XXIII Coloquio de Historia Canario-Americana
ISSN 2386-6837, Las Palmas de Gran Canaria. España, (2018), XXIII-075, pp. 1-15
POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA - A. LATINA Y EL CARIBE
BRAZILIAN FOREIGN POLICY - LATIN AMERICA AND THE CARIBBEAN
POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA – A. LATINA E CARIBE
Alexis Toribio Dantas
Cómo citar este artículo/Citation: Toribio Dantas, A. (2020). Política exterior brasileña–A. Latina y El Caribe. XXIII Coloquio de Historia Canario-Americana (2018), XXIII-075.
http://coloquioscanariasamerica.casadecolon.com/index.php/CHCA/article/view/10472
Resumen: El objetivo de este artículo es analizar la evolución comercial brasileña e identificar elementos específicos que distinguen a la economía cubana en las transacciones con Brasil-estrategia de la política exterior brasileña en el contexto del MERCOSUR. Los principales resultados son: (a) desde el inicio del primer mandato del Presidente Lula, la orientación política lleva a un aumento de la importancia de la participación de América Latina y el Caribe (y particularmente Cuba) en el flujo comercial brasileño como un todo; (b) Cuba ha fortalecido su papel en la estrategia de internacionalización de las empresas brasileñas.
Palabras clave: Brasil, Cuba, Comercio, Inversión Extranjera Directa.
Abstract: The Aim of this article is to analyze the Brazilian commercial evolution and to identify specific elements that distinguish the Cuban economy in the transactions with Brazil - strategy of the Brazilian foreign policy in the MERCOSUR context. The main results are: (a) since the beginning of President Lula's first term, political orientation has led to an increase in the importance of the participation of Latin America and the Caribbean (and particularly Cuba) in the Brazilian trade flow as a whole; and (b) Cuba has strengthened its role in the internationalization strategy of Brazilian companies.
Keywords: Brazil, Cuba, Trade, Foreign Direct Investment.
Resumo: O objetivo deste artigo é analisar a evolução comercial brasileira e identificar elementos específicos que distinguem a economia cubana nas transações com o Brasil – estratégia da política externa brasileira no contexto do MERCOSUL. Os principais resultados são: (a) desde o início do primeiro mandato do Presidente Lula, a orientação política leva a um aumento da importância da participação da América Latina e do Caribe (e particularmente Cuba) no fluxo comercial brasileiro como um todo; e (b) Cuba tem fortalecido seu papel na estratégia de internacionalização das empresas brasileiras.
Palavras chave: Brasil, Cuba, Comércio, Investimento Estrangeiro Direto.
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é, então, analisar a evolução comercial recente do Brasil de modo a identificar os principais traços que distinguem a região e, particularmente, Cuba no âmbito das transações comerciais brasileiras. A América Latina e o Caribe são, explicitamente, alvos da política externa brasileira, sobretudo como uma extensão dos laços criados e solidificados a partir do Mercosul e, neste contexto, a inserção de Cuba ocupa também uma posição a se destacar. Desta forma, não só declarações oficiais da chancelaria brasileira, mas a própria
Professor em la Faculdade de Ciências Econômicas-Unversidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Brasil. Correo electrónico: alexis.dantas@gmail.com
© 2019 Cabildo de Gran Canaria. Este es un artículo de acceso abierto distribuido bajo los términos de la licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial-SinObraDerivada 4.0 Internacional.
ALEXIS TORIBIO DANTAS
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verificação dos números que marcam a evolução comercial brasileira recente reforçam a ava-liação da região como uma das metas prioritárias nas relações externas do Brasil. Segunda seção examina os pontos de destaque e distinção da relação comercial do Brasil com a Améri-ca Latina e Caribe no conjunto global das exportações e importações do país são aspectos integrantes deste estudo. A seguir, a terceira seção desenvolve a mesma questão no que se refere ao relacionamento Brasil-Cuba, buscando também avaliar as possíveis fontes de cres-cimento para as relações dos dois países. Na quarta seção, finalmente, são tecidos comentários finais acerca dos principais pontos tratados ao longo do texto.
EVOLUÇÃO COMERCIAL BRASILEIRA RECENTE: A IMPORTÂNCIA DE AMÉRICA LATINA E CARIBE
A economia brasileira apresenta superávit comercial recorrente desde o fim do regime de âncora cambial que marcou a implementação do Plano Real em julho de 1994. Desta forma, após a inversão do balanço comercial entre 1995 e 2000, fruto das medidas assumidas para a implantação da política de bandas cambiais com forte valorização inicial da nova moeda, o real, a crise externa de janeiro de 1999 e o consequente fim do sistema de âncora permitiram a melhora da situação do câmbio no Brasil, com o início de uma retomada na geração de supe-rávits.
Como mostram a tabela 1 e o gráfico 1, essa trajetória é, em grande parte, decorrente da rápida elevação das vendas externas, o que garantia um superávit crescente mesmo com o importante aumento simultâneo do volume de importações. Vale dizer, então, que o superávit comercial foi possível ainda que o ambiente fosse caracterizado pela retomada do crescimento econômico em níveis mais elevados que nos anos anteriores até o terceiro quartil da primeira década do século XXI.
Tabela 1 – Exportações, importações e saldo comercial – Brasil – 2011/2012
(USD bilhões correntes)
Anos
Exportações
2001=100
Importações
2001=100
Saldo Comercial
2001
58,29
100,00
55,60
100,00
2,68
2002
60,44
103,69
47,24
84,97
13,20
2003
73,20
125,59
48,33
86,91
24,88
2004
96,68
165,87
62,84
113,01
33,84
2005
118,53
203,36
73,60
132,37
44,93
2006
137,81
236,43
91,35
164,29
46,46
2007
160,65
275,62
120,62
216,93
40,03
2008
197,94
339,60
172,98
311,11
24,96
2009
152,99
262,49
127,72
229,71
25,27
2010
201,92
346,42
181,77
326,91
20,15
2011
256,04
439,28
226,25
406,90
29,79
2012
242,58
416,18
223,15
401,33
19,43
Fonte: MDIC/Brasil
Em 2011, tanto as exportações quanto as importações já estavam mais de quatro vezes su-periores aos volumes registrados em 2001, com pequena vantagem para o desempenho das POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA – A. LATINA Y EL CARIBE
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exportações (4,39 vezes maior contra um volume 4,01 vezes maior das importações no mes-mo período) – ver tabela 1. Deve-se observar, todavia, que o panorama começa a apresentar uma alteração relativa a partir de 2007. Neste ano, a taxa de crescimento das exportações foi significativamente inferior ao registrado pelas importações (praticamente a metade – 16,6% de crescimento das vendas externas contra 32,0% de incremento das compras internacionais). Essa situação já evidenciava o efeito do início da crise financeira internacional, sobretudo dos países desenvolvidos, detonada inicialmente nos Estados Unidos, sobre o nível de atividade econômica mundial – em um momento em que a economia brasileira mantinha seu ritmo de crescimento em marcha, pelo menos até 2009, o que sustentava a demanda por importações.
Gráfico 1 – Exportações, importações e saldo comercial – Brasil – 2011/2012 (USD bilhões correntes)
Fonte: MDIC/Brasil
Além disso, o início do último quartil da década marcou uma mudança fundamental na composição das exportações brasileiras: a queda absoluta e relativa das vendas externas de produtos manufaturados. Parte dessa alteração foi devida à fase cíclica favorável dos preços internacionais de commodities importantes na pauta de exportações do Brasil, o que ocorreu ao longo de toda a década. Ao mesmo tempo, a exportação de produtos industrializados so-freu dupla turbulência, sobretudo a partir de 2006/7 – ver gráfico 2.
Primeiro, como já apontado anteriormente, a queda do nível de atividade que sucedeu a grave crise financeira nos Estados Unidos e, posteriormente, nas grandes potências econômi-cas da União Europeia, o que ocasionou relevante retração na demanda por importações (a manutenção da demanda chinesa explica, em boa medida, o comportamento inverso das ex-portações de produtos básicos). Ademais, por outro lado, a conjugação de taxas juros elevadas no Brasil (também pelo cenário de crise externa, mas não só por isso) com uma contínua valo-ALEXIS TORIBIO DANTAS
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rização da moeda nacional, da mesma forma que estimulou o aumento das importações, de-terminou a queda substancial de competitividade da produção industrial brasileira1.
Gráfico 2 – Brasil – Exportações por fator agregado (1) – 2001/2011
Fonte: MDIC/Brasil
Exclusive Operações Especiais
Essa mudança no comportamento e na estrutura das exportações brasileiras determinou, da mesma forma, uma alteração importante na composição relativa dos destinos das vendas ex-ternas brasileiras – tabela 2.
Como é possível perceber, destinos tradicionais das vendas brasileiras, como os Estados Unidos e a União Europeia, viram suas parcelas relativas declinarem substancialmente ao longo da primeira década deste século, sobretudo no que se refere à participação estaduniden-se, que cai de quase um quarto do total do destino final dos produtos brasileiros comercializa-dos no exterior para aproximadamente 10% em 2011. No caso da União Europeia, a queda é de 26,6% para 20,1% na mesma comparação. As importações também seguem a mesma ten-dência, observando contínuo declínio da participação relativa de Estados Unidos e União Eu-ropeia no montante das compras do Brasil no exterior – ver tabela 2.
Por outro lado, a China apresenta um desempenho exatamente oposto neste aspecto. Entre 2001 e 2012, este país vê sua parcela nas exportações brasileiras aumentar de 3,3% para 17%, ultrapassando já em 2010 os Estados Unidos no ranking de parceiros comerciais brasileiros e se aproximando firmemente da União Europeia. Outro grupo de países que mantém importan-te parcela das transações externas do Brasil é a América Latina e Caribe – a participação rela-
1 Neste contexto, reinicia-se no país o debate acerca do possível processo de desindustrialização que po-deria resultar da combinação em longo período de juros altos e câmbio valorizado, especialmente por conta do aumento do coeficiente de penetração das importações e a lenta capacidade de resposta da indústria doméstica. Apesar de ainda longe de ser definida como uma tendência efetiva, o potencial efeito de desindustrialização está presente em boa parte das discussões atuais sobre o comportamento da economia brasileira. POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA – A. LATINA Y EL CARIBE
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tiva das exportações situa-se entre aproximadamente 20% e 25% ao longo da década, enquan-to as importações mantêm-se no entorno de 17% no período – ver tabela 2.
É importante ressaltar, entretanto, que o comportamento das relações comerciais entre Bra-sil com a China e com América Latina e Caribe é resultado de situações fundamentalmente distintas.
ALEXIS TORIBIO DANTAS
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Tabela 2 – Participação relativa – Exportações, importações, saldo comercial e corrente de comércio do Brasil – países e blocos de países selecionados – 2001/2012
China
Estados Unidos
União Europeia
América Latina e Caribe
Anos
X
M
Saldo
Corren-te
X
M
Saldo
Corrente
X
M
Saldo
Corrente
X
M
Saldo
Corrente
2001
3,3%
2,4%
21,4%
2,8%
24,4%
23,2%
48,5%
23,8%
26,6%
27,8%
1,6%
27,2%
23,2%
18,3%
126,1%
20,8%
2002
4,2%
3,3%
7,3%
3,8%
25,4%
21,8%
38,6%
23,8%
25,8%
28,6%
16,0%
27,0%
19,1%
17,7%
23,8%
18,5%
2003
6,2%
4,4%
9,6%
5,5%
22,9%
19,8%
28,8%
21,6%
25,7%
27,0%
23,2%
26,2%
20,3%
17,4%
26,0%
19,2%
2004
5,6%
5,9%
5,1%
5,7%
20,8%
18,1%
25,8%
19,7%
25,5%
25,4%
25,7%
25,5%
23,6%
16,5%
36,8%
20,8%
2005
5,8%
7,3%
3,3%
6,3%
19,0%
17,2%
22,0%
18,3%
22,8%
24,8%
19,6%
23,6%
25,5%
16,3%
40,6%
22,0%
2006
6,1%
8,7%
0,9%
7,2%
17,8%
16,0%
21,2%
17,1%
22,5%
22,1%
23,3%
22,4%
26,5%
18,4%
42,3%
23,3%
2007
6,7%
10,5%
-4,7%
8,3%
15,6%
15,5%
15,8%
15,6%
25,2%
22,2%
34,2%
23,9%
26,0%
17,7%
51,0%
22,5%
2008
8,3%
11,6%
-14,1%
9,9%
13,9%
14,8%
7,2%
14,3%
23,4%
20,9%
40,9%
22,3%
25,9%
16,4%
91,1%
21,5%
2009
13,7%
12,5%
20,2%
13,2%
10,2%
15,7%
-17,5%
12,7%
22,2%
22,9%
19,0%
22,5%
23,3%
17,8%
51,1%
20,8%
2010
15,2%
14,1%
25,8%
14,7%
9,6%
14,9%
-38,4%
12,1%
21,4%
21,5%
19,9%
21,4%
23,8%
17,0%
84,8%
20,6%
2011
17,3%
14,5%
38,7%
16,0%
10,1%
15,0%
-27,4%
12,4%
20,7%
20,5%
21,9%
20,6%
22,3%
16,7%
65,0%
19,7%
2012
17,0%
15,3%
35,9%
16,2%
11,0%
14,5%
-29,1%
12,7%
20,1%
21,4%
6,2%
20,7%
20,8%
17,3%
60,4%
19,1%
Fonte: MDIC/Brasil
ALEXIS TORIBIO DANTAS
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No caso da China, apesar do avanço inconteste das operações de exportação e importação do Brasil com o país, o saldo comercial, apesar de positivo, é relativamente baixo se compa-rado com o desempenho global das transações externas brasileiras, apresentando uma pequena inflexão positiva no final da década passada, exatamente quando o nível de atividade econô-mica no Brasil entra em período de declínio nas taxas de crescimento, principalmente no que diz respeito à indústria – ver gráfico 3.
Gráfico 3 – Exportações, importações e saldo comercial – Brasil/China – 2011/2012 (USD milhões correntes)
Fonte: MDIC/Brasil
Além disso, o que puxa claramente os números de exportação do Brasil em direção à China são as vendas de produtos básicos, caracterizados pelo baixo conteúdo tecnológico, cada vez com maior participação relativa, o que tem se mantido como uma tendência – ver gráfico 4. Apesar da pequena queda em 2012, a participação relativa dos produtos básicos no total das exportações do Brasil para a China salta de 60,7% para 85% entre 2001 e 2011 (82,8% em 2012). Enquanto isso, a venda de produtos manufaturados do Brasil para a China declina de 24,4% para 4,6% entre 2001 e 2011 (5,8% em 2012).
A relação brasileira com América Latina e Caribe tem uma outra composição econômica e política. É fruto de uma diretriz de política externa brasileira e com características de relações comerciais absolutamente diferenciadas. As declarações oficiais abaixo corroboram estas questões1:
1 BRASIL (2008), pp. 19,20, 24, 83,84. ALEXIS TORIBIO DANTAS
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Gráfico 4 – Exportações por Fator Agregado (1) – Brasil/China – 2011/2012
(USD milhões correntes)
Fonte: MDIC/Brasil
Exclusive Operações Especiais
When President Luiz Inácio Lula da Silva took office, Brazil changed the tone of its foreign policy; a policy that is concerned with the country’s sovereign insertion, at once universal and humanistic, firmly anchored in the interests of the Brazilian Nation and in the integration of South America2 […]The South-South relationship is not only possible; it is also necessary. The South is not an amorphous complex of underdeveloped and dependent countries that have nothing to offer other than raw materials to wealthy countries. (…) Together we can become stronger, not only through the growth of our trade, but also by participating more actively in economic and political forums, such as the World Trade Organization and the United Nations, where questions of great interest to humanity are discussed. (…) Now, a more intense, more creative and a stronger relationship between countries of the South, does not mean that we will abandon our relations with developed countries, which are also important to all of us. Let’s do what developed countries do; take advantage of all opportunities and make our union our strength3. Brazil is very similar to the Caribbean: a land of many cultures. We have the second largest population of African descendents in the world, only second to Nigeria. Like the Caribbean, we are proud to have provided a refuge for a great many European and Asian immigrants. Miscegenation and the harmonious co-existence (of our peoples) are a hallmark of our identities. (…) Brazil is prepared to move boldly forward, with flexibility and generosity to further this association.
2 “Speech by Minister Celso Amorim at “The Actuality of San Tiago Dantas” Seminar - Rio de Janeiro, September 27, 2004. In: Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomático. Brazilian Foreign Policy Handbook/Brazilian Ministry of External Relations, Bureau of Diplomatic Planning. - Brasília: Alexandre de Gusmão Foundation, 2008”.
3 “Speech by President Luiz Inácio Lula da Silva at the 58th United Nations General Assembly - New York, September 23, 2003. In: Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomá-tico (2008). Brazilian Foreign Policy Handbook/Brazilian Ministry of External Relations, Bureau of Diplomatic Planning. - Brasília: Alexandre de Gusmão Foundation.” POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA – A. LATINA Y EL CARIBE
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We will stimulate business and cooperation projects that go beyond our trade relations. We will encourage the circulation of goods and services and we will seek greater inter-regional agreements on all levels4 […]In Davos, at the beginning of this year, I said that Brazil had made an option for South America. An option that also extends to the whole of Latin America and the Caribbean. I am convinced that our region is more and more prepared to deal with the challenges of globalization. We are conscious of the fact that the destiny of our countries is becoming more and more intertwined5.
Essa postura da política externa reflete, obviamente, a definição de uma zona preferencial de relações e uma opção clara de modelo de desenvolvimento. Do ponto de vista comercial, a escolha é bem caracterizada e fundada na evolução das relações comerciais e econômicas dos últimos anos. Primeiro, verifica-se uma crescente expansão tanto das exportações e das im-portações com os países da região (ver gráfico 5), seguindo a trajetória das relações comerci-ais do Brasil de uma forma geral.
Segundo, e mais relevante, ao contrário da tendência global das transações comerciais bra-sileiras, em que os produtos básicos crescem sobremaneira na composição relativa das expor-tações totais, as vendas brasileiras para a América Latina e Caribe são cada vez mais concen-tradas em produtos manufaturados, característica praticamente mantida estável ao longo da primeira década do século XXI – ver gráfico 6. Desta forma, a região mantém-se como desti-no fundamental da produção industrial brasileira, sobretudo após 2006/7.
AS RELAÇÕES BRASIL/CUBA
Seguindo a política externa adotada especialmente a partir do início do primeiro governo Luís Inácio Lula da Silva em 2002, o Brasil vem estreitando, no período recente, os laços co-operativos com o Cuba, tanto no que se refere aos investimentos estrangeiros diretos quanto na busca por elevar a corrente de comércio com aquele país. Este comportamento converge com as linhas gerais da política externa brasileira, em que se destaca claramente a ênfase nas relações com a América Latina e o Caribe, com lugar importante para Cuba, como ressaltado nas declarações oficiais da diplomacia brasileira6:
“The end of the United States embargo on Cuba would greatly help to open discussions concerning the re-democratization of that country. A policy of constructive cooperation is always better than one of isolation. The more you isolate a country, the more rigid their internal structures become. For this reason, we maintain a policy of solidarity with a Latin American country which, for forty years has suffered an embargo with which we do not agree. We have discussed certain gestures. For example, we are against the death penalty, against summary judgments. But there are certain limits that have to be respected. We cannot substitute the Cuban people and their leaders, but we can contribute towards (creating) a more positive atmosphere7 […]I believe that what we are doing in this Seminar is taking an
4 “Press conference given by President Luiz Inácio Lula da Silva to media organizations in Algeria - Al-giers, February 7, 2006. In: Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomático (2008). Brazilian Foreign Policy Handbook/Brazilian Ministry of External Relations, Bureau of Diplomatic Planning. - Brasília: Alexandre de Gusmão Foundation.”
5 “Speech by President Luiz Inácio Lula da Silva during the closing session of the World Economic Forum on Latin America - Santiago, April 26, 2007. In: Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomático (2008). Brazilian Foreign Policy Handbook/Brazilian Ministry of External Relations, Bureau of Diplomatic Planning. - Brasília: Alexandre de Gusmão Foundation.”
6 BRASIL (2008), pp. 84,89.
7 “Interview given by Minister Celso Amorim to the Jornal do Brasil newspaper - Rio de Janeiro, July 24, 2003. In: Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomático (2008). Brazilian Foreign Policy Handbook/Brazilian Ministry of External Relations, Bureau of Diplomatic Planning. - Brasília: Alexandre de Gusmão Foundation.” ALEXIS TORIBIO DANTAS
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exceptional step (forward) so that Cuba and Brazil can interact with all their (respective) scientific and technological knowledge, their industrial development potential, and their potential in the area of services and tourism, so that we can increase, and build closer ties so as to mutually contribute towards the growth and development of both Cuba and Brazil. During recent months, I have invited Brazilian entrepreneurs to visit Cuba. (…) The globalized world, as it stands now, needs not only bolder trade policies but, above all, it requires the ability to bring together all that we have by way of our complementarities, so that we can have the means to compete on a more equal footing with countries that are technologically, economically and industrially more developed8.”
Gráfico 5 – Exportações, importações e saldo comercial – Brasil/América Latina e Caribe – 2011/2012 (USD milhões correntes)
Fonte: MDIC/Brasil
8 “Speech by President Luiz Inácio Lula da Silva during the Cuba-Brazil Meeting of Entrepreneurs - Ha-vana, September 27, 2003. In: Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomáti-co (2008). Brazilian Foreign Policy Handbook/Brazilian Ministry of External Relations, Bureau of Diplomatic Planning. - Brasília: Alexandre de Gusmão Foundation.” POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA – A. LATINA Y EL CARIBE
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Gráfico 6 – Exportações por Fator Agregado (1) – Brasil/América Latina e Caribe – 2011/2012 (USD milhões correntes)
Fonte: MDIC/Brasil
Exclusive Operações Especiais
Como mostram os gráficos 7 e 8, a corrente de comércio de Brasil e Cuba segue uma traje-tória de rápida expansão desde 2002, sobretudo no que diz respeito às exportações brasileiras – as importações, embora também cresçam, apresentam um ritmo bem mais moderado. Desta forma, o saldo comercial brasileiro é crescente e segue, em linhas gerais, um movimento mui-to próximo àquele apresentado pelas exportações destinadas a Cuba.
Gráfico 7 – Corrente de comércio Brasil/Cuba – 1994/2012 (1000USD correntes)
Fonte: MDIC
ALEXIS TORIBIO DANTAS
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Gráfico 8 – Relações comerciais Brasil/Cuba – 1994/2012 (USD 1000 correntes)
Fonte: MDIC
Um resultado claro desta situação é grande elevação da participação relativa de Cuba no volume total das exportações do Brasil, quatro vezes maior em 2012 que em 1994. As impor-tações brasileiras a partir de Cuba, todavia, reduzem sua participação relativa ao longo do período – apesar do crescimento em valor absoluto, as importações globais do Brasil regis-tram um maior incremento. De todo modo, é fundamental anotar que as relações comerciais de Brasil e Cuba ainda são muito pequenas no que se refere ao volume global das transações brasileiras.
Gráfico 9 – Participação de Cuba no comércio exterior brasileiro – 1994/2012 (1994=100)
Fonte: MDIC POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA – A. LATINA Y EL CARIBE
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Outro ponto importante a destacar é que a relação é também desigual no que diz respeito à lista dos principais produtos de importação e exportação, sobretudo quanto à diversificação dos produtos que compõem as pautas. Enquanto o Brasil apresenta um conjunto maior de produtos exportados, as compras desde Cuba são fortemente concentradas, fundamentalmente nos extratos de glândulas e cimento.
Tabela 3 – Principais produtos importados – 2012
PRODUTOS
%
EXTRATOS DE GLÂNDULAS, OUTS.ORGAOS,ETC.P/USO OPOTERA-PICO
72,30
CIMENTOS "PORTLAND",COMUNS
19,52
OUTS.FRACOES DO SAN-GUE,PROD.IMUNOL.MODIF.(MEDICAMENTOS)
4,69
CHARUTOS E CIGARRILHAS DE FUMO
1,33
Fonte: MDIC
Tabela 4 – Principais Produtos Exportados – 2012
PRODUTOS
%
OLEO DE SOJA,REFINADO,EM RECIPIENTES COM CAPACIDADE>5L
11,92
BAGACOS E OUTS.RESIDUOS SOLIDOS,DA EXTR.DO OLEO DE SOJA
11,59
MILHO EM GRAO,EXCETO PARA SEMEADURA
11,53
ARROZ SEMIBRANQUEADO, ETC.N/PARBOILIZADO,POLIDO,BRUNIDO
11,48
CAFE NAO TORRADO,NAO DESCAFEINADO,EM GRAO
4,57
PEDACOS E MIUDEZAS,COMEST.DE GA-LOS/GALINHAS,CONGELADOS
4,32
OLEO DE SOJA,EM BRUTO,MESMO DEGOMADO
2,71
ENCHIDOS DE CARNE,MIUDEZAS,SANGUE,SUAS PRE-PARS.ALIMENTS
2,02
SOJA, MESMO TRITURADA, EXCETO PARA SEMEADURA
1,77
OUTRAS PREPARAÇÕES / CONSERVAS DE GALO E GALINHAS
1,70
OUTRAS MAQUINAS E APARELHOS P/COLHEITA
1,69
CHAPAS,BARRAS,ETC.P/CONSTRUCOES,DE FERRO FUND/FERRO/ACO
1,15
Fonte: MDIC
O movimento de política externa do Brasil nos últimos anos parece contribuir para uma melhora gradual e crescente das relações dos dois países, não apenas do ponto de vista comer-cial. Em visita recente a Cuba, a Presidente Dilma Russef avançou significativamente na composição de acordos econômicos que podem se tornar fundamentais para as reformas pre-tendidas na ilha. Neste processo, os principais destaques observados são:
estimular o desenvolvimento de uma “zona de livre exportação” em Cuba, com financia-mento das obras de (re)construção e modernização do Porto de Mariel através da construtora brasileira Odebrecht;
expansão da refinaria de petróleo Cienfuegos; ALEXIS TORIBIO DANTAS
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abertura de linhas especiais de financiamento e aproximação com dirigentes de entidades classistas empresariais brasileiras (como a FIESP) e de instituições de fomento ao comércio;
investimentos no setor açucareiro também pela empresa Odebrecht em associação com a estatal cubana do setor.
No que se refere ao Porto de Mariel, Brasil e China serão responsáveis pela maior parte do financiamento e a ideia é torná-lo um dos maiores terminais da América Latina. Importante destacar a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do Brasil com a Odebrecht, reforçando o papel do Banco de estímulo à internacio-nalização das empresas brasileiras na direção de integração e cooperação sul-sul da política externa brasileira nos últimos anos. Além da reforma de mais de 30 km de estradas e a cons-trução de mais de 60 km de estrutura para ferrovias, estão previstos cerca de 20 km de acesso rodoviário entre outras melhorias. As obras de dragagem, fundamentais para o acesso de na-vios de grande calado, permitirão a movimentação de aproximadamente um milhão de contêi-neres por ano.
Junto às obras do Porto, pretende-se também criar uma zona de livre exportação. Neste contexto, foi estabelecido, concomitantemente, um convênio visando à criação de uma fábrica de medicamentos com recursos brasileiros e tecnologia desenvolvida em Cuba, com atenção especial para a produção de medicamentos anticancerígenos9. Vale citar ainda a expansão da refinaria de petróleo Cienfuegos buscando ampliar a produção atual de 65.000 barris para 150.000 barris diários.
No intuito de estimular as relações comerciais entre Brasil e Cuba, o governo brasileiro comprometeu-se a abrir uma linha de crédito de US$ 350 milhões para financiar a compra de alimentos por Cuba, utilizando para isso o Programa de Financiamento à Exportação (ProEx). Ademais disso, acordou-se a abertura de outra linha de crédito de US$ 200 milhões, nesse caso a partir da Câmara de Comércio Exterior (Camex), para o programa Mais Alimentos. O objetivo é facilitar a aquisição de equipamentos e insumos para a agricultura. Pelo lado cuba-no, o ministro de Comércio Exterior e Investimentos Estrangeiros, Rodrigo Malmierca, enfa-tizou a mudança na legislação permitindo a cessão em comodato de áreas para a construção de empresas e hotéis por 99 anos, renováveis indefinidamente. Considerando estas oportunida-des, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), Paulo Skaf, garantiu a participação da entidade na próxima Feira Internacional de Havana, em novembro próximo, onde 42 empresas brasileiras vão expor seus produtos.
Uma mudança marcante, todavia, refere-se à entrada do conglomerado brasileiro Ode-brecht para a produção de açúcar em Cuba, tornando-se o primeiro investimento de capital estrangeiro no setor açucareiro na ilha desde 1959. Através da COI (Companhia de Obras em Infraestrutura), subsidiária da Odebrecht em Cuba, a empresa firmará acordo com a estatal Azcuba para a administração produtiva da usina 5 de Septiembre em Cienfuegos, centro de Cuba, prevendo uma associação de 10 anos para incrementar a capacidade produtiva de moa-gem e revitalização da usina10. Com forte atuação no setor de bicombustíveis no Brasil, a Odebrecht é uma das maiores produtoras de etanol no país, e sua entrada na economia cubana certamente tomará esta direção, além da produção de energia a partir de biomassa. Empreen-dimento semelhante é realizado pelo conglomerado brasileiro em Angola, através de uma joint venture, indicando, portanto, uma estratégia global da Odebrecht. Desta forma, a produ-ção enquadra-se, do ponto de vista estratégico, na elevação da capacidade de exportação de
9 A construção de uma fábrica produtora de vidro também está em pauta, mas nesse caso em uma área fo-ra do Porto de Mariel, pois estas obras só estarão finalizadas, de acordo com a previsão atual, em 2014. A fábrica brasileira de vidro Fanavid será a responsável pelo empreendimento, em associação com o governo cubano, e o objetivo é destinar cerca de 80% da produção para o mercado internacional.
10 Cabe salientar que a produção cubana caiu de cerca de 10 milhões de toneladas em 1970 para pouco mais de um milhão de toneladas na última safra. POLÍTICA EXTERIOR BRASILEÑA – A. LATINA Y EL CARIBE
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etanol pela empresa, embora haja um longo processo de investimento necessário para recupe-rar a capacidade produtiva em Cuba (grande parte das terras está, há longo tempo, abandona-da).
COMENTÁRIO FINAIS
A América Latina e Caribe vêm registrando importante e crescente participação relativa nas relações comerciais brasileiras, resultado de uma explícita orientação política com visíveis reflexos na esfera econômica. Mais que isso, a região é um destino chave das exportações de bens manufaturados do Brasil, cujo crescimento contrasta com a tendência geral do comércio brasileiro de elevar a participação relativa dos produtos básicos no volume global das expor-tações – caso das relações de comércio com a China.
Vale ressaltar, no entanto, que boa parte deste desempenho decorre das relações no âmbito do Mercosul, um bloco que avançou fortemente desde sua criação em 1991 (mesmo com a recorrência de entraves comerciais e lutas internas de segmentos produtores nos países signa-tários, sobretudo Brasil e Argentina). Todavia, o direcionamento pró América Latina e Caribe como uma extensão natural do próprio Mercosul é bastante evidente neste contexto.
No que se refere a Cuba, os laços cooperativos são cada vez mais estreitos, com reflexos nos investimentos estrangeiros diretos efetivos e potenciais (além dos esforços para aumentar a corrente de comércio dos países). Um resultado apresentado neste trabalho é que, apesar de ainda muito pequena em comparação com o total brasileiro, a corrente de comércio Brasil-Cuba cresceu significativamente, puxada principalmente pelas exportações brasileiras.
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