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www.pasosonline.org Vol. 9 Nº 2 págs. 327-340. 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: O caso da Vila de Paranapiacaba Marcius Fabius Carvalhoi Ernesto Michelangelo Giglioii i Redes de Negócios e Cadeias de Suprimentos - Programa de Mestrado em Administração UNIP- Universidade Paulista e Pesquisador do Centro de Tecnologia da Informação- CTI em São Paulo- Brasil. Email: marcius. carvalho@pesquisador.cnpq.br ii Professor da disciplina de Redes de Negócios do Programa de Mestrado em Administração da UNIP- Univer-sidade Paulista em São Paulo- Brasil. Email: ernesto_giglio@yahoo.com.br © PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121 Universidade Paulista (Brasil) Resumo: O trabalho analisa a dinâmica das redes de empresas nas dimensões econômicas, téc-nicas e sociais, mostrando que as relações mudam conforme os objetivos econômicos e políticos. Afirma-se que as redes se transformam ao longo do tempo surgindo diferentes estruturas e formas de relações, com variados graus de flexibilidade, inovação e cultura, em contrapartida à visão de que elas nascem e morrem. O trabalho analisa a evolução do ambiente da Vila de Paranapiacaba, no Es-tado de São Paulo, desde sua criação até a situação atual, utilizando documentos, acompanhamento e entrevistas e conclui que Paranapiacaba passou por quatro diferentes configurações de redes. Na atualidade predomina o objetivo de turismo, que regula as relações sociais e de negócios. Os dados sustentam a afirmativa da evolução das redes. Palavras-chave: Redes; Desenvolvimento local; Evolução de redes; Modelos em redes; Objetivos econômicos e redes. Title: The dynamics of the network from a social perspective: The case of Vila Paranapiacaba Abstract: The study analyzes the dynamic networks in the economic, technical and social dimen-sions, that indicates the change of relations with the economic and political objectives. It is stated that the networks evolve over time, emerging new structures and forms of relationships, with various degrees of flexibility, innovation and culture, as opposed to a view that a network born and die. The study examines the evolution of the Village of Paranapiacaba environment, in São Paulo, Brazil, sin-ce its creation to the current state, through documents, observation and interviews and conclude that the Village went through four different networks configurations. Now the predominance is tourism objective, which regulates the social and business relations. The results support the affirmative of networks evolution. Keywords: Networks; Local development; Networks evolution; Networks models; Economics ob-jectives and networks. 328 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ... ISSN 1695-7121 Introdução Concentrações geográficas de empresas e instituições interconectadas, em um campo particular, podem criar vantagem competitiva (Porter, 1998). Estas concen-trações ocorrem por fatores diversos e no caso de gran-des empresas, elas se dirigem à determinada região de um país à busca de incentivos fiscais e outras facilida-des como mão de obra mais barata, maior número de horas trabalhadas e, no sentido de transferirem inves-timentos e incertezas para seus parceiros, estabelecem formas de gestão e de produção que contribuem para a convergência de empresas fornecedoras para a mesma região. Cria-se uma competência local como é o caso dos consórcios e condomínios, para montagem modular, que proliferam nas áreas automotivas, de equipamentos ele-trônicos, de vestuário, incentivando o desenvolvimento de habilidades locais. A habilidade de uma região em desenvolver-se em determinado ramo de negócios pode ocorrer também por questões históricas, principalmente quando apoiadas pela Tecnologia de Informação, que aparece como ferra-menta facilitadora de parcerias, encurtando distâncias, promovendo a visibilidade do produto e gerando o mes-mo efeito das habilidades incentivadas. Identificados os fatores locais como fundamentais para o acompanhamento da dinâmica torna-se impor-tante estudá-los e entendê-los nas suas diferentes for-mas. Embora os conceitos e posições apresentadas a seguir possam ser adaptados para qualquer dos agru-pamentos acima, ou seja, para os induzidos por grandes empresas ou os históricos, este texto toma os arranjos produtivos locais como elemento de análise, para desen-volvimento de conceitos a serem aplicados em um am-biente. Assim, o objetivo deste trabalho é analisar a dinâ-mica das redes de empresas nas dimensões econômi-cas, técnicas e sociais, a partir do estudo de um caso, afirmando e mostrando que as relações mudam com os rumos econômicos e políticos em que a rede está inseri-da. Esta afirmativa de transformação das redes é uma contraposição a uma visão de que as redes nascem e mo-rrem, oriunda principalmente da literatura americana, mais interessada nos contratos temporais de redes, tais como joint-ventures e alianças (Grandori, Soda, 1995). Nossa afirmativa orientadora é que ocorrem evoluções na rede as quais podem ser adequadamente analisadas se usarmos os fatores de relacionamentos entre os ato-res, os recursos, os objetivos e as atividades deles deco-rrentes. A proposta apóia-se em modelos já existentes, tais como o ARA – Actors, Resources, Activities (Hakan-son, Snehota, 1995), porém voltado a serviços e refazen-do a conjunção dos fatores. A partir desta proposta analisamos um caso, mos-trando que no espaço turístico esta evolução é motivada por fatores culturais, históricos e econômicos. O artigo se justifica uma vez que há uma crescente discussão e busca de aplicação dos conceitos na gerên-cia de redes, mais acentuadamente nos negócios de serviços, como turismo e saúde. Antes da metodologia, apresentamos alguns conceitos básicos sobre redes que apóiam a proposta. Arranjos produtivos Arranjos produtivos se constituem em um tipo par-ticular de aglomerado, formado por pequenas e médias empresas, com as mesmas habilidades, ou habilidades complementares; agrupadas em torno de uma profissão ou de um negócio, onde se destaca o papel desempen-hado pelos relacionamentos formais e informais entre empresas locais e demais instituições envolvidas. Os atores de uma determinada concentração compartilham uma cultura comum e interagem, como um grupo, com o ambiente sociocultural. Quando não há significativa articulação entre os atores, além de pouca ou nenhuma inovação, as concentrações são chamadas de arranjos produtivos locais. Quando o conjunto de atores econô-micos, políticos e sociais, de uma concentração geográ-fica, desenvolve atividades econômicas correlatas que apresentam vínculos expressivos de produção, iteração, cooperação e aprendizagem, passa a se chamar sistemas produtivos locais (Lastres, Cassiolato, 2005). Na visão do Serviço Brasileiro de Apoio a Pequena e Micro Empresa – Sebrae, os sistemas produtivos lo-cais (clusters) são concentrações geográficas de empre-sas e instituições conectadas em um campo particular (Caporali, Volker, 2004). Para Porter (1998) cluster é uma concentração geográfica de empresas conectadas e instituições em um determinado campo. Inclui, por exemplo, fornecedores especializados de componentes ou máquinas, serviços e fornecedores de infra-estrutura adequada. Abaixo do canal estão os consumidores e na lateral as empresas complementares e empresas dos se-tores afins. Podem também participar as instituições do governo, universidade, agências e suporte técnico. To-dos compartilham interesses comuns e trocam recursos à busca destes interesses compartilhados, reconhecendo a cooperação como o melhor caminho para atingir estes objetivos. Desenvolve-se uma estrutura organizacional onde cada componente é importante para a competiti-vidade individual dos demais. Nesse modelo, identifica-se, com freqüência, uma liderança local que coordena as ações do arranjo. PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 Marcius Fabius Carvalho y Ernesto Michelangelo Giglio ISSN 1695-7121 329 Para o Sebrae (2003) estas ações de coordenação serão exercidas pela governança local que agrega os di-ferentes modos de liderança, coordenação, intervenção, participação e negociação dos conflitos nos processos decisórios locais, assim como no processo de geração, disseminação e uso de conhecimentos. Para isso deve envolver diferentes agentes das diversas atividades pro-dutivas formando uma rede entre governos, empresas, cidadãos, trabalhadores, associações e organizações não governamentais entre outros. A governança pode se apresentar sob as formas de hierarquia e de rede, sendo a primeira observada quan-do é claramente exercida por um único ator que coorde-na as relações econômicas, tecnológicas e políticas no âmbito local e ocorre normalmente quando, por exem-plo, o arranjo produtivo local é liderado por uma grande empresa integradora. Já a governança, sob a forma de rede, é caracterizada pela intensidade de relações en-tre um amplo número de agentes, onde nenhum deles é dominante (Sebrae, 2003). Este último tipo de gover-nança é o encontrado em um espaço turístico. Uma das características do agrupamento neste caso é a maior interdependência entre os atores, incluindo relações so-ciais, com valores compartilhados. Outros fatores tais como confiança, transparência e comprometimento são importantes guias das relações entre os atores (Larson, 1992; Castells, 2000). Estes fatores, operando em con-junto, fazem surgir uma característica coletiva que é mais do que a soma das partes, nascendo uma entro-pia que vai movimentando essas mesmas relações cada vez de forma mais independente dos atores (Maturana, Varela, 2001). Nessa situação, é possível afirmar que existe uma rede. Conceitos de rede Vale (2004), Giglio e Kwasnicka (2005), em artigos que realizaram uma busca bibliográfica, apontam dois enfoques para os conceitos de redes de negócios. O pri-meiro enfoque parte da consideração que a existência de uma rede social influencia a criação de arranjos sociais específicos, entre eles, as redes de negócios. A partir daí define-se redes de negócio como uma ligação especial, derivada das redes sociais, as quais todos fazemos par-te. Por outro lado, advindo de escolas de raciocínio econômico, define-se a rede de negócios como um arran-jo planejado das empresas, buscando uma vantagem que isoladamente torna-se mais difícil de alcançar. Cer-tamente este enfoque é mais adequado para os condo-mínios e consócios constituídos por grandes empresas. Este artigo utiliza o conceito de redes sociais para o es-tudo da dinâmica em espaços turísticos. As estruturas sociais são organizadas em torno de relações de produção, consumo, poder e experiência, nas configurações espaços-temporais que constituem a cul-tura (Castells, 2000). Surge uma nova estrutura social quando existem transformações em alguma, ou em vá-rias relações que, em conjunto, conduzem a mudanças da cultura. Como exemplo, no fim do século XIX havia uma cultura em que a produção era artesanal, voltada a poucos produtos para um mercado regional e realiza-da por pequenas empresas controladas, na maioria das vezes, por uma única pessoa, que se incumbia de todas as tarefas, principalmente as tarefas administrativas. Esta forma de cultura foi substituída, no início do século XX, pela produção em massa que buscava altos índices de produtividade e reduções significativas de custos, forma que impulsionou a verticalização das empresas e a concentração dos recursos produtivos em poucos pro-prietários, formando uma nova cultura, por exemplo, a das grandes marcas. O paradigma tecnológico desta era se baseava na produção e distribuição de energia, fator fundamental e elemento impulsionador da então nova cultura. A tecnologia, que é o uso do conhecimento científico para a especificação de formas de fazer coisas de manei-ra reproduzível, constitui-se a base para a evolução da relação de produção, de consumo, de experiência, de po-der e, portanto, cultura das organizações. A tecnologia é o ingrediente fundamental para a ação humana - ação que em seu fim produz e modifica a estrutura social. A partir do meio do século XX, com o advento dos computadores, deu-se início ao que posteriormente veio a se chamar de a era da informação, que pode ser defini-da como o período histórico onde a sociedade desempen-ha suas atividades por meio de um paradigma construí-do sobre as tecnologias de informação e comunicação (Castells, 2000). Esta tecnologia, constituída de um con-junto de ferramentas que proporciona nova cultura, im-pulsionou a formação de redes de empresas por permitir agilidade no conhecimento das necessidades do cliente e a inclusão do consumidor na etapa de produção. Ao mesmo tempo, e também apoiado pelas redes de infor-mação, houve um movimento no sentido das empresas se voltarem para sua competência central buscando re-cursos complementares em parceiros externos (Grando-ri, Soda, 2006). A era da informação facilita a existên-cia da interdependência entre atores e a integração de recursos em uma rede, no sentido de aumentar o valor do produto para o cliente final. Vê-se o mercado como re-des interconectadas de trocas de relacionamentos o que impulsiona as pesquisas para analisar e descrever as características destas redes (Mouzas et al., 2007). 330 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ... ISSN 1695-7121 O ponto básico de nossa argumentação é que sendo uma rede social definida como um conjunto de nós (pes-soas, organizações) interligadas por um conjunto de re-lações (de confiança, de transferência de fundos, ...) ela é dinâmica e evolui no espaço e no tempo criando cul-tura como um sistema de valores e de comportamentos resultantes de compartilhamento de conteúdos e signi-ficados. Esta afirmativa é oposta aos conceitos de redes econômicas, que supõem um ciclo de vida, ou seja, as redes terminam quando seus objetivos econômicos não são mais alcançados. A representação por redes Admitindo uma rede social como um conjunto es-pecífico de relações (ligações) entre um grupo definido de pessoas e/ou organizações, pode-se representá-la, de forma esquemática, como um conjunto de nós e ar-cos chamado grafo, conforme a Figura 1. Por definição uma rede social não tem um centro e trabalha em lógica binária de inclusão/exclusão. Assim, tudo que está na rede é necessário para a existência da rede. Se um nó (pessoa ou organização) deixa de exercer uma função útil à rede ele deve sair da rede e esta deve se rearran-jar. Pode haver um nó mais importante que outro, mas todos necessitam uns dos outros desde que estejam na rede (Tichy, Tushman, Fombrun, 1979). Um nó se torna mais importante na medida em que absorve mais infor-mação e processa-a com maior eficiência. Assim, a rele-vância e o peso de um nó é conseqüência da habilidade de criar relacionamentos na rede e de sua capacidade de absorver e tratar informações. É possível desenvol-ver medidas para avaliar cada um destes fatores com relação aos nós e ligações (Borgatti, Everett, 2006). Os arcos de uma rede social representam os relacio-namentos entre nós e a não existência de um arco, por exemplo (entre o nó i e o nó n), significa que não há relacionamento direto entre estes nós. Será chamado de buraco estrutural quando estes nós estiverem conecta-dos somente por meio do nó focal que para o exemplo dado é o nó “k” (i encontra m passando por k). Ainda, no exemplo da Figura 1, o nó “j” não apresenta relaciona-mento com a rede e, portanto, está fora dela. Há várias medidas associadas a uma rede como a densidade, co-nectividade, encontrabilidade, a centralidade, o número de clusters e outras, que serão analisadas à frente. Metodologia para análise de redes Considerando o objetivo de análise de mudanças da rede no tempo e a característica qualitativa das va-riáveis, isto é, as relações entre os fatores estruturantes, o trabalho segue uma metodologia qualitativa, com des-crição dos fenômenos; análise das possíveis conjunções e uma discussão sobre a sustentação da afirmativa orientadora. A abordagem qualitativa exploratória tem sido defendida no estudo de redes, em artigos de Larson (1992) e Halinen e Tahtinen (2002), uma vez que o cam-po se encontra numa situação de desenvolvimento cien-tífico inicial, existindo paradigmas com princípios dife-rentes e até opostos. O estudo de caso aplicado a redes também foi defendido por Halinen e Tornroos (2005), a partir da crença na especificidade de cada rede. Tendo analisado a bibliografia existente e refletido sobre os conceitos de redes, tomam-se como elementos estruturantes os atores (pessoas ou organizações), in-terligados por relações sociais; os recursos e os objeti-vos, que ordenam os processos, numa visão sistêmica. O sistemismo considera que os sentidos das relações podem ser bidirecionais, num raciocínio de realimen-tação. Conforme Morin (1991) o raciocínio sistêmico é adequado para fenômenos complexos, sem a evidência de relações causais claramente definidas. A tecnologia torna-se também um importante elemento estruturante à medida que possibilita novas formas de relações so-ciais e desenvolve os objetivos conduzindo a dinâmica da rede. A Figura 2 mostra o desenho das interfaces entre as variáveis, que servirá de modelo para a análise da dinâ-mica de um objeto de estudo pelos conceitos de redes sociais. No centro estão os atores, que constroem seus relacionamentos sociais de produção, de consumo, de poder, de experiência (Castells, 1999) conforme suas po-sições na rede com relação aos objetivos, aos recursos e uso da tecnologia. A análise da dinâmica nas relações dos elementos da Figura 2 inclui dois aspectos básicos: a análise de uma configuração em determinado tempo e a evolução da rede no tempo. O desenho também abarca os aspectos n j i k m l Figura 1. A rede de relacionamentos que representa a rede, com os nós e os arcos. Fonte: os autores, 2009 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 Marcius Fabius Carvalho y Ernesto Michelangelo Giglio ISSN 1695-7121 331 básicos de uma rede, na perspectiva dos conceitos de redes sociais, quais sejam: 1. A Dinâmica 2. O Conteúdo Transacional 3. A Natureza do relacionamento 4. As Características estruturais Dinâmica Como um elemento do sistema social, toda rede evo-lui e se transforma ao longo do tempo. Contudo, segundo Gemser, Leenders e Wijnberg (1996), há poucos estudos que focam em como e por quê as relações interorgani-zacionais de produção, consumo, poder e experiência mudam ao longo do tempo. Alguns estudos, como os de Castells (1999), analisam os grandes movimentos sociais, considerando somente aqueles internos a uma rede específica. Existem clusters que também apresen-tam dinâmicas, evoluindo com o tempo e modificando a rede. A dinâmica da composição da rede causa movi-mentos que podem modificar as relações de produção, consumo, poder e experiência, conduzindo a uma nova cultura na rede pelas transformações em algumas ou em várias das relações entre os atores (Castells, 2000). Existe aqui, portanto, uma visão sistêmica de interde-pendência, onde antecedentes e conseqüentes mudam de posição e a explicação para mudança pode ser encon-trada dentro do próprio sistema. Conteúdo transacional Tichy, Tushman e Fombrun (1979) colocam que o conteúdo transacional pode se expressar de quatro for-mas: A. Expressão de afeto ou de amizade que pode ocorrer entre setores (membros) da rede. B. Troca de influência e poder C. Troca de informação D. Troca de produto ou serviço Segundo Tichy, Tushman e Fombrun (1979), uma rede pode tornar-se diferente no seu desenho para cada um dos conteúdos transacionados. Por exemplo, a rede para troca de informação pode estar altamente conec-tada e descentralizada, enquanto a rede de influência pode ser centralizada e mediada por um único supervi-sor. Natureza do relacionamento Segundo Tichy, Tushman e Fombrun (1979), o obje-tivo e a natureza do relacionamento determinam como os elementos da rede interagem e, entre as formas de interação, as principais características são: a) Intensidade: Mede o grau que os indivíduos hon-ram as obrigações, ou se comprometem com custos, ou se envolvem em contatos durante uma unidade de tem-po. b) Reciprocidade: Mede o equilíbrio com que se dá uma relação. Em uma relação de alta reciprocidade a intensidade com que os elementos envolvidos se relacio- Constroem padrões de relações (consumo, produção, poder, experiência) conforme os... Variam as significações e a forma de usar os... têm sua posição e comportamentos modificados conforme... Atores Objetivos (econômicos, políticos, sociais) Recursos (construções, máquinas, equipamentos) Tecnologia (uso do conhecimento para substituições, mudanças) Figura 2. O modelo de análise da dinâmica de uma determinada rede social. Fonte: construção dos autores, 2009 332 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ... ISSN 1695-7121 nam tem a mesma intensidade em ambos sentidos. c) Visibilidade das expectativas: Mede o grau com que os indivíduos entendem como deve ser o comporta-mento apropriado das relações bilaterais. d) Multiplicidade: Um indivíduo pode ter múltiplos papéis tais como trabalhador, marido, membro de uma comunidade, e membro de um grupo. A multiplicidade identifica o grau que um par é ligado em múltiplas ta-refas. Quanto mais tarefas ligam um indivíduo a outro mais forte é a ligação. Características estruturais Conforme Tichy, Tushman e Fombrun (1979), as ca-racterísticas estruturais estão ligadas aos nós, em sua disposição na rede e em como se encontram interligados. Seriam elas: A. Tamanho: É o número de indivíduos ou elementos pertencentes à rede. B. Densidade ou conectividade: É o número de ligações na rede. É definido como a razão entre o número de ligações atuais e o número de possíveis ligações. C. Clusters: É formado por um conjunto de elementos com características semelhantes, e que se agrupam por afinidades. O número de clusters é determinado pelo número de agrupamentos. D. Estabilidade: Grau com que o padrão da rede se mo-difica com o tempo. E. Abertura: Número de ligações externas de uma uni-dade social como uma taxa de ligações externas pos-síveis. F. Encontrabilidade: O número médio de ligações entre dois nós de uma rede. G. Centralidade: O grau com que as relações são dirigi-das por uma hierarquia formal. H. Estrela: O indivíduo com o maior número de nomi-nações. I. Ponte: Um elemento que é membro de múltiplos clus-ters Determinadas as variáveis com as quais se analisam as relações sociais que suportam a rede de negócio, é possível passar à descrição e análise do objeto de estu-do. A Vila de Paranapiacaba O café, principal produto do Brasil e fator dominan-te da econômica nacional no Século XIX, fez concentrar esforços que maximizassem sua exportação. Assim, era prioritário estabelecer vias mais adequadas para o es-coamento da produção para o Porto de Santos, o que le-vou à criação, em 1856, da Single Entreprise Ferroviá-ria. Em 1861 começou a construção da ferrovia com toda a tecnologia empregada trazida da Europa e instalou-se um acampamento que chegou a abrigar 5000 homens. A concessão deste trecho da ferrovia foi por 90 anos e vie-ram ao Brasil executar esse projeto renomados engen-heiros ingleses e de outros países da Europa e optou-se pela construção de uma vila para abrigar funcionários, nas proximidades das instalações ferroviárias. A ferro-via foi inaugurada em 1867, com a presença de uma pe-quena aglomeração urbana na Parte Alta da Vila, for-mada por casas de pau-a-pique e palha (Prefeitura de Santo André, 2008). A escolha do local foi apenas por uma questão de logística, com a proximidade do porto de Santos. A partir da Parte Alta houve a ocupação do local hoje correspondente à Vila Velha, pelo acampamento dos operários, que obedeceu à determinação de um eixo principal (Rua Direita), que dava acesso aos depósitos e oficinas. As construções eram de pau-a-pique e pau roliço, cobertas de sapé. As construções da Companhia eram cobertas com folhas de ferro galvanizado ondula-do. Basicamente, as características e a feição de acam-pamento serviam de alojamento à construção da ferro-via (Prefeitura de Santo André, 2008). A Vila Velha é um conjunto que representa as edifi-cações mais antigas, local que ofereceu infra-estrutura à construção da ferrovia propriamente dita e se destacava na época principalmente em relação à assistência mé-dica através da construção do Hospital do Alto da Se-rra, um verdadeiro complexo hospitalar constituído de farmácia, necrotério, salas de cirurgia, consultas, inter-nação para o alto escalão, casa infecto-contagiosa, um espaço de isolamento para doenças, além de dependên-cias de funcionários e lavanderia (Prefeitura de Santo André, 2008). Estes dados históricos permitem visualizar a carac-terística estrutural da rede social ampla, conectada pelo objetivo da construção da ferrovia, com três subsiste-mas claros: a rede social dos operários, com suas casas e seus códigos de conduta (o que comer, o que beber, etc.); a rede social dos engenheiros e dos técnicos; com sua cultura inglesa e uma terceira rede social médica, uma vez que os acidentes e doenças eram constantes. Esta primeira configuração da rede social pode ser vista na Figura 3. Os atores tinham como visão a ocupação temporária do local, implicando algumas conseqüências, tais como a percepção de que alguns recursos eram des-cartáveis, tais como as acomodações. Conforme a ferrovia foi inaugurada e os objetivos co-merciais tornaram-se relevantes, surgiu a Vila Nova, ou PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 Marcius Fabius Carvalho y Ernesto Michelangelo Giglio ISSN 1695-7121 333 Vila Martin Smith, juntamente com a construção, em 1901, da segunda obra de subida e descida da serra, estendendo o núcleo original para as áreas vizinhas ao longo do vale. Este trecho de expansão foi planejado e originou um modelo urbano projetado. Este novo con-junto é composto por um modelo de aglomerações dis-posto hierarquicamente e conforme um arranjo e des-enho das edificações, que reforçavam assim o aspecto britânico das construções já existentes, arquitetonica-mente diferenciadas pelo material empregado e de tipo-logias pré-definidas. A Vila Nova abrigou o que hoje são os grandes atra-tivos arquitetônicos de Paranapiacaba. Ela foi equipada com a Estação Alto da Serra (destruída por um incêndio em 1981), uma torre com relógio em estilo inglês, que controlava as horas de trabalho e lazer dos funcioná-rios da ferrovia, além de oficinas, pátios de manobra, escritórios, clube, mercado, cinema e campos de golfe, equitação e futebol. Numa das colinas mais elevadas foi erguido o Castelinho, casarão em estilo vitoriano, de onde o superintendente inglês supervisionava os pátios e toda a movimentação dos funcionários da companhia. Em 1907 o vilarejo passou a se chamar Paranapiacaba (do tupi-guarani, “lugar de onde se avista o mar”). An-tes disso, era conhecido apenas como Estação do Alto da Serra. de Paranapiacaba e a ferrovia, que passou a se chamar Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, ficaram então sob o controle da União. Na década de 50, muitas mudanças de fonte energética ocorreram, como a eletrificação da rede e a utilização do diesel e do óleo cru em substi-tuição ao carvão. As máquinas antigas, os vagões e as locomotivas foram abandonados nos pátios. Entende-se ser aqui uma nova mudança da rede. Com a mudança do controle da ferrovia e a emergência de novas tecnologias energéticas modifica-se o quadro de mão de obra necessária, mudam os moradores e os processos necessários ao objetivo operacional da ferro-via. O término da concessão da São Paulo Railway Co. é apontado por antigos moradores como o início da de-cadência da Vila. Com a desativação parcial do Sistema Funicular da Serra Velha, na década de 70, parte dos funcionários foi dispensada ou aposentada e outros fo-ram contratados para cuidar do novo sistema de trans-posição da serra, construído com tecnologia japonesa e financiado por capital norte-americano. Em 1981, o Sis-tema Funicular foi totalmente desativado e o transporte de passageiros para Santos, extinto. O desenvolvimento tecnológico impulsionou a mudança de cultura da rede, desconectando alguns atores, conectando outros novos, mudando sua estrutura e dinâmica. A ferrovia, agora modernizada, pode ser administrada à distância sem o Relações de produção e poder claramente definidas, intensas experiências para acomodação ao local, consumo emergente São descartáveis, significam apenas os instrumentos de trabalho, mesmo as casas onde moravam Engenheiros detêm o conhecimento, operários realizam, estrut ura social rígida Atores: Políticos, engenheiros, operários, famílias em três redes: operários, técnicos, rede de assistência Objetivo principal: Construção da ferrovia Objetivo secundário: infra-estrutura para viver Recursos: a. material, máquinas e equipamentos para construção da ferrovia b. casas e objetos para viver no local Tecnologia: de construção da ferrovia e da vila Figura 3. A primeira configuração da rede social de Paranapiacaba. Fonte: construção dos autores, 2009 Esta segunda obra, que originou a construção de casas, conforme nossa interpretação, modificou a di-visão rígida das sub-redes existen-tes até então, uma vez que as casas eram de estilo inglês, mas, do que se depreende de documentos da época, eram habitadas tanto por técnicos estrangeiros quanto por técnicos brasileiros. Esta rede tinha no co-mércio seu objetivo principal e no correto funcionamento da ferrovia o objetivo operacional. Identifica-se aqui, então, a pri-meira grande mudança da rede ori-ginal, conforme se vê na Figura 4. Agora a visão dos atores é de ocu-pação permanente, implicando em percepções diferentes sobre alguns recursos, tais como moradia e siste-mas de saúde. A concessão da São Paulo Rai-lway Co. terminou em 1946 e não houve acordo entre a companhia e o governo para sua renovação. A Vila 334 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ... ISSN 1695-7121 equipamentos ferroviários e a área natural que envolve a Vila, mas pouco resultado foi visto. O abandono conti-nuou evidente, mas com o crescimento de uma perspec-tiva de um novo objetivo a ser desenvolvido. A maior parte dessas mudanças ocorreu por iniciati-vas do governo e instituições de fomento, sem a partici-pação da sociedade. Em outros termos, não havia uma rede social que desse suporte ao novo objetivo de uma rede de negócios turísticos. Um documento que torna um local um patrimônio histórico não transforma as pessoas em atores da hospitalidade do dia para a noite nem atrai turistas. Em conseqüência, o abandono con-tinuava. No ano de 2003 a Prefeitura de Santo André com-pra a Vila ferroviária e inicia um trabalho efetivo para recuperação e preservação local, alavancando seu des-envolvimento social e econômico. Agora voltado para a auto-sustentação pela atividade turística onde se desta-cam os seguintes referenciais: Estação do Alto da Serra, Passarela Metálica (de 1899), Igreja de Bom Jesus de uso intensivo de mão de obra. A Vila deixa de ser parte integrante do complexo ferroviário tendo que buscar ou-tra identidade. Esta nova situação, de acentuada transição, origina relações difusas (por exemplo, um técnico desemprega-do, que é mão de obra especializada, mas não tem lugar de trabalho no local). É uma nova experiência para os atores, que assistem a decadência do local, o envelheci-mento e abandono dos objetos. Dada a dinâmica de uma rede, a partir da década de 1980, surgiram diversos movimentos para preser-vação do patrimônio histórico e natural da Vila, enten-didos por este trabalho como os primeiros passos para a modificação da rede social prevalente. O Castelinho, o clube e o mercado foram restaurados. Em 1986 foi apre-sentado o Plano de Preservação e Revitalização, e em 1987, Paranapiacaba foi tombada historicamente pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio His-tórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo). O tombamento incluiu o núcleo urbano, os Figura 4. A rede de Paranapiacaba num segundo momento, agora com o objetivo de comércio. Fonte: construção dos autores, 2009. Relações de produção e poder tornam-se mais difusas, com misturas de operários, técnicos e engenheiros; surgem experiências de vida rotineira; o consumo se estabelece Entrelaçamento de Redes de manutenção Redes comerciais Redes de moradores Rede de infra-estrutura Adquirem significados mais coletivos e afetivos pessoais; os objetivos não têm prazos estabelecidos, o local começa a ter um significado de moradia O conhecimento de comércio e manutenção é mais difuso, com vários atores de diferentes classes sociais Atores: cafeicultores, exportadores, engenheiros, operários, famílias, comerciantes em redes interligadas Objetivos: Comércio; manutenção da ferrovia, infra-estrutura para viver no longo prazo Recursos: a. material, máquinas e equipamentos para manutenção da ferrovia b. casas e objetos para viver no local Castelo do Administrador Casas dos chefes, Casas dos operários, Casas dos moradores A estação do trem Máquinas para manutenção Tecnologia: de manutenção da ferrovia e da vila PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 Marcius Fabius Carvalho y Ernesto Michelangelo Giglio ISSN 1695-7121 335 que deve haver a participação da sociedade, começa a nascer a rede social que dará suporte à rede turística. Como se percebe, há uma relação entre as característi-cas estruturais da rede, os papéis dos atores e os objeti-vos presentes. A configuração inicial dessa última rede pode ser vista na Figura 5. Agora a tecnologia está a cargo do objetivo de manutenção dos recursos e intro-duz- se a tecnologia de informação para comunicação e venda dos produtos turísticos. Culturas da Vila de Paranapiacaba O estudo da dinâmica das redes proporciona uma visão das mudanças de relacionamentos entre os nós ao longo do tempo, acompanha a entrada e a saída de atores, recursos e tecnologia, alterando as configurações das relações de poder, cultura e experiência da rede. As condições ambientais de Paranapiacaba passaram por várias configurações espaço-temporal e, portanto, cul-turais. A primeira ocorreu na implantação da ferrovia Paranapiacaba (de 1889), Castelinho (de 1897), Casa Fox (de 1897), Edifício do Mercado (de 1899), Clube União Lyra Serrano (de 1907). Além destes atrativos o distrito de Paranapiacaba abriga recursos naturais da Mata Atlântica que estão preservados pelo Parque Natural Municipal Nascentes de Paranapiacaba, que é uma Unidade de Conservação, criada em pela Prefei-tura de Santo André, com o objetivo de proporcionar a manutenção do equilíbrio do ecossistema para usufruto das gerações atuais e futuras. Documentos da prefeitu-ra buscam ressaltar as qualidades do local. Por vários motivos Paranapiacaba esteve à frente do País, como, por exemplo, foi o primeiro local a ter ilumi-nação elétrica, saneamento básico, o local onde ocorreu a primeira partida de futebol e o embrião do primeiro sistema previdenciário do país. Por ser a única Vila Fe-rroviária conservada desde sua fundação no Brasil, pe-los motivos apresentados, Paranapiacaba garantiu seu nome na História (Prefeitura de Santo Andrèe, 2008). Neste último movimento, quando o governo entende Novas relações de produç ão e consumo tornam -se definidas, as relações de poder se difundem pelos v ários atores, há um entrelaçamento das redes de comércio, de eventos turísti cos e de infra-estrutura de recepç ão. Adquirem significados mais coletivos e de preservação, os objetivos não tem prazos estabelecidos, o local passa a ter um significado histórico e comercial O conhecimento da atividade turística vai se disseminando por todos os atores, incluindo os moradores Atores: Governo, associaç ões turísticas, comerciantes, famílias, empresas de transporte Objetivo: viabilizar economicamente o território como local turístico Recursos tur ísticos : Castelo do Administrador Conjuntos residenciais dos gerentes e dos operários Estação do trem Máquinas para exposição Parque Florestal Tecnologia: de manutenção e restauração dos objetos Figura 5. Configuração da rede de Paranapiacaba quando o turismo passou a ser o objetivo. Fonte: construção dos au-tores, 2009. 336 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ... ISSN 1695-7121 (1860 a 1867) onde os principais atores eram o governo brasileiro, com interesse em viabilizar as exportações de café, os cafeicultores, os empreendedores da ferrovia (Barão de Mauá, Bancos Ingleses), os cinco mil funcioná-rios e os engenheiros envolvidos na obra, além de todos os outros elementos de apoio a este empreendimento. Com o término da implantação em 1867 a Vila tor-nou- se elemento de suporte à operação da ferrovia mu-dando a constituição e a importância dos atores e, ainda em sua evolução, como pólo tecnológico, assume a frente dos desenvolvimentos do País pela disponibilidade da iluminação, saneamento básico, esportes, eventos cultu-rais e religiosos no clube além de tornar-se o embrião do primeiro sistema previdenciário do Brasil. Um terceiro período ocorre a partir de 1946, quan-do a estrada foi encampada pela União que optou pela transferência do sistema funicular para o sistema de cremalheira, envolvendo tecnologia japonesa. Caracte-riza- se pela saída do ator empresa e do ator bancos in-gleses; substituídos pela parceira do ator governo com os japoneses. A vila continua sendo palco de avanços tecnológicos, com constantes mudanças dos atores, das formas de produção e de consumo. Em contraste com este avanço tecnológico há o declínio das relações sociais locais, uma vez que as novas tecnologias requerem con-hecimento especializado e possibilita a administração das operações à distância. O período atual, a partir de 2003 quando foi adqui-rida pela Prefeitura de Santo André com o objetivo de proporcionar a manutenção de equilíbrio do ecossiste-ma para usufruto das gerações atuais e futuras, a Vila passou a uma nova configuração de produção, consumo, poder e experiência com a subdivisão em duas redes: a rede ligada à ferrovia e a rede histórico-cultural. A Vila sai de uma ação de apoio e volta-se para uma atividade de preservação e desenvolvimento dos agentes morado-res, de uma cultura de preservação e auto-sustentação de seus atores e recursos pelo turismo. Note-se, no en-tanto, que sua evolução depende fortemente do apoio dos governos municipal, estadual e federal, além de en-tidades de preservação. Embora esta análise aponte para datas, estas devem ser entendidas como referência, uma vez que a cultura evolui continuamente sem apresentar marcos tempo-rais bem definidos. Outra observação é que dentro de uma cultura pode-se identificar uma dinâmica da rede que na sua evolução abre espaço para outra rede, seja por pressões externas (grupos de interesse), seja por pressões internas (jogos de poder entre os atores). Verifica-se, da análise realizada; que o sistema evo-lui de uma rede de negócios onde os relacionamentos se caracterizam por afinidades produtivas e tecnologias substituíveis para uma relação de complementaridade entre operadores que partilham a formação de um paco-te turístico. Evolui também de uma governança centra-lizada para uma distribuição de influência e poder entre os vários atores. Evolui de uma rede com um negócio principal para vários negócios de pequeno porte, que é característica de um local turístico (Tremblay, 1998). Estas análises sustentam a afirmativa da dinâmica e mudança das redes, em oposição à visão de um ciclo de-finido. Natureza da ligação e característica estrutural da rede atual A representação das relações entre atores e recursos por um grafo descreve a concepção mental, ou o mapa cognitivo das características relevantes sob a perspec-tiva dos elementos envolvidos (Bougon, Weich, Buikho-rist, 1977; Ford, 2003). A rede é um modelo mental (Lip-nack, Stamps, 1994), um mapa da interdependência entre atores, estabelecida pelos relacionamentos, com o objetivo de melhor aproveitamento dos recursos. Os recursos podem ser humanos, ou entradas técnicas que se constituem em um potencial de ação enquanto que as atividades representam o fluxo de serviços que po-dem resultar dos recursos (Grandori, Soda, 2006). Esta representação pode ser retrospectiva, ou prospectiva. A Figura 6 apresenta um modelo de relacionamento atual entre os atores da Vila durante a realização da pesquisa (Pires, 2006). As linhas expressam o relacionamento entre atores cujo conteúdo é representado por fluxo. As escolas públi-cas, no sentido de criar empregabilidade para os jovens da região, trabalham na formação de monitores turís-ticos, criando assim o relacionamento com os atrativos culturais, atrativos naturais, associação dos receptivos e outros que são influenciados pela ação destes monito-res. Neste caso a relação é biunívoca, uma vez que estes atores podem influenciar as escolas, participando-as de suas necessidades. Os atrativos culturais têm relação com a hospeda-gem e com a alimentação, uma vez que aqueles se cons-tituem em lugar de divulgação das capacidades da Vila. Olhando sob o ponto de vista de rede, o comércio é ele-mento divulgador e impulsionador da freqüência aos atrativos, pois atua como elemento de complementação às outras atividades. Todos os elementos se completam, são necessários uns aos outros. Identifica-se a inte-gração vertical no sentido de relacionamentos de recur-sos complementares que operam em diferentes estágios da cadeia de valor. É também interessante observar que, diferentemente de outros setores como o automo- PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 Marcius Fabius Carvalho y Ernesto Michelangelo Giglio ISSN 1695-7121 337 tivo, a produção no turismo não segue um processo com seqüência rígida sendo que as atividades que compõem um produto turístico não precisam ocupar uma posição rígida na cadeia de valor, podendo ocorrer em qualquer tempo. Outra característica importante do setor é que são necessárias empresas com produtos aparentemente rivais e, portanto, podem contribuir para um mesmo produto turístico. Na Figura 7 são apresentados alguns laços horizontais que conectam empresas rivais e, por operarem no mesmo estágio da cadeia de valor, ou por oferecerem produtos substitutos para o mesmo merca-do, ocorrem entre os restaurantes, hospedagens, ate-liês, etc. É interessante observar que esta competição contribui para a atratividade da Vila porque incentiva a competição por preço, além de contribuir para a di-versidade e flexibilidade, por exemplo, oferecendo dife-rentes opções de sabores para diferentes interesses dos clientes e dos dias da semana. Os atrativos naturais e os atrativos culturais competem, mas de forma diferente da rede de negócios. As ligações verticais e horizontais podem ser formais ou informais. Uma vez que as ligações formais são por contratos registrados em fórum público, a maioria das ligações, representadas nas Figuras 6 e 7 são informais e não ocorrem de forma estrategicamente planejada en-tre as empresas envolvidas. Elas são adequadamente compreendidas no paradigma de redes sociais. Essas relações informais podem ser essenciais como elemen-tos alavancadores de todo o empreendimento turístico, já que atuam integradores de recursos complementares em opções, abrangendo desde pizzarias a restaurantes de peixe, churrascarias, etc., criando flexibilidade e va-riedade para os clientes. Em termos de rede o laço hori-zontal não é visto somente do ponto de vista de conflito, mas também de complementaridade. Este é o principal ponto diferenciador de um enfoque de negócio para um enfoque relacional, como o aqui apresentado. Este últi-mo enfoque possibilita uma análise muito mais ampla das relações entre empresas e permite até contestar al-guns conceitos largamente consolidados de concorrência entre empresas. Das pesquisas realizadas por Pires (2006) pode-se afirmar que a natureza da ligação entre os atores mos-tra uma tendência de incremento da intensidade, com crescente adesão dos atores da cidade, principalmente os jovens e estudantes, no desenvolvimento dos papéis de atores do turismo. Foram coletados relatos dos guias e pequenos empresários sobre a consciência que tinham dos seus papéis. Paralelo a esse movimento e interde-pendente dele, a característica estrutural da rede atual coloca o papel de ator (formas de relações) voltado para Figura 6. Rede representativa dos recursos e atividades de Paranapiacaba. Fonte: Os autores, adaptado de Pires, 2006. 338 PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ... ISSN 1695-7121 o turismo (que é o objetivo que ordena as relações), uti-lizando de maneira específica os recursos (casas, máqui-nas, etc), como objetos de turismo e não como objetos utilitários. Modelo Básico para Análise da Dinâmica da Rede Unindo-se as contribuições teóricas e as análises so-bre o caso apresentado, foi possível propor e sustentar um modelo básico para pesquisas das mudanças cultu-rais em redes. Este trabalho sugere que pesquisas com o objetivo de analisar a dinâmica de uma rede de negó-cios, a partir dos conceitos de redes sociais, tomem como ponto de partida quatro principais elementos: A. Os ato-res: B. os recursos que estão disponíveis à rede e a evo-lução tecnológica que conduz a mudança nos objetivos e na forma de aproveitamento dos recursos; C. As formas de relações entre os atores, incluindo a maneira como utilizam os recursos; D. Os objetivos que guiam todo o sistema de relações. Estes fatores se interconectam em sua evolução dentro do objeto de estudo. O modelo resu-mido pode ser visto na Figura 8. A Figura 8 deve ser vista como uma estrutura de ele-mentos que organizam a rede, nas variáveis expostas anteriormente, ou seja, a dinâmica, o conteúdo tran-sacional, a natureza da ligação e as características es-truturais. Assim, por exemplo, as relações de poder dos engenheiros sobre os operários e outros habitantes da Vila são compreensíveis quando se entende que o ob-jetivo era a construção da ferrovia e que os objetos (a tecnologia de construção) exigiam um rígido controle. Quando o objetivo passa a ser o comércio na ferrovia, num segundo momento, a autoridade do engenheiro as-sume uma nova função, mudando a natureza das tran-sações com os operários, agora objetivando a operação e manutenção da ferrovia, com controles menos rígidos. Assim, realizando uma análise temporal, com cortes sucessivos no tempo, é possível perceber a evolução da rede, conforme mostraram os vários desenhos. Uma im- Figura 7. Inter-relação entre os negócios na área de alimentos. Fonte: construção dos autores, 2009. portante contribuição metodológica do trabalho foi exatamente mostrar que é possível realizar uma análise dinâmi-ca de uma rede a partir de documen-tos, entrevistas e reconstrução históri-ca, substituindo em parte a técnica de acompanhamento. O trabalho se confi-gura inédito, já que não encontramos similar na literatura brasileira. Conclusões O objetivo deste artigo foi desenvol-ver uma análise de rede de negócios Figura 8. Modelo teórico resumido para a dinâmica das redes. Fonte: Construção dos autores, 2009. Objeto Objetivo s Recursos Tecnologia Objeto em Análise Atores a partir da afirmativa de que as relações e a rede se transformam no tempo. A partir da análise do caso, a resposta obtida é que a afirmativa se mantém, ou seja, há evolução das redes causadas por mudanças nos rela-cionamentos entre atores, recursos e objetos. Alguns autores (Larson, 1992) têm defendido a hi-pótese de que redes são como produtos, que têm um ciclo de vida e morrem. No entanto, ao considerar um conceito de rede de negócios a partir do paradigma de rede social (Castells, 2000), pode-se afirmar que a rede se transforma no tempo, tanto em sua estrutura, quanto em sua dinâmica, sendo desnecessário teórica e metodo-logicamente seguir a idéia de ciclo de vida. A aceitação dos ciclos tem levado os pesquisadores a analisarem diacronicamente uma rede e concluírem sobre o está-gio em que ela se encontra, ou, no máximo, com uma comparação entre um momento anterior e o presente. Uma análise histórica, conforme nossa proposta, busca as mudanças da rede a partir de quatro fatores estrutu-rantes - os atores, os recursos, a evolução tecnológica e os objetivos, cuja interligação pode ser vista na Figura PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011 Marcius Fabius Carvalho y Ernesto Michelangelo Giglio ISSN 1695-7121 339 2. Os fatores se ordenam num amplo espectro de va-riáveis, tais como as citadas por Tichy (1979) e organi-zadas por Castells (2000), classificadas em quatro fato-res a saber: A. A dinâmica da rede, entendendo-se como as formas de relações entre os atores; B. Os conteúdos transacionais, entendendo-se como o fluxo da rede, no uso de objetos, C. A natureza da ligação, entendendo-se como intensidades, freqüências, confiança e outras medidas das relações, D. As características estruturais da rede, entendendo-se como o tamanho, existência de centralidade, de governança. A partir do modelo da Figura 2 e baseado nos prin-cípios do sistemismo, que considera relações causais bi-direcionais e que busca a transformação das relações, desenvolveu-se um raciocínio sobre as várias estruturas e dinâmicas de redes que se sucederam no lugar conhe-cido como Vila de Paranapiacaba. A triangulação de dados a partir de documentos his-tóricos, observações no local e entrevistas mostrou-se adequada para fornecer dados sobre os movimentos da rede. Os resultados apontaram que a Vila passou por três estágios de configurações, com estruturas diferen-tes de redes, com atores que foram se modificando (ou sendo substituídos, ou realizando outras funções), com recursos que tiveram seus destinos alternados (máqui-nas e edificações que deveriam funcionar e hoje são para olhar) e objetivos que se transformaram (de construir a ferrovia, para o objetivo de comercializar, e atualmente para o objetivo de realizar turismo). A Vila é um caso único, pois nasceu de um projeto político e comercial, tornou-se uma rede de construção durante alguns anos, mudou sua estrutura para aten-der aos objetivos comerciais após o término da cons-trução, teve seu auge e declínio, estagnou, isto é, ficou algum tempo sem objetivo definido, por isso seus atores estavam com fluxos e atividades indefinidas, até que a Prefeitura de Santo André colocou o novo objetivo de destino turístico, reordenando as estruturas e dinâmica dos atores. A afirmativa de transformação da rede e o esquema conceitual proposto abrem campos interessantes de pes-quisas, numa corrente diferente das análises econômi-cas de redes, que com uma certa rigidez concluem sobre a capacidade competitiva da mesma e sobre seu ciclo de vida, tal como se analisam os ciclos de negócios e de cidades como Americana, no interior do Estado de São Paulo, com sua tecelagem e Franca, também no interior de São Paulo, com o negócio de calçados. Concluímos que o caso analisado mostrou ser possí-vel defender a tese do fluxo das redes, diferente da tese do ciclo de vida. Outras cidades que têm se transforma-do no tempo, tais como Parati, no Rio de Janeiro, que tem se tornado centro cultural e São Luiz, no Maran-hão, que tenta ser um centro empresarial, poderiam ser analisadas na mesma perspectiva. Referências Borgatti, S. and Everett, M. 2006 “A Graph-theoretic perspective on centrality”. So-cial Network, 28: 466-484. Bougon, M.; Weich,K. and Buikhorist, D. 1977 “Cognitions in organizations: An analysis of the Utrecht Orchestra”. Administrative Quarterly, 22: 606-639. Caporali, R. and Volker, P. (Org) 2004 “Metodologia de Desenvolvimento de Arranjos pro-dutivos Locais”. Projeto Promos-Sebrae, Versão 2.0, SEBRAE, Brasília. Castells, M. 2000 “Material for an exploratory theory of the network society”. British Journal of Sociology, 51: 1: January/ March: 5-24. 1999 A sociedade em rede, v.1. São Paulo: Paz e terra. 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Título y subtítulo | A dinâmica da rede sob a perspectiva social: O caso da Vila de Paranapiacaba |
Autor principal | Fabius Carvalho, Marcius ; Michelangelo Giglio, Ernesto |
Publicación fuente | Pasos. Revista de turismo y patrimonio cultural |
Numeración | Volumen 09. Número 2 |
Sección | Artículo |
Tipo de documento | Artículo |
Lugar de publicación | El Sauzal, Tenerife |
Editorial | Universidad de La Laguna |
Fecha | 2011-04 |
Páginas | pp. 327-340 |
Materias | Turismo ; Patrimonio cultural ; Publicaciones periódicas |
Enlaces relacionados | Página web: http://todopatrimonio.com/revistas/101-pasos-revista-de-turismo-y-patrimonio-cultural |
Copyright | http://biblioteca.ulpgc.es/avisomdc |
Formato digital | |
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Texto |
www.pasosonline.org
Vol. 9 Nº 2 págs. 327-340. 2011
A dinâmica da rede sob a perspectiva social: O caso da Vila
de Paranapiacaba
Marcius Fabius Carvalhoi
Ernesto Michelangelo Giglioii
i Redes de Negócios e Cadeias de Suprimentos - Programa de Mestrado em Administração UNIP- Universidade
Paulista e Pesquisador do Centro de Tecnologia da Informação- CTI em São Paulo- Brasil. Email: marcius.
carvalho@pesquisador.cnpq.br
ii Professor da disciplina de Redes de Negócios do Programa de Mestrado em Administração da UNIP- Univer-sidade
Paulista em São Paulo- Brasil. Email: ernesto_giglio@yahoo.com.br
© PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121
Universidade Paulista (Brasil)
Resumo: O trabalho analisa a dinâmica das redes de empresas nas dimensões econômicas, téc-nicas
e sociais, mostrando que as relações mudam conforme os objetivos econômicos e políticos.
Afirma-se que as redes se transformam ao longo do tempo surgindo diferentes estruturas e formas
de relações, com variados graus de flexibilidade, inovação e cultura, em contrapartida à visão de que
elas nascem e morrem. O trabalho analisa a evolução do ambiente da Vila de Paranapiacaba, no Es-tado
de São Paulo, desde sua criação até a situação atual, utilizando documentos, acompanhamento
e entrevistas e conclui que Paranapiacaba passou por quatro diferentes configurações de redes. Na
atualidade predomina o objetivo de turismo, que regula as relações sociais e de negócios. Os dados
sustentam a afirmativa da evolução das redes.
Palavras-chave: Redes; Desenvolvimento local; Evolução de redes; Modelos em redes; Objetivos
econômicos e redes.
Title: The dynamics of the network from a social perspective: The case of Vila Paranapiacaba
Abstract: The study analyzes the dynamic networks in the economic, technical and social dimen-sions,
that indicates the change of relations with the economic and political objectives. It is stated
that the networks evolve over time, emerging new structures and forms of relationships, with various
degrees of flexibility, innovation and culture, as opposed to a view that a network born and die. The
study examines the evolution of the Village of Paranapiacaba environment, in São Paulo, Brazil, sin-ce
its creation to the current state, through documents, observation and interviews and conclude that
the Village went through four different networks configurations. Now the predominance is tourism
objective, which regulates the social and business relations. The results support the affirmative of
networks evolution.
Keywords: Networks; Local development; Networks evolution; Networks models; Economics ob-jectives
and networks.
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A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ...
ISSN 1695-7121
Introdução
Concentrações geográficas de empresas e instituições
interconectadas, em um campo particular, podem criar
vantagem competitiva (Porter, 1998). Estas concen-trações
ocorrem por fatores diversos e no caso de gran-des
empresas, elas se dirigem à determinada região de
um país à busca de incentivos fiscais e outras facilida-des
como mão de obra mais barata, maior número de
horas trabalhadas e, no sentido de transferirem inves-timentos
e incertezas para seus parceiros, estabelecem
formas de gestão e de produção que contribuem para a
convergência de empresas fornecedoras para a mesma
região. Cria-se uma competência local como é o caso dos
consórcios e condomínios, para montagem modular, que
proliferam nas áreas automotivas, de equipamentos ele-trônicos,
de vestuário, incentivando o desenvolvimento
de habilidades locais.
A habilidade de uma região em desenvolver-se em
determinado ramo de negócios pode ocorrer também por
questões históricas, principalmente quando apoiadas
pela Tecnologia de Informação, que aparece como ferra-menta
facilitadora de parcerias, encurtando distâncias,
promovendo a visibilidade do produto e gerando o mes-mo
efeito das habilidades incentivadas.
Identificados os fatores locais como fundamentais
para o acompanhamento da dinâmica torna-se impor-tante
estudá-los e entendê-los nas suas diferentes for-mas.
Embora os conceitos e posições apresentadas a
seguir possam ser adaptados para qualquer dos agru-pamentos
acima, ou seja, para os induzidos por grandes
empresas ou os históricos, este texto toma os arranjos
produtivos locais como elemento de análise, para desen-volvimento
de conceitos a serem aplicados em um am-biente.
Assim, o objetivo deste trabalho é analisar a dinâ-mica
das redes de empresas nas dimensões econômi-cas,
técnicas e sociais, a partir do estudo de um caso,
afirmando e mostrando que as relações mudam com os
rumos econômicos e políticos em que a rede está inseri-da.
Esta afirmativa de transformação das redes é uma
contraposição a uma visão de que as redes nascem e mo-rrem,
oriunda principalmente da literatura americana,
mais interessada nos contratos temporais de redes, tais
como joint-ventures e alianças (Grandori, Soda, 1995).
Nossa afirmativa orientadora é que ocorrem evoluções
na rede as quais podem ser adequadamente analisadas
se usarmos os fatores de relacionamentos entre os ato-res,
os recursos, os objetivos e as atividades deles deco-rrentes.
A proposta apóia-se em modelos já existentes,
tais como o ARA – Actors, Resources, Activities (Hakan-son,
Snehota, 1995), porém voltado a serviços e refazen-do
a conjunção dos fatores.
A partir desta proposta analisamos um caso, mos-trando
que no espaço turístico esta evolução é motivada
por fatores culturais, históricos e econômicos.
O artigo se justifica uma vez que há uma crescente
discussão e busca de aplicação dos conceitos na gerên-cia
de redes, mais acentuadamente nos negócios de
serviços, como turismo e saúde. Antes da metodologia,
apresentamos alguns conceitos básicos sobre redes que
apóiam a proposta.
Arranjos produtivos
Arranjos produtivos se constituem em um tipo par-ticular
de aglomerado, formado por pequenas e médias
empresas, com as mesmas habilidades, ou habilidades
complementares; agrupadas em torno de uma profissão
ou de um negócio, onde se destaca o papel desempen-hado
pelos relacionamentos formais e informais entre
empresas locais e demais instituições envolvidas. Os
atores de uma determinada concentração compartilham
uma cultura comum e interagem, como um grupo, com
o ambiente sociocultural. Quando não há significativa
articulação entre os atores, além de pouca ou nenhuma
inovação, as concentrações são chamadas de arranjos
produtivos locais. Quando o conjunto de atores econô-micos,
políticos e sociais, de uma concentração geográ-fica,
desenvolve atividades econômicas correlatas que
apresentam vínculos expressivos de produção, iteração,
cooperação e aprendizagem, passa a se chamar sistemas
produtivos locais (Lastres, Cassiolato, 2005).
Na visão do Serviço Brasileiro de Apoio a Pequena
e Micro Empresa – Sebrae, os sistemas produtivos lo-cais
(clusters) são concentrações geográficas de empre-sas
e instituições conectadas em um campo particular
(Caporali, Volker, 2004). Para Porter (1998) cluster é
uma concentração geográfica de empresas conectadas
e instituições em um determinado campo. Inclui, por
exemplo, fornecedores especializados de componentes
ou máquinas, serviços e fornecedores de infra-estrutura
adequada. Abaixo do canal estão os consumidores e na
lateral as empresas complementares e empresas dos se-tores
afins. Podem também participar as instituições do
governo, universidade, agências e suporte técnico. To-dos
compartilham interesses comuns e trocam recursos
à busca destes interesses compartilhados, reconhecendo
a cooperação como o melhor caminho para atingir estes
objetivos. Desenvolve-se uma estrutura organizacional
onde cada componente é importante para a competiti-vidade
individual dos demais. Nesse modelo, identifica-se,
com freqüência, uma liderança local que coordena as
ações do arranjo.
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Para o Sebrae (2003) estas ações de coordenação
serão exercidas pela governança local que agrega os di-ferentes
modos de liderança, coordenação, intervenção,
participação e negociação dos conflitos nos processos
decisórios locais, assim como no processo de geração,
disseminação e uso de conhecimentos. Para isso deve
envolver diferentes agentes das diversas atividades pro-dutivas
formando uma rede entre governos, empresas,
cidadãos, trabalhadores, associações e organizações não
governamentais entre outros.
A governança pode se apresentar sob as formas de
hierarquia e de rede, sendo a primeira observada quan-do
é claramente exercida por um único ator que coorde-na
as relações econômicas, tecnológicas e políticas no
âmbito local e ocorre normalmente quando, por exem-plo,
o arranjo produtivo local é liderado por uma grande
empresa integradora. Já a governança, sob a forma de
rede, é caracterizada pela intensidade de relações en-tre
um amplo número de agentes, onde nenhum deles
é dominante (Sebrae, 2003). Este último tipo de gover-nança
é o encontrado em um espaço turístico. Uma das
características do agrupamento neste caso é a maior
interdependência entre os atores, incluindo relações so-ciais,
com valores compartilhados. Outros fatores tais
como confiança, transparência e comprometimento são
importantes guias das relações entre os atores (Larson,
1992; Castells, 2000). Estes fatores, operando em con-junto,
fazem surgir uma característica coletiva que é
mais do que a soma das partes, nascendo uma entro-pia
que vai movimentando essas mesmas relações cada
vez de forma mais independente dos atores (Maturana,
Varela, 2001). Nessa situação, é possível afirmar que
existe uma rede.
Conceitos de rede
Vale (2004), Giglio e Kwasnicka (2005), em artigos
que realizaram uma busca bibliográfica, apontam dois
enfoques para os conceitos de redes de negócios. O pri-meiro
enfoque parte da consideração que a existência de
uma rede social influencia a criação de arranjos sociais
específicos, entre eles, as redes de negócios. A partir daí
define-se redes de negócio como uma ligação especial,
derivada das redes sociais, as quais todos fazemos par-te.
Por outro lado, advindo de escolas de raciocínio
econômico, define-se a rede de negócios como um arran-jo
planejado das empresas, buscando uma vantagem
que isoladamente torna-se mais difícil de alcançar. Cer-tamente
este enfoque é mais adequado para os condo-mínios
e consócios constituídos por grandes empresas.
Este artigo utiliza o conceito de redes sociais para o es-tudo
da dinâmica em espaços turísticos.
As estruturas sociais são organizadas em torno de
relações de produção, consumo, poder e experiência, nas
configurações espaços-temporais que constituem a cul-tura
(Castells, 2000). Surge uma nova estrutura social
quando existem transformações em alguma, ou em vá-rias
relações que, em conjunto, conduzem a mudanças
da cultura. Como exemplo, no fim do século XIX havia
uma cultura em que a produção era artesanal, voltada
a poucos produtos para um mercado regional e realiza-da
por pequenas empresas controladas, na maioria das
vezes, por uma única pessoa, que se incumbia de todas
as tarefas, principalmente as tarefas administrativas.
Esta forma de cultura foi substituída, no início do século
XX, pela produção em massa que buscava altos índices
de produtividade e reduções significativas de custos,
forma que impulsionou a verticalização das empresas e
a concentração dos recursos produtivos em poucos pro-prietários,
formando uma nova cultura, por exemplo, a
das grandes marcas. O paradigma tecnológico desta era
se baseava na produção e distribuição de energia, fator
fundamental e elemento impulsionador da então nova
cultura.
A tecnologia, que é o uso do conhecimento científico
para a especificação de formas de fazer coisas de manei-ra
reproduzível, constitui-se a base para a evolução da
relação de produção, de consumo, de experiência, de po-der
e, portanto, cultura das organizações. A tecnologia
é o ingrediente fundamental para a ação humana - ação
que em seu fim produz e modifica a estrutura social.
A partir do meio do século XX, com o advento dos
computadores, deu-se início ao que posteriormente veio
a se chamar de a era da informação, que pode ser defini-da
como o período histórico onde a sociedade desempen-ha
suas atividades por meio de um paradigma construí-do
sobre as tecnologias de informação e comunicação
(Castells, 2000). Esta tecnologia, constituída de um con-junto
de ferramentas que proporciona nova cultura, im-pulsionou
a formação de redes de empresas por permitir
agilidade no conhecimento das necessidades do cliente
e a inclusão do consumidor na etapa de produção. Ao
mesmo tempo, e também apoiado pelas redes de infor-mação,
houve um movimento no sentido das empresas
se voltarem para sua competência central buscando re-cursos
complementares em parceiros externos (Grando-ri,
Soda, 2006). A era da informação facilita a existên-cia
da interdependência entre atores e a integração de
recursos em uma rede, no sentido de aumentar o valor
do produto para o cliente final. Vê-se o mercado como re-des
interconectadas de trocas de relacionamentos o que
impulsiona as pesquisas para analisar e descrever as
características destas redes (Mouzas et al., 2007).
330
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011
A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ...
ISSN 1695-7121
O ponto básico de nossa argumentação é que sendo
uma rede social definida como um conjunto de nós (pes-soas,
organizações) interligadas por um conjunto de re-lações
(de confiança, de transferência de fundos, ...) ela
é dinâmica e evolui no espaço e no tempo criando cul-tura
como um sistema de valores e de comportamentos
resultantes de compartilhamento de conteúdos e signi-ficados.
Esta afirmativa é oposta aos conceitos de redes
econômicas, que supõem um ciclo de vida, ou seja, as
redes terminam quando seus objetivos econômicos não
são mais alcançados.
A representação por redes
Admitindo uma rede social como um conjunto es-pecífico
de relações (ligações) entre um grupo definido
de pessoas e/ou organizações, pode-se representá-la,
de forma esquemática, como um conjunto de nós e ar-cos
chamado grafo, conforme a Figura 1. Por definição
uma rede social não tem um centro e trabalha em lógica
binária de inclusão/exclusão. Assim, tudo que está na
rede é necessário para a existência da rede. Se um nó
(pessoa ou organização) deixa de exercer uma função
útil à rede ele deve sair da rede e esta deve se rearran-jar.
Pode haver um nó mais importante que outro, mas
todos necessitam uns dos outros desde que estejam na
rede (Tichy, Tushman, Fombrun, 1979). Um nó se torna
mais importante na medida em que absorve mais infor-mação
e processa-a com maior eficiência. Assim, a rele-vância
e o peso de um nó é conseqüência da habilidade
de criar relacionamentos na rede e de sua capacidade
de absorver e tratar informações. É possível desenvol-ver
medidas para avaliar cada um destes fatores com
relação aos nós e ligações (Borgatti, Everett, 2006).
Os arcos de uma rede social representam os relacio-namentos
entre nós e a não existência de um arco, por
exemplo (entre o nó i e o nó n), significa que não há
relacionamento direto entre estes nós. Será chamado de
buraco estrutural quando estes nós estiverem conecta-dos
somente por meio do nó focal que para o exemplo
dado é o nó “k” (i encontra m passando por k). Ainda, no
exemplo da Figura 1, o nó “j” não apresenta relaciona-mento
com a rede e, portanto, está fora dela. Há várias
medidas associadas a uma rede como a densidade, co-nectividade,
encontrabilidade, a centralidade, o número
de clusters e outras, que serão analisadas à frente.
Metodologia para análise de redes
Considerando o objetivo de análise de mudanças
da rede no tempo e a característica qualitativa das va-riáveis,
isto é, as relações entre os fatores estruturantes,
o trabalho segue uma metodologia qualitativa, com des-crição
dos fenômenos; análise das possíveis conjunções
e uma discussão sobre a sustentação da afirmativa
orientadora. A abordagem qualitativa exploratória tem
sido defendida no estudo de redes, em artigos de Larson
(1992) e Halinen e Tahtinen (2002), uma vez que o cam-po
se encontra numa situação de desenvolvimento cien-tífico
inicial, existindo paradigmas com princípios dife-rentes
e até opostos. O estudo de caso aplicado a redes
também foi defendido por Halinen e Tornroos (2005), a
partir da crença na especificidade de cada rede.
Tendo analisado a bibliografia existente e refletido
sobre os conceitos de redes, tomam-se como elementos
estruturantes os atores (pessoas ou organizações), in-terligados
por relações sociais; os recursos e os objeti-vos,
que ordenam os processos, numa visão sistêmica.
O sistemismo considera que os sentidos das relações
podem ser bidirecionais, num raciocínio de realimen-tação.
Conforme Morin (1991) o raciocínio sistêmico é
adequado para fenômenos complexos, sem a evidência
de relações causais claramente definidas. A tecnologia
torna-se também um importante elemento estruturante
à medida que possibilita novas formas de relações so-ciais
e desenvolve os objetivos conduzindo a dinâmica
da rede.
A Figura 2 mostra o desenho das interfaces entre as
variáveis, que servirá de modelo para a análise da dinâ-mica
de um objeto de estudo pelos conceitos de redes
sociais. No centro estão os atores, que constroem seus
relacionamentos sociais de produção, de consumo, de
poder, de experiência (Castells, 1999) conforme suas po-sições
na rede com relação aos objetivos, aos recursos e
uso da tecnologia.
A análise da dinâmica nas relações dos elementos da
Figura 2 inclui dois aspectos básicos: a análise de uma
configuração em determinado tempo e a evolução da
rede no tempo. O desenho também abarca os aspectos
n
j i
k
m l
Figura 1. A rede de relacionamentos que representa a rede, com
os nós e os arcos. Fonte: os autores, 2009
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011
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básicos de uma rede, na perspectiva dos conceitos de
redes sociais, quais sejam:
1. A Dinâmica
2. O Conteúdo Transacional
3. A Natureza do relacionamento
4. As Características estruturais
Dinâmica
Como um elemento do sistema social, toda rede evo-lui
e se transforma ao longo do tempo. Contudo, segundo
Gemser, Leenders e Wijnberg (1996), há poucos estudos
que focam em como e por quê as relações interorgani-zacionais
de produção, consumo, poder e experiência
mudam ao longo do tempo. Alguns estudos, como os
de Castells (1999), analisam os grandes movimentos
sociais, considerando somente aqueles internos a uma
rede específica. Existem clusters que também apresen-tam
dinâmicas, evoluindo com o tempo e modificando
a rede. A dinâmica da composição da rede causa movi-mentos
que podem modificar as relações de produção,
consumo, poder e experiência, conduzindo a uma nova
cultura na rede pelas transformações em algumas ou
em várias das relações entre os atores (Castells, 2000).
Existe aqui, portanto, uma visão sistêmica de interde-pendência,
onde antecedentes e conseqüentes mudam
de posição e a explicação para mudança pode ser encon-trada
dentro do próprio sistema.
Conteúdo transacional
Tichy, Tushman e Fombrun (1979) colocam que o
conteúdo transacional pode se expressar de quatro for-mas:
A. Expressão de afeto ou de amizade que pode ocorrer
entre setores (membros) da rede.
B. Troca de influência e poder
C. Troca de informação
D. Troca de produto ou serviço
Segundo Tichy, Tushman e Fombrun (1979), uma
rede pode tornar-se diferente no seu desenho para cada
um dos conteúdos transacionados. Por exemplo, a rede
para troca de informação pode estar altamente conec-tada
e descentralizada, enquanto a rede de influência
pode ser centralizada e mediada por um único supervi-sor.
Natureza do relacionamento
Segundo Tichy, Tushman e Fombrun (1979), o obje-tivo
e a natureza do relacionamento determinam como
os elementos da rede interagem e, entre as formas de
interação, as principais características são:
a) Intensidade: Mede o grau que os indivíduos hon-ram
as obrigações, ou se comprometem com custos, ou
se envolvem em contatos durante uma unidade de tem-po.
b) Reciprocidade: Mede o equilíbrio com que se dá
uma relação. Em uma relação de alta reciprocidade a
intensidade com que os elementos envolvidos se relacio-
Constroem padrões de
relações (consumo,
produção, poder,
experiência) conforme os...
Variam as significações
e a forma de usar os...
têm sua posição e
comportamentos
modificados conforme...
Atores
Objetivos
(econômicos,
políticos, sociais)
Recursos
(construções, máquinas,
equipamentos)
Tecnologia (uso do
conhecimento para
substituições,
mudanças)
Figura 2. O modelo de análise da dinâmica de uma determinada rede social. Fonte: construção dos autores, 2009
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ISSN 1695-7121
nam tem a mesma intensidade em ambos sentidos.
c) Visibilidade das expectativas: Mede o grau com
que os indivíduos entendem como deve ser o comporta-mento
apropriado das relações bilaterais.
d) Multiplicidade: Um indivíduo pode ter múltiplos
papéis tais como trabalhador, marido, membro de uma
comunidade, e membro de um grupo. A multiplicidade
identifica o grau que um par é ligado em múltiplas ta-refas.
Quanto mais tarefas ligam um indivíduo a outro
mais forte é a ligação.
Características estruturais
Conforme Tichy, Tushman e Fombrun (1979), as ca-racterísticas
estruturais estão ligadas aos nós, em sua
disposição na rede e em como se encontram interligados.
Seriam elas:
A. Tamanho: É o número de indivíduos ou elementos
pertencentes à rede.
B. Densidade ou conectividade: É o número de ligações
na rede. É definido como a razão entre o número de
ligações atuais e o número de possíveis ligações.
C. Clusters: É formado por um conjunto de elementos
com características semelhantes, e que se agrupam
por afinidades. O número de clusters é determinado
pelo número de agrupamentos.
D. Estabilidade: Grau com que o padrão da rede se mo-difica
com o tempo.
E. Abertura: Número de ligações externas de uma uni-dade
social como uma taxa de ligações externas pos-síveis.
F. Encontrabilidade: O número médio de ligações entre
dois nós de uma rede.
G. Centralidade: O grau com que as relações são dirigi-das
por uma hierarquia formal.
H. Estrela: O indivíduo com o maior número de nomi-nações.
I. Ponte: Um elemento que é membro de múltiplos clus-ters
Determinadas as variáveis com as quais se analisam
as relações sociais que suportam a rede de negócio, é
possível passar à descrição e análise do objeto de estu-do.
A Vila de Paranapiacaba
O café, principal produto do Brasil e fator dominan-te
da econômica nacional no Século XIX, fez concentrar
esforços que maximizassem sua exportação. Assim, era
prioritário estabelecer vias mais adequadas para o es-coamento
da produção para o Porto de Santos, o que le-vou
à criação, em 1856, da Single Entreprise Ferroviá-ria.
Em 1861 começou a construção da ferrovia com toda
a tecnologia empregada trazida da Europa e instalou-se
um acampamento que chegou a abrigar 5000 homens. A
concessão deste trecho da ferrovia foi por 90 anos e vie-ram
ao Brasil executar esse projeto renomados engen-heiros
ingleses e de outros países da Europa e optou-se
pela construção de uma vila para abrigar funcionários,
nas proximidades das instalações ferroviárias. A ferro-via
foi inaugurada em 1867, com a presença de uma pe-quena
aglomeração urbana na Parte Alta da Vila, for-mada
por casas de pau-a-pique e palha (Prefeitura de
Santo André, 2008). A escolha do local foi apenas por
uma questão de logística, com a proximidade do porto
de Santos.
A partir da Parte Alta houve a ocupação do local
hoje correspondente à Vila Velha, pelo acampamento
dos operários, que obedeceu à determinação de um eixo
principal (Rua Direita), que dava acesso aos depósitos
e oficinas. As construções eram de pau-a-pique e pau
roliço, cobertas de sapé. As construções da Companhia
eram cobertas com folhas de ferro galvanizado ondula-do.
Basicamente, as características e a feição de acam-pamento
serviam de alojamento à construção da ferro-via
(Prefeitura de Santo André, 2008).
A Vila Velha é um conjunto que representa as edifi-cações
mais antigas, local que ofereceu infra-estrutura à
construção da ferrovia propriamente dita e se destacava
na época principalmente em relação à assistência mé-dica
através da construção do Hospital do Alto da Se-rra,
um verdadeiro complexo hospitalar constituído de
farmácia, necrotério, salas de cirurgia, consultas, inter-nação
para o alto escalão, casa infecto-contagiosa, um
espaço de isolamento para doenças, além de dependên-cias
de funcionários e lavanderia (Prefeitura de Santo
André, 2008).
Estes dados históricos permitem visualizar a carac-terística
estrutural da rede social ampla, conectada pelo
objetivo da construção da ferrovia, com três subsiste-mas
claros: a rede social dos operários, com suas casas
e seus códigos de conduta (o que comer, o que beber,
etc.); a rede social dos engenheiros e dos técnicos; com
sua cultura inglesa e uma terceira rede social médica,
uma vez que os acidentes e doenças eram constantes.
Esta primeira configuração da rede social pode ser vista
na Figura 3. Os atores tinham como visão a ocupação
temporária do local, implicando algumas conseqüências,
tais como a percepção de que alguns recursos eram des-cartáveis,
tais como as acomodações.
Conforme a ferrovia foi inaugurada e os objetivos co-merciais
tornaram-se relevantes, surgiu a Vila Nova, ou
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Vila Martin Smith, juntamente com a construção, em
1901, da segunda obra de subida e descida da serra,
estendendo o núcleo original para as áreas vizinhas ao
longo do vale. Este trecho de expansão foi planejado e
originou um modelo urbano projetado. Este novo con-junto
é composto por um modelo de aglomerações dis-posto
hierarquicamente e conforme um arranjo e des-enho
das edificações, que reforçavam assim o aspecto
britânico das construções já existentes, arquitetonica-mente
diferenciadas pelo material empregado e de tipo-logias
pré-definidas.
A Vila Nova abrigou o que hoje são os grandes atra-tivos
arquitetônicos de Paranapiacaba. Ela foi equipada
com a Estação Alto da Serra (destruída por um incêndio
em 1981), uma torre com relógio em estilo inglês, que
controlava as horas de trabalho e lazer dos funcioná-rios
da ferrovia, além de oficinas, pátios de manobra,
escritórios, clube, mercado, cinema e campos de golfe,
equitação e futebol. Numa das colinas mais elevadas
foi erguido o Castelinho, casarão em estilo vitoriano, de
onde o superintendente inglês supervisionava os pátios
e toda a movimentação dos funcionários da companhia.
Em 1907 o vilarejo passou a se chamar Paranapiacaba
(do tupi-guarani, “lugar de onde se avista o mar”). An-tes
disso, era conhecido apenas como Estação do Alto da
Serra.
de Paranapiacaba e a ferrovia, que passou a se chamar
Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, ficaram então sob o
controle da União. Na década de 50, muitas mudanças
de fonte energética ocorreram, como a eletrificação da
rede e a utilização do diesel e do óleo cru em substi-tuição
ao carvão. As máquinas antigas, os vagões e as
locomotivas foram abandonados nos pátios.
Entende-se ser aqui uma nova mudança da rede.
Com a mudança do controle da ferrovia e a emergência
de novas tecnologias energéticas modifica-se o quadro
de mão de obra necessária, mudam os moradores e os
processos necessários ao objetivo operacional da ferro-via.
O término da concessão da São Paulo Railway Co.
é apontado por antigos moradores como o início da de-cadência
da Vila. Com a desativação parcial do Sistema
Funicular da Serra Velha, na década de 70, parte dos
funcionários foi dispensada ou aposentada e outros fo-ram
contratados para cuidar do novo sistema de trans-posição
da serra, construído com tecnologia japonesa e
financiado por capital norte-americano. Em 1981, o Sis-tema
Funicular foi totalmente desativado e o transporte
de passageiros para Santos, extinto. O desenvolvimento
tecnológico impulsionou a mudança de cultura da rede,
desconectando alguns atores, conectando outros novos,
mudando sua estrutura e dinâmica. A ferrovia, agora
modernizada, pode ser administrada à distância sem o
Relações de produção e
poder claramente definidas,
intensas experiências para
acomodação ao local,
consumo emergente
São descartáveis, significam apenas os
instrumentos de trabalho, mesmo as
casas onde moravam
Engenheiros detêm o
conhecimento, operários
realizam, estrut ura social
rígida
Atores:
Políticos, engenheiros,
operários, famílias em
três redes: operários,
técnicos, rede de
assistência
Objetivo principal:
Construção da ferrovia
Objetivo secundário: infra-estrutura
para viver
Recursos:
a. material, máquinas e equipamentos
para construção da ferrovia
b. casas e objetos para viver no local
Tecnologia: de
construção da ferrovia
e da vila
Figura 3. A primeira configuração da rede social de Paranapiacaba. Fonte: construção
dos autores, 2009
Esta segunda obra, que originou
a construção de casas, conforme
nossa interpretação, modificou a di-visão
rígida das sub-redes existen-tes
até então, uma vez que as casas
eram de estilo inglês, mas, do que se
depreende de documentos da época,
eram habitadas tanto por técnicos
estrangeiros quanto por técnicos
brasileiros. Esta rede tinha no co-mércio
seu objetivo principal e no
correto funcionamento da ferrovia o
objetivo operacional.
Identifica-se aqui, então, a pri-meira
grande mudança da rede ori-ginal,
conforme se vê na Figura 4.
Agora a visão dos atores é de ocu-pação
permanente, implicando em
percepções diferentes sobre alguns
recursos, tais como moradia e siste-mas
de saúde.
A concessão da São Paulo Rai-lway
Co. terminou em 1946 e não
houve acordo entre a companhia e o
governo para sua renovação. A Vila
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PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 9(2). 2011
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equipamentos ferroviários e a área natural que envolve
a Vila, mas pouco resultado foi visto. O abandono conti-nuou
evidente, mas com o crescimento de uma perspec-tiva
de um novo objetivo a ser desenvolvido.
A maior parte dessas mudanças ocorreu por iniciati-vas
do governo e instituições de fomento, sem a partici-pação
da sociedade. Em outros termos, não havia uma
rede social que desse suporte ao novo objetivo de uma
rede de negócios turísticos. Um documento que torna
um local um patrimônio histórico não transforma as
pessoas em atores da hospitalidade do dia para a noite
nem atrai turistas. Em conseqüência, o abandono con-tinuava.
No ano de 2003 a Prefeitura de Santo André com-pra
a Vila ferroviária e inicia um trabalho efetivo para
recuperação e preservação local, alavancando seu des-envolvimento
social e econômico. Agora voltado para a
auto-sustentação pela atividade turística onde se desta-cam
os seguintes referenciais: Estação do Alto da Serra,
Passarela Metálica (de 1899), Igreja de Bom Jesus de
uso intensivo de mão de obra. A Vila deixa de ser parte
integrante do complexo ferroviário tendo que buscar ou-tra
identidade.
Esta nova situação, de acentuada transição, origina
relações difusas (por exemplo, um técnico desemprega-do,
que é mão de obra especializada, mas não tem lugar
de trabalho no local). É uma nova experiência para os
atores, que assistem a decadência do local, o envelheci-mento
e abandono dos objetos.
Dada a dinâmica de uma rede, a partir da década
de 1980, surgiram diversos movimentos para preser-vação
do patrimônio histórico e natural da Vila, enten-didos
por este trabalho como os primeiros passos para a
modificação da rede social prevalente. O Castelinho, o
clube e o mercado foram restaurados. Em 1986 foi apre-sentado
o Plano de Preservação e Revitalização, e em
1987, Paranapiacaba foi tombada historicamente pelo
Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio His-tórico,
Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de
São Paulo). O tombamento incluiu o núcleo urbano, os
Figura 4. A rede de Paranapiacaba num segundo momento, agora com o objetivo de comércio.
Fonte: construção dos autores, 2009.
Relações de produção e poder
tornam-se mais difusas, com
misturas de operários, técnicos e
engenheiros; surgem experiências
de vida rotineira; o consumo se
estabelece
Entrelaçamento de
Redes de manutenção
Redes comerciais
Redes de moradores
Rede de infra-estrutura
Adquirem significados mais coletivos e
afetivos pessoais; os objetivos não têm
prazos estabelecidos, o local começa a
ter um significado de moradia
O conhecimento de
comércio e manutenção é
mais difuso, com vários
atores de diferentes classes
sociais
Atores:
cafeicultores,
exportadores,
engenheiros, operários,
famílias, comerciantes em
redes interligadas
Objetivos: Comércio;
manutenção da ferrovia,
infra-estrutura para viver no
longo prazo
Recursos:
a. material, máquinas e equipamentos
para manutenção da ferrovia
b. casas e objetos para viver no local
Castelo do Administrador
Casas dos chefes, Casas dos operários,
Casas dos moradores
A estação do trem
Máquinas para manutenção
Tecnologia: de
manutenção da
ferrovia e da vila
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que deve haver a participação da sociedade, começa a
nascer a rede social que dará suporte à rede turística.
Como se percebe, há uma relação entre as característi-cas
estruturais da rede, os papéis dos atores e os objeti-vos
presentes. A configuração inicial dessa última rede
pode ser vista na Figura 5. Agora a tecnologia está a
cargo do objetivo de manutenção dos recursos e intro-duz-
se a tecnologia de informação para comunicação e
venda dos produtos turísticos.
Culturas da Vila de Paranapiacaba
O estudo da dinâmica das redes proporciona uma
visão das mudanças de relacionamentos entre os nós
ao longo do tempo, acompanha a entrada e a saída de
atores, recursos e tecnologia, alterando as configurações
das relações de poder, cultura e experiência da rede. As
condições ambientais de Paranapiacaba passaram por
várias configurações espaço-temporal e, portanto, cul-turais.
A primeira ocorreu na implantação da ferrovia
Paranapiacaba (de 1889), Castelinho (de 1897), Casa
Fox (de 1897), Edifício do Mercado (de 1899), Clube
União Lyra Serrano (de 1907). Além destes atrativos
o distrito de Paranapiacaba abriga recursos naturais
da Mata Atlântica que estão preservados pelo Parque
Natural Municipal Nascentes de Paranapiacaba, que é
uma Unidade de Conservação, criada em pela Prefei-tura
de Santo André, com o objetivo de proporcionar a
manutenção do equilíbrio do ecossistema para usufruto
das gerações atuais e futuras. Documentos da prefeitu-ra
buscam ressaltar as qualidades do local.
Por vários motivos Paranapiacaba esteve à frente do
País, como, por exemplo, foi o primeiro local a ter ilumi-nação
elétrica, saneamento básico, o local onde ocorreu
a primeira partida de futebol e o embrião do primeiro
sistema previdenciário do país. Por ser a única Vila Fe-rroviária
conservada desde sua fundação no Brasil, pe-los
motivos apresentados, Paranapiacaba garantiu seu
nome na História (Prefeitura de Santo Andrèe, 2008).
Neste último movimento, quando o governo entende
Novas relações de produç ão e
consumo tornam -se definidas, as
relações de poder se difundem
pelos v ários atores, há um
entrelaçamento das redes de
comércio, de eventos turísti cos e
de infra-estrutura de recepç ão.
Adquirem significados mais coletivos e
de preservação, os objetivos não tem
prazos estabelecidos, o local passa a ter
um significado histórico e comercial
O conhecimento da
atividade turística vai se
disseminando por todos os
atores, incluindo os
moradores
Atores:
Governo, associaç ões
turísticas, comerciantes,
famílias, empresas de
transporte
Objetivo: viabilizar
economicamente o território
como local turístico
Recursos tur ísticos :
Castelo do Administrador
Conjuntos residenciais dos gerentes e dos
operários
Estação do trem
Máquinas para exposição
Parque Florestal
Tecnologia: de manutenção
e restauração dos objetos
Figura 5. Configuração da rede de Paranapiacaba quando o turismo passou a ser o objetivo. Fonte: construção dos au-tores,
2009.
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(1860 a 1867) onde os principais atores eram o governo
brasileiro, com interesse em viabilizar as exportações
de café, os cafeicultores, os empreendedores da ferrovia
(Barão de Mauá, Bancos Ingleses), os cinco mil funcioná-rios
e os engenheiros envolvidos na obra, além de todos
os outros elementos de apoio a este empreendimento.
Com o término da implantação em 1867 a Vila tor-nou-
se elemento de suporte à operação da ferrovia mu-dando
a constituição e a importância dos atores e, ainda
em sua evolução, como pólo tecnológico, assume a frente
dos desenvolvimentos do País pela disponibilidade da
iluminação, saneamento básico, esportes, eventos cultu-rais
e religiosos no clube além de tornar-se o embrião do
primeiro sistema previdenciário do Brasil.
Um terceiro período ocorre a partir de 1946, quan-do
a estrada foi encampada pela União que optou pela
transferência do sistema funicular para o sistema de
cremalheira, envolvendo tecnologia japonesa. Caracte-riza-
se pela saída do ator empresa e do ator bancos in-gleses;
substituídos pela parceira do ator governo com
os japoneses. A vila continua sendo palco de avanços
tecnológicos, com constantes mudanças dos atores, das
formas de produção e de consumo. Em contraste com
este avanço tecnológico há o declínio das relações sociais
locais, uma vez que as novas tecnologias requerem con-hecimento
especializado e possibilita a administração
das operações à distância.
O período atual, a partir de 2003 quando foi adqui-rida
pela Prefeitura de Santo André com o objetivo de
proporcionar a manutenção de equilíbrio do ecossiste-ma
para usufruto das gerações atuais e futuras, a Vila
passou a uma nova configuração de produção, consumo,
poder e experiência com a subdivisão em duas redes: a
rede ligada à ferrovia e a rede histórico-cultural. A Vila
sai de uma ação de apoio e volta-se para uma atividade
de preservação e desenvolvimento dos agentes morado-res,
de uma cultura de preservação e auto-sustentação
de seus atores e recursos pelo turismo. Note-se, no en-tanto,
que sua evolução depende fortemente do apoio
dos governos municipal, estadual e federal, além de en-tidades
de preservação.
Embora esta análise aponte para datas, estas devem
ser entendidas como referência, uma vez que a cultura
evolui continuamente sem apresentar marcos tempo-rais
bem definidos. Outra observação é que dentro de
uma cultura pode-se identificar uma dinâmica da rede
que na sua evolução abre espaço para outra rede, seja
por pressões externas (grupos de interesse), seja por
pressões internas (jogos de poder entre os atores).
Verifica-se, da análise realizada; que o sistema evo-lui
de uma rede de negócios onde os relacionamentos
se caracterizam por afinidades produtivas e tecnologias
substituíveis para uma relação de complementaridade
entre operadores que partilham a formação de um paco-te
turístico. Evolui também de uma governança centra-lizada
para uma distribuição de influência e poder entre
os vários atores. Evolui de uma rede com um negócio
principal para vários negócios de pequeno porte, que é
característica de um local turístico (Tremblay, 1998).
Estas análises sustentam a afirmativa da dinâmica e
mudança das redes, em oposição à visão de um ciclo de-finido.
Natureza da ligação e característica estrutural da
rede atual
A representação das relações entre atores e recursos
por um grafo descreve a concepção mental, ou o mapa
cognitivo das características relevantes sob a perspec-tiva
dos elementos envolvidos (Bougon, Weich, Buikho-rist,
1977; Ford, 2003). A rede é um modelo mental (Lip-nack,
Stamps, 1994), um mapa da interdependência
entre atores, estabelecida pelos relacionamentos, com
o objetivo de melhor aproveitamento dos recursos. Os
recursos podem ser humanos, ou entradas técnicas que
se constituem em um potencial de ação enquanto que
as atividades representam o fluxo de serviços que po-dem
resultar dos recursos (Grandori, Soda, 2006). Esta
representação pode ser retrospectiva, ou prospectiva. A
Figura 6 apresenta um modelo de relacionamento atual
entre os atores da Vila durante a realização da pesquisa
(Pires, 2006).
As linhas expressam o relacionamento entre atores
cujo conteúdo é representado por fluxo. As escolas públi-cas,
no sentido de criar empregabilidade para os jovens
da região, trabalham na formação de monitores turís-ticos,
criando assim o relacionamento com os atrativos
culturais, atrativos naturais, associação dos receptivos
e outros que são influenciados pela ação destes monito-res.
Neste caso a relação é biunívoca, uma vez que estes
atores podem influenciar as escolas, participando-as de
suas necessidades.
Os atrativos culturais têm relação com a hospeda-gem
e com a alimentação, uma vez que aqueles se cons-tituem
em lugar de divulgação das capacidades da Vila.
Olhando sob o ponto de vista de rede, o comércio é ele-mento
divulgador e impulsionador da freqüência aos
atrativos, pois atua como elemento de complementação
às outras atividades. Todos os elementos se completam,
são necessários uns aos outros. Identifica-se a inte-gração
vertical no sentido de relacionamentos de recur-sos
complementares que operam em diferentes estágios
da cadeia de valor. É também interessante observar
que, diferentemente de outros setores como o automo-
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tivo, a produção no turismo não segue um processo com
seqüência rígida sendo que as atividades que compõem
um produto turístico não precisam ocupar uma posição
rígida na cadeia de valor, podendo ocorrer em qualquer
tempo.
Outra característica importante do setor é que são
necessárias empresas com produtos aparentemente
rivais e, portanto, podem contribuir para um mesmo
produto turístico. Na Figura 7 são apresentados alguns
laços horizontais que conectam empresas rivais e, por
operarem no mesmo estágio da cadeia de valor, ou por
oferecerem produtos substitutos para o mesmo merca-do,
ocorrem entre os restaurantes, hospedagens, ate-liês,
etc. É interessante observar que esta competição
contribui para a atratividade da Vila porque incentiva
a competição por preço, além de contribuir para a di-versidade
e flexibilidade, por exemplo, oferecendo dife-rentes
opções de sabores para diferentes interesses dos
clientes e dos dias da semana. Os atrativos naturais e os
atrativos culturais competem, mas de forma diferente
da rede de negócios.
As ligações verticais e horizontais podem ser formais
ou informais. Uma vez que as ligações formais são por
contratos registrados em fórum público, a maioria das
ligações, representadas nas Figuras 6 e 7 são informais
e não ocorrem de forma estrategicamente planejada en-tre
as empresas envolvidas. Elas são adequadamente
compreendidas no paradigma de redes sociais. Essas
relações informais podem ser essenciais como elemen-tos
alavancadores de todo o empreendimento turístico,
já que atuam integradores de recursos complementares
em opções, abrangendo desde pizzarias a restaurantes
de peixe, churrascarias, etc., criando flexibilidade e va-riedade
para os clientes. Em termos de rede o laço hori-zontal
não é visto somente do ponto de vista de conflito,
mas também de complementaridade. Este é o principal
ponto diferenciador de um enfoque de negócio para um
enfoque relacional, como o aqui apresentado. Este últi-mo
enfoque possibilita uma análise muito mais ampla
das relações entre empresas e permite até contestar al-guns
conceitos largamente consolidados de concorrência
entre empresas.
Das pesquisas realizadas por Pires (2006) pode-se
afirmar que a natureza da ligação entre os atores mos-tra
uma tendência de incremento da intensidade, com
crescente adesão dos atores da cidade, principalmente
os jovens e estudantes, no desenvolvimento dos papéis
de atores do turismo. Foram coletados relatos dos guias
e pequenos empresários sobre a consciência que tinham
dos seus papéis. Paralelo a esse movimento e interde-pendente
dele, a característica estrutural da rede atual
coloca o papel de ator (formas de relações) voltado para
Figura 6. Rede representativa dos recursos e atividades de Paranapiacaba. Fonte: Os autores, adaptado de Pires, 2006.
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A dinâmica da rede sob a perspectiva social: ...
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o turismo (que é o objetivo que ordena as relações), uti-lizando
de maneira específica os recursos (casas, máqui-nas,
etc), como objetos de turismo e não como objetos
utilitários.
Modelo Básico para Análise da Dinâmica da Rede
Unindo-se as contribuições teóricas e as análises so-bre
o caso apresentado, foi possível propor e sustentar
um modelo básico para pesquisas das mudanças cultu-rais
em redes. Este trabalho sugere que pesquisas com
o objetivo de analisar a dinâmica de uma rede de negó-cios,
a partir dos conceitos de redes sociais, tomem como
ponto de partida quatro principais elementos: A. Os ato-res:
B. os recursos que estão disponíveis à rede e a evo-lução
tecnológica que conduz a mudança nos objetivos e
na forma de aproveitamento dos recursos; C. As formas
de relações entre os atores, incluindo a maneira como
utilizam os recursos; D. Os objetivos que guiam todo o
sistema de relações. Estes fatores se interconectam em
sua evolução dentro do objeto de estudo. O modelo resu-mido
pode ser visto na Figura 8.
A Figura 8 deve ser vista como uma estrutura de ele-mentos
que organizam a rede, nas variáveis expostas
anteriormente, ou seja, a dinâmica, o conteúdo tran-sacional,
a natureza da ligação e as características es-truturais.
Assim, por exemplo, as relações de poder dos
engenheiros sobre os operários e outros habitantes da
Vila são compreensíveis quando se entende que o ob-jetivo
era a construção da ferrovia e que os objetos (a
tecnologia de construção) exigiam um rígido controle.
Quando o objetivo passa a ser o comércio na ferrovia,
num segundo momento, a autoridade do engenheiro as-sume
uma nova função, mudando a natureza das tran-sações
com os operários, agora objetivando a operação e
manutenção da ferrovia, com controles menos rígidos.
Assim, realizando uma análise temporal, com cortes
sucessivos no tempo, é possível perceber a evolução da
rede, conforme mostraram os vários desenhos. Uma im-
Figura 7. Inter-relação entre os negócios na área de alimentos. Fonte: construção dos
autores, 2009.
portante contribuição metodológica do
trabalho foi exatamente mostrar que é
possível realizar uma análise dinâmi-ca
de uma rede a partir de documen-tos,
entrevistas e reconstrução históri-ca,
substituindo em parte a técnica de
acompanhamento. O trabalho se confi-gura
inédito, já que não encontramos
similar na literatura brasileira.
Conclusões
O objetivo deste artigo foi desenvol-ver
uma análise de rede de negócios
Figura 8. Modelo teórico resumido para a dinâmica das redes.
Fonte: Construção dos autores, 2009.
Objeto
Objetivo
s
Recursos
Tecnologia
Objeto em
Análise
Atores
a partir da afirmativa de que as relações e a rede se
transformam no tempo. A partir da análise do caso, a
resposta obtida é que a afirmativa se mantém, ou seja,
há evolução das redes causadas por mudanças nos rela-cionamentos
entre atores, recursos e objetos.
Alguns autores (Larson, 1992) têm defendido a hi-pótese
de que redes são como produtos, que têm um
ciclo de vida e morrem. No entanto, ao considerar um
conceito de rede de negócios a partir do paradigma de
rede social (Castells, 2000), pode-se afirmar que a rede
se transforma no tempo, tanto em sua estrutura, quanto
em sua dinâmica, sendo desnecessário teórica e metodo-logicamente
seguir a idéia de ciclo de vida. A aceitação
dos ciclos tem levado os pesquisadores a analisarem
diacronicamente uma rede e concluírem sobre o está-gio
em que ela se encontra, ou, no máximo, com uma
comparação entre um momento anterior e o presente.
Uma análise histórica, conforme nossa proposta, busca
as mudanças da rede a partir de quatro fatores estrutu-rantes
- os atores, os recursos, a evolução tecnológica e
os objetivos, cuja interligação pode ser vista na Figura
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2. Os fatores se ordenam num amplo espectro de va-riáveis,
tais como as citadas por Tichy (1979) e organi-zadas
por Castells (2000), classificadas em quatro fato-res
a saber: A. A dinâmica da rede, entendendo-se como
as formas de relações entre os atores; B. Os conteúdos
transacionais, entendendo-se como o fluxo da rede, no
uso de objetos, C. A natureza da ligação, entendendo-se
como intensidades, freqüências, confiança e outras
medidas das relações, D. As características estruturais
da rede, entendendo-se como o tamanho, existência de
centralidade, de governança.
A partir do modelo da Figura 2 e baseado nos prin-cípios
do sistemismo, que considera relações causais bi-direcionais
e que busca a transformação das relações,
desenvolveu-se um raciocínio sobre as várias estruturas
e dinâmicas de redes que se sucederam no lugar conhe-cido
como Vila de Paranapiacaba.
A triangulação de dados a partir de documentos his-tóricos,
observações no local e entrevistas mostrou-se
adequada para fornecer dados sobre os movimentos da
rede. Os resultados apontaram que a Vila passou por
três estágios de configurações, com estruturas diferen-tes
de redes, com atores que foram se modificando (ou
sendo substituídos, ou realizando outras funções), com
recursos que tiveram seus destinos alternados (máqui-nas
e edificações que deveriam funcionar e hoje são para
olhar) e objetivos que se transformaram (de construir a
ferrovia, para o objetivo de comercializar, e atualmente
para o objetivo de realizar turismo).
A Vila é um caso único, pois nasceu de um projeto
político e comercial, tornou-se uma rede de construção
durante alguns anos, mudou sua estrutura para aten-der
aos objetivos comerciais após o término da cons-trução,
teve seu auge e declínio, estagnou, isto é, ficou
algum tempo sem objetivo definido, por isso seus atores
estavam com fluxos e atividades indefinidas, até que a
Prefeitura de Santo André colocou o novo objetivo de
destino turístico, reordenando as estruturas e dinâmica
dos atores.
A afirmativa de transformação da rede e o esquema
conceitual proposto abrem campos interessantes de pes-quisas,
numa corrente diferente das análises econômi-cas
de redes, que com uma certa rigidez concluem sobre
a capacidade competitiva da mesma e sobre seu ciclo
de vida, tal como se analisam os ciclos de negócios e de
cidades como Americana, no interior do Estado de São
Paulo, com sua tecelagem e Franca, também no interior
de São Paulo, com o negócio de calçados.
Concluímos que o caso analisado mostrou ser possí-vel
defender a tese do fluxo das redes, diferente da tese
do ciclo de vida. Outras cidades que têm se transforma-do
no tempo, tais como Parati, no Rio de Janeiro, que
tem se tornado centro cultural e São Luiz, no Maran-hão,
que tenta ser um centro empresarial, poderiam ser
analisadas na mesma perspectiva.
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