando mais de 40 mil moradores que
viviam em pequenas e grandes propriedades rurais, além
de vilas, situadas ao longo do rio Paraná.
8 Essas famílias, compostas de arrendatários e de traba-lhadores
rurais, vieram a ser conhecidas mais tarde como
“brasiguaios”. Desalojadas do campo, em função da me-canização
das lavouras ou e do processo de concentração
das terras, em 1985 iniciam, de forma organizada, seu
regresso ao Brasil, reivindicando terras e infra-estrutura
para produção (Sprandel, 2000).
9 Ao trazer para a cidade as marcas dos embates no campo,
os trabalhadores transferem para o contexto urbano suas
disputas de identidade, fomentando as representações va-riadas
sobre os brasileiros e os paraguaios (Albuquerque,
2009). Sem preparo técnico ou treinamento adequado para
o comércio especializado, esses trabalhadores são absor-vidos
pelo mercado informal, como o pequeno comércio
e atividades como as de camelôs ou ambulantes, que os
coloca numa situação de marginalidade, exigindo novas
e penosas formas de integração, acirrando os conflitos no
contexto da fronteira.
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Aceptado:
Sometido a evaluación por pares anónimos
20/10/ 2010
21/12/2010
Turismo e fronteira: integração cultural e tensões identitárias na divisa do Brasil com o Paraguai