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A GUERRA DA INDEPENDÊNCIA DE CUBA
NA IMPRENSA BRASILEIRA (1895 - 1898)
Corcino Medeiros dos Santos
Introdução
Recebi com grata satisfação a idéia sugerida por Don Francisco Morales Padron,
de escrever este “paper”. Não havia, até então, trabalhado com este tipo de fontes. Mas
indo aos jornais brasileiros da época, verifiquei tratar-se de assunto, cuja importância exigiria
fosse tratado dentro de um espaço maior que o estabelecido para uma ponência.
Pudemos notar que a imprensa brasileira fazia ampla cobertura da guerra da
independência cubana. Escolhemos, entretanto, três periódicos: o Jornal do Brasil, o Jor-nal
do Comércios e a Revista Ilustrada.
O primeiro era mais discreto ao noticiar a Revolução cubana, mas ao noticiar a
guerra hispano-norte-americana, demonstrava maior simpatia para com a República Nor-te-
americana. O Jornal do Comércio, no entanto, tinha uma posição discretamente favorável
aos cubanos e norte-americanos. Posição indisfarçada nos longos e ditoriais que dedicava
à guerra hispano-norte-americana. A Revista Ilustrada tinha uma posição escandalosa-mente
oposta aos interesses espanhóis na América e a favor da independência de Cuba sob
a influência do poderoso vizinho norte-americano.
Antecedentes da Revolução de 1895
Em 1865 em Espanha foi aprovado um projeto de reforma colonial que tinha o
objetivo tornar mais pragmáticas, amistosas e proveitosas as relações da metrópole com as
colônias. Entre outras coisas esse projeto fixava: “Art. 1º Autoriza-se ao ministro do Ul-tramar
abrir uma informação para: 1º) sobre as bases em que devam fundar as leis especiais
que ao cumprir o Art. 80 da Constituição da Monarquia espanhola, devem apresentar às
Cortes para o governo das Províncias de Cuba e Porto Rico; 2º) sobre a maneira de
regulamentar o trabalho da população de cor e asiática (...); 3º) sobre os tratados de
navegação e comércio que convenha celebrar com outras nações...”. No Art. 7º do mesmo
projeto diz que para esclarecer os fatos e questões que houvesse de ser objeto da informação
a junta ouviria...: “1º) aos governadores superiores civis, aos regentes e aos intendentes
em exercício, das Ilhas de Cuba e Porto Rico...; 2º) a todos os senadores naturais daquelas
províncias, ou que hajam residido nelas por espaço de 5 anos; 3º) a 22 comissionados
naturais ou moradores de alguma das povoações da Ilha de Cuba ou da de Porto Rico...;
4º) as outras 22 pessoas, 16 pela Ilha de Cuba e 6 pela de Porto Rico que designe o minis-tro
do Ultramar entre os que hajam residido durante 4 anos nas Antilhas...”.1 Estas refor-mas
coloniais foram mal aplicadas ou posteriormente abastardadas em Cuba por elemen-
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tos reacionários e escravistas ali dominantes. Ali não houve garantias nem direitos. O
estado de sítio foi a base de toda aquela ordem política e social. Os bandos dos Capitães
Generais, resolviam tudo. Em conseqüência desse estado de coisas iniciou-se em 1868 em
Cuba a insurreição que manteve um estado de guerra na Ilha até 1878, quando Martinez
Campos, seguindo uma política de conciliação chegou ao Convênio de Lanjón (12-02-
1878) que pôs fim à cruel e devastadora luta de 10 anos.2 Esta foi denominada pelos
cubanos de a guerra grande. Antes e depois desta houve levantamentos, sublevações e
insurreições que caracterizaram o século XIX em Cuba.
No Convênio de Lanjón se prometeu para a Ilha de Cuba as mesmas condições
políticas, orgânicas e administrativas, que desfrutava a Ilha de Porto Rico. Mas isto não
aconteceu, embora houvesse melhorado as condições vigentes em Cuba. Descontentes e
estimulados pelos Estados Unidos da América do Norte, iniciaram nova guerra em 1879,
na parte oriental da ilha, a guerra chiquita. Esta insurreição dirigida por Calixto Garcia foi
facilmente vencida, o mesmo acontecendo com as tentativas que ocorreram em 1883 e
1885.
O expansionismo norte-americano tinha interesses nas Antilhas que eram
antagônicas aos de Espanha na região. Por isso, nas instruções dadas ao embaixador em
Madrid (fevereiro, 1874) se expressava claramente o pensamento dos Estados Unidos
acerca das Antilhas. Cuba devia ser uma República, sem outros laços com a Europa que os
de amizade e comércio. Na verdade a Espanha não estendeu a Cuba as reformas liberais
feitas na Península depois da guerra chiquita. Então o descontentamento dos cubanos foi
aproveitado pelos Estados Unidos.
Exilado nesse país, José Marti insiste continuamente numa pregação da guerra
como um dever de honradez, dizendo: “El que no ayuda hoy a preparar la guerra, ayuda a
disolver el país. La simple creencia en la probabilidad de la guerra es yá una obligación, en
quien se tenga por honrado, juicioso, de coadyuvar a que se purifique o impedir que se
malee la guerra probable”. Essa incitação à guerra contínua no artigo de Patria de 19-08-
1893: “Ala patria libre! Al remedio único y definitivo! La pobreza actual es una obliga-ción
mayor, es una prueba más de la necesidad de andar de prisa y de acabar de una vez...
El partido Revolucionario, aunque el calor de los suyos le despedace el corazón, no se
quedará cobarde donde no hay remedio para ellos...”.3
Nos Estados Unidos, através do partido revolucionário, não cessava de fazer con-tactos,
comícios e reuniões em busca do apoio dos emigrados, de armas e dinheiro para
reiniciar a luta pela independência. Os preparativos e o interesse dos Estados Unidos eram
tais que não puderam retroceder. Assim, a insurreição começou precisamente quando as
reformas votadas pelas Cortes em 13-02-1895 pareciam ser uma garantia de paz duradoura.
A Revolução de 1895
Não obstante o decidido apoio dos Estados Unidos, a idéia de Marti pôs em prática
era a de que a revolução não devia ser importada em Cuba (...) mas devia surgir dentro do
próprio país, limitando-se os de fora a dar apoio moral e material, facilitar o desembarque
dos chefes que se encontravam no exterior. Deviam também prover de armas e apetrechos
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de guerra aos que na terra amada levantassem a bandeira da rebelião. Essa idéia ou plano
foi acolhido com entusiasmo na ilha e em 1894 já existiam numerosos núcleos
revolucionários em todas as províncias, daí acertarem a explosão do movimento para
fevereiro de 1895. De fato assim sucedeu. O Jornal do Brasil de 3 de março de 1895
afirma que o ministro da fazenda da Espanha pediu no orçamento desse ano um crédito de
40 milhões de pesetas para a conclusão dos navios de guerra. O mesmo jornal informa
ainda que na metrópole, 6.300 homens estavam prontos para embarcar para Cuba ao mesmo
tempo em que os contingentes disponíveis em Porto Rico recebiam ordens de se deslocarem
para Cuba. Informa também ter o Senado votado uma moção aconselhando o governo a
mandar tropas de reforços para Cuba e, em resposta o ministro da guerra prometeu mandar
oito batalhões. Acrescenta que os revoltosos estão organizados em partidos. Com estas
informações deixa a entrever a gravidade da situação em Cuba. O Jornal do Brasil, de 05-
03-95, informa ter embarcado em Cadiz 6.000 soldados em direção a Cuba, mas que o
governo espanhol havia decidido a mandar mais 20.000 homens. Por outro lado, dá conta
de que as primeiras operações contra os rebeldes haviam sido coroadas de êxito; mas que
essas primeiras vitórias contra os rebeldes cubanos estavam ameaçadas pela epidemia da
influenza que atacava milhares diariamente. Grande parte do pessoal da polícia e do exército
estava atacada pela doença e os médicos não tinham condições de atender a todos os
enfermos.
Efetivamente não era só esta enfermidade que atacava aos espanhóis. Outro
inimigo que enfrentaram em Cuba foi a febre amarela. Essas doenças epidêmicas atacavam
muito mais às tropas espanholas que aos revolucionários. A razão dessa
desproporcionalidade era devido a problemas de adaptação e à concentração de pessoas
nos quartéis e acampamentos. Desse modo, a Espanha passa a enfrentar vários inimigos
ao mesmo tempo, tanto em Cuba quanto nas Filipinas e na própria metrópole. Contudo,
informa o Jornal do Brasil de 14-03-95 ter descoberto em Havana um grande depósito de
armas dos rebeldes ao mesmo tempo em que as tropas legais anunciavam a pacificação de
cinco províncias e havia esperança de que a pacificação total não tardaria. No mesmo dia
informa o periódico que o Capitão General das Filipinas pedia com urgência forças para
sufocar a sublevação. Em conseqüência o batalhão de marinha que estava no Ferrol para
embarcar para Cuba recebeu ordens para marchar para Manilha. Em Madrid a situação era
de intranqüilidade, de um lado, as agitações e atentados promovidos pelos anarquistas, de
outro a instabilidade política provocada pela renúncia do ministério. Completa esse quadro
a informação do Jornal do Brasil de 19-03-95: “A imprensa muito excitada pela atitude
dos chefes do exército diz que o governo não tem energia bastante para punir os culpados,
e que um triste porvir se prepara para a Espanha. A Guarnição de Madrid aprova a atitude
dos oficiais que saquearam as oficinas do El Globo.
“Reina grande agitação, temendo-se que haja graves conflitos. Muitos oficias
têm sido vaiados nas ruas...”
O Jornal do Brasil de 25-03-95 informa estar organizado o novo ministério,
subindo com ele o partido conservador. A opinião da imprensa em geral era contrária a
essa mudança política e diz mais: “Mateo Sagasta era o mais forte sustentáculo da
Monarquia, pela sua rara ciência das contemporizações e pela extraordinária diplomacia
com que sabia ceder sem cair (...)”.
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O partido republicano encontrava neste estadista um verdadeiro obstáculo à mar-cha
da sua propaganda e das suas aspirações, porque uma monarquia constitucional ho-nesta
e liberal exclui a idéia de República. Os jornais mais apaixonados censuram a regen-te,
que cedeu à força, dando do mundo o espetáculo de um governo que cede ante as
baionetas indisciplinadas”. Enquanto isto, a situação em Cuba piorava para as tropas
espanhola porquanto “telegrama oficial de Havana anuncia a completa derrota das tropas
espanholas em Campochuelos. O presidente do Conselho de ministros, Cánovas del Cas-tillo,
anunciou esta notícia ao senado, dizendo que o país deve estar resolvido a qualquer
sacrifício para reprimir a revolta” (Jornal do Brasil de 29-03-95). De fato toda a Espanha
estava disposta a não economizar esforços para manter em Cuba a soberania espanhola.
Tanto era assim que as dez expedições enviadas com 127.000 homens somava a uma de
40.000 e outra de 20.000 em preparação. Assim, a presença militar da Espanha na ilha
chegava a 200.000 homens em armas. Desse modo “A firma decisão de manter a integridade
territorial era unânime em todos os partidos políticos. Cuba era inegociável.4
Nos Estados Unidos, o presidente Cleveland declarava boas intenções em coope-rar
com a Espanha para a pacificação de Cuba, abstendo-se de apoiar os revoltosos. Mas
os acordos e apoio do Congresso contrariavam a orientação da Casa Branca. As expedições
que partiam das costas norte-americanas com armas e víveres rumo a Cuba, com a
cumplicidade de algumas autoridades locais estimulavam a rebelião. Desse modo eram
violados os tratados internacionais que vetavam o envio de armas, munições e explosivos
aos insurgentes.
Do mesmo modo que nos Estados Unidos, a maioria dos periódicos sul-america-nos
apoiavam a Revolução cubana. A Revista Ilustrada nº 709 de 1895 publicou esta
charge.
“Tudo pela liberdade” Viva Cuba!
O acto do Senado norte-americano reconhecendo a belligerancia dos cubanos, enche de alegria os volun-tarios
de tão nobre causa e enthusiasma todas as nações do nosso continente. Avante!”
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A Revista Ilustrada parece que seguia a mesma linha do partido revolucionário
cubano no exterior. Em suas páginas não há sequer uma palavra de simpatia para com a
Espanha, mas apologia à revolução cubana e um permanente incitamento à rebeldia e
apelo à colaboração americana. No seu nº 691, de 1895, dizia em editorial: “Já hoje é
irreversível a corrente da simpatia que atravessa o continente americano, pronunciando-se
em favor dos heróis de Cuba, que pedem, para sua pátria, o que todos nós já reivindicamos
pelos meios ao nosso alcance: a independência e a República!”.
O que quisemos para nós, desde os Estados Unidos da América até São Domin-gos
e Haiti não podemos recusá-lo aos filhos desse região abençoada chamada a Pérola
das Antilhas. (...) Em toda a América do Sul, nomeadamente no Chile, na República Ar-gentina,
e agora no Brasil, um brado uníssono se levanta em prol da liberdade de Cuba.
Comícios, reuniões e movimentos de sociedades políticas tem sido, levado o efeito para
dar aos heróis cubanos, que se batem pela liberdade da sua pátria um testemunho de adesão
e de solidariedade.
Nos Estados Unidos, de há muito que o movimento simpático da sua população
se manifesta por todos os modos em prol da integridade da América, na forma republica-na...”.
No mesmo editorial informa ter o jornal O país do Rio de Janeiro publicado um
vibrante artigo sobre essa luta e que o Clube Tiradentes havia feito um vigoroso protesto
assinado pelos mais ilustres republicanos e o Clube União Comercial também havia se
manifestado a favor dos revolucionários cubanos e continua dizendo: “A proclamação da
República em Cuba já foi feita, tendo ela, já hoje, um governo provisório, à cuja frente
está o insigne patriota Extrada Palma...”.
No seu nº 698, de 1895, aproveita o 12 de outubro, aniversário do descobrimento
da América para num editorial de página inteira, sob o título A luta pela liberdade de Cuba
para dizer entre outras coisas o seguinte: “Tantos anos após a descoberta do grandioso
continente, que a passos de gigante, vai realizando o ideal dos povos modernos, e ainda a
formosa Cuba, a pérola das Antilhas, geme vergada ao jugo da metrópole, e bate-se pela
liberdade, quebrando os grilhões do despotismo colonial! (...) Por isso em armas, escudada
no heroísmo de seus filhos, oferece ao mundo o espetáculo singular de um púgilo de
heróis, lutando até ao desespero com uma grande nação e vencendo-a diariamente (...)”. E,
mais adiante faz uma ressalva para pousar os republicanos espanhóis, dizendo: “Não temos
contra a Espanha o mínimo motivo de má vontade, antes ao povo que já soube proclamar
a República à voz de Pi y Margall, Salmeron e outros, nos ligam laços de profunda simpatia.
Mas não é a causa do povo espanhol que está em jogo em Cuba, mas simplesmente a
dinastia reinante...”.
No mesmo número publica uma gravura a bico de pena ocupando duas páginas
centrais da revista onde se vê ao longe a estátua da liberdade nos Estados Unidos, o mar
com barcos de guerra espanhóis desembarcando tropas. Em terra Cuba representada por
uma mulher santa com um halo de luz envolvendo sua cabeça, quebrando as correntes que
a mantém presa pelos braços; elegantemente vestida e tendo de cada lado um soldado
espanhol a lhe dar coronhadas e às costas outro com a espada desembainhada a ameaçar
cortar-lhe o pescoço. Mais adiante terra a dentro, quatro soldados cubanos tombados ao
lado de seus rifles, um tambor e uma roda de carro ou carroça. Mais adiante ainda se vê um
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batalhão de revolucionários que marcha em direção aos espanhóis com suas armas em
punho, hasteando uma bandeira onde se lê a palavra liberdade e tendo à frente o coman-dante
que com a espada erguida dá sinal de avançar. Ao longe vê-se também, atrás do
batalhão em marcha, coqueiros, canaviais e os casarões de um engenho de açúcar.
O significado dessa gravura é muito mais denso e abrangente do que a sua legenda
que tem o título Em prol da liberdade de Cuba e subtítulo “A formosa Cuba, a pérola das
Antilhas, a jóia mais fulgente da Espanha ainda luta pela liberdade, mas há de vencer. Viva
Cuba! Viva!”.
No mesmo número a Revista Ilustrada publica significativamente a gravura me-nor
da mesma mulher representando Cuba com uma cara alegre as grilhões a cair dos seus
braços, soldados espanhóis em fuga e junto aos seus pés restos de apetrechos de guerra e
com a inscrição em sua saia: A pérola das Antilhas. Esta gravura, também repleta de signi-ficado
mostra como a imprensa brasileira sob a influência dos republicanos brasileiros e
do continente anteviam a liberdade de Cuba.
A Revista Ilustrada nº 711, de 1895, publicou esta charge seguida do texto abaixo:
“Em Cuba continuam as victorias dos heroicos revolucionarios, e, já agora, a America em pezo não póde
deixar de intervir n’essa lucta homerica pela liberdade”
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“Pela liberdade de Cuba! É actualmente o grito unisono e patriotico de todos os que sabem apreciar o
heroismo de um Povo ancioso por quebrar os grilhões do captiveiro.
Viva Cuba!
“A Hespanha e os Estados Unidos tanto resingaram que até chegaram às ultimas. É uma lucta terrivel,
mas desde já todos anteveem um resultado: Cuba livre!”
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Gloriosa Cuba!
“A Hespanha da Inquisição e dos pronunciamentos, lá aonde a monarchia agonisa
aos gritos de pan y toros, e onde os politicos do passado, para a posse do poder,
subjugam a altivez do leão popular, que ruge ameaçadoramente; essa Hespanha
reune todos os esforços do obscurantismo para suffocar na bocca da mais formosa
das Antilhas o grito sagrado de liberdade, de independencia e de viva a Republica!
Aos olhos do mundo offerece-se, neste momento, o espectaculo singular e barbaro
de uma luta descommunal entre um punhado de heróes, que o amor da patria
electrisa, e os exercitos possantes de uma dynastia que, para se manter, estrangu-la
os proprios filhos!”
A gravura tem duas mulheres, uma representando Cuba que está a se erguer com
uma espada na mão. A outra tomando-a pela outra mão e ajudando-a pela mão a levantar-se.
Esta representa com as bandeiras, as repúblicas americanas, tendo em primeiro plano a
dos Estados Unidos. Efetivamente parece que era mesmo essa a posição daquela república
em relação a Cuba. Em editorial com o título Cuba Livre publicado na Revista Ilustrada
nº 723 de 1897, diz: “Pelas palavras de Canovas del Castilho, de que a Espanha so pode
contar consigo, vê-se que o mundo inteiro é favorável à reivindicação da liberdade natural
para a pérola das Antilhas.
Cá na América, se todas as nações se orgulham da sua independência e consagram
como feito nacional o dia em que sacudiram o julgo das respectivas metrópoles, claro é
que não podem recusar aos outros o que reclamaram para si. (...) É geral nas nações ame-ricanas
o entusiasmo pela libertação de Cuba e, conforme o adiantamento e progresso de
cada uma delas, assim maior ou menor é o entusiasmo com que esses sentimentos se
manifestam.
Nos Estados Unidos essa solidariedade é mais expressiva e mais ardente, não só
pela aproximação, mas porque o povo está mais ao fato da epopéia que se passa em Cuba”.
E, continua citando trechos de carta de um amigo residente em Washington, que diz: “Cuba
livre é tão popular aqui, tão simpatizada por todos de ponta a ponta e de lado a lado dos
Estados Unidos, que não se compreende como o governo possa resistir à pressão da opinião
pública, manifestada por todos os modos. Basta dizer que jovens americanos, gentlemen
do sport, finos clubmen, partem quase diariamente para a ilha, a baterem-se pela liberdade
de seus irmãos.
Há poucos dias, o comité revolucionário de Nova York lançou um empréstimo de
três milhões de dólares, que foi logo coberto três ou quatro vezes, sendo que um só milionário
de Chicago quis tomá-lo todo para si. Cleveland, não se pode negar é simpático à libertação
de Cuba, mas nada tem podido fazer, com receio de complicações internacionais. Esta-mos,
porém, às portas de uma eleição presidencial, e quando não houver mais risco de se
dizer que tomou essa atitude para favorecer o seu partido, cremos que ele se manifestará.
A esquadra americana, poderosíssima hoje e talvez a primeira do mundo pelo
aumento que tem tido nos últimos tempos e pelo aperfeiçoamento de todo o seu material,
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está se concentrando ao sul, nas proximidades de Havana. (...) Estamos às vésperas de
grandes acontecimentos em Cuba, e aqui o entusiasmo renasce por toda a parte. Sabe-se
que Máximo Gomes, à testa de um exército de 8 ou 10.000 homens de infantaria e 6 mil de
cavalaria, marcha sobre uma das capitais da província. Tomando-a, fará nela seu ponto de
apoio para atacar Havana, que não resistirá...”. Vê-se pela precisão dos informes que o
misterioso informante estava ao par de tudo que se passava nos Estados Unidos em relação
aos preparativos de guerra contra a Espanha.
No nº 701, a mesma revista dera notícia de uma coleta para arrecadação de fundos
para os revolucionários cubanos, organizada no Rio de Janeiro pelos redatores de O País.
Fala da subscrição mas não informa como esse dinheiro chegaria aos revolucionários.
Apesar de continuarem as negociações, os preparativos de uma guerra total con-tra
a Espanha continuavam dentro e fora da ilha. Os ingressos econômicos proveniente da
emigração, das doações de cidadãos norte-americanos e de alguns países sul-americanos,
além dos empréstimos levantados nos Estados Unidos foram de fundamental importância
para o financiamento da guerra da independência. Por isto o governo espanhol da ilha, a
fim de impedir que os tabaqueiros cubanos na Flórida financiassem com suas quotas aos
sublevados, impôs restrições à exportação de tabaco. Por outro lado, procuraram acertar
com os senhores de engenho uma proteção da safra, mediante uma contribuição de 50
centavos por saco, antecipando a metade do importe correspondente à totalidade da colheita.
Por isto uma das decisões de Weyler que mais podia prejudicar aos rebeldes era a supressão
da safra e da moagem. Em contrapartida o governo revolucionário ditou uma taxa de 2%
como aporte ao empréstimo em favor da insurreição. “Se debia entregar sobre el monto
total del valor de sus bienes y a un interés del 6%. Los que no obedecieran esa disposición
se considerarian enemigos y sus propriedades serian destruidas o confiscadas”.5
O Jornal do Brasil de 04-01-97 informava que de acordo com dados estatísticos
recebidos de Cuba, a produção de açúcar do ano de 1896 havia sido de 160.000 toneladas
e a de tabaco de 75.000 fardos. A produção era muito menor que nos tempos normais. Esse
decréscimo tinha sido causado pela devastação que os insurretos fizeram nos campos de
tabaco e nos canaviais.
Durante o mês de janeiro de 1897 o Jornal do Brasil divulgou notícias da aprovação
das reformas para a ilha de Cuba; vitórias das forças espanholas contra os revoltosos de
Cuba e das Filipinas e demonstrava esperança de breve pacificação. Mas Cuba independente
sob o protetorado da Espanha não interessava aos Estados Unidos. Por isso injetaram mais
recursos na revolta cubana, enquanto nos Estados Unidos, “os partidários da moção
Cameron no senado declaram que o presidente Cleveland deve deferir a vontade dos eleitos
da nação.
Eis o texto da resolução notificado pela comissão de relações exteriores do sena-do:
“Fica resolvido pelo senado e pela câmara que a independência de Cuba existe; que é
reconhecida pelos Estados Unidos; que os Estados Unidos empregarão os seus bons ofícios
junto da Espanha para preparar o fim da guerra”. E acrescenta o Jornal do Brasil que o
Congresso norte-americano sustentava firmemente a posição de que os revolucionários
cubanos estavam aptos a proclamar a independência de Cuba. Nesse caso o presidente
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Cleveland seria obrigado a conformar-se com a resolução conjunta das duas câmaras.
Essa resolução abria o caminho para uma intervenção armada dos Estados Uni-dos
no conflito hispano-cubano. Os preparativos para isto já estavam em andamento e
dentro dessa linha de conduta, informa o Jornal do Brasil, de 15-02-97: “telegramas de
Nova York atribuem ao Sr. Mac Kinley a intenção de reconhecer a independência da ilha
de Cuba, se os espanhóis não tiverem conseguido a pacificação até o fim de março próxi-mo”.
O Jornal do Brasil de 3 de janeiro de 1898 diz ter informado o New York Herald
que dentro de um trimestre Cuba estará independente e acrescenta terem os ministros
cubanos tomado posse com o juramento de costume.
Esse fato será um passo decisivo para se obter o reconhecimento pelos Estados
Unidos.
O Jornal do dia 6 do mesmo mês diz que o New York Herald publicou uma carta
do general cubano Calixto Garcia dizendo que a independência de Cuba estava iminente e
que era gravíssima a situação das forças espanholas em Cuba, em conseqüência da
intensificação dos ataques dos rebeldes e das doenças. E, acrescenta: “os revolucionários
cubanos aumentaram e a luta torna-se cada vez mais violenta...”.
O Jornal do Brasil de 9 de janeiro de 1898 diz: “O Heraldo, jornal liberal
independente publicou um telegrama do seu correspondente em New York em que este diz
que o presidente Mac Kinley tenciona intimar a Espanha a terminar a guerra em Cuba”.
Informa também o mesmo periódico que o Sr. Emílio Castellar, chefe do partido republi-cano
espanhol, publicou um artigo em que afirma: “uma intervenção dos Estados Unidos
em Cuba eqüivaleria à partilha da Polônia e alienaria a este país toda América Latina”. O
Jornal do Brasil do mesmo dia diz também que El Imparcial, de Madrid, teme um iminente
conflito armado entre Espanha e os Estados Unidos e “por isso convida novamente a
Espanha a tomar todas as precauções para não estar desprevenida no momento em que as
circunstâncias exigir”.
A guerra hispano-norte-americana
Nesse ambiente de desconfianças mútuas, Washington mandou o Couraçado Maine
em visita de cordialidade a Cuba. Ao ancorar no porto de Havana esse navio de guerra
provocou grande expectativa, tanto aí como em Madrid, informa o Jornal do Brasil de 27-
01-98. Em conseqüência o ministro da marinha para dar satisfação à opinião pública
convocou uma coletiva da imprensa para dizer da escolha dos navios de guerra que conviria
mandar visitar os portos dos Estados Unidos em retribuição à visita do cruzador Maine, a
Havana.
Em Washington começam a preparação do ambiente psicológico que explicaria o
atentado sofrido pelo Maine no porto de Havana. Os jornais informam quase que diaria-mente
o clima de tensão criado. Ora era o consulado de Havana que se sentia ameaçado,
ora era o cruzador que poderia sofrer um atentado. Segundo a imprensa de Nova York e de
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Madrid, transcrita pelo Jornal do Brasil e Jornal do Comércio, esse atentado já era espe-rado.
O Jornal do Brasil de 17-02-98 diz que a explosão do cruzador Maine, segundo
a declaração do respectivo comandante e dos oficiais, se deu no alojamento da equipagem
e acrescenta que telegramas de Madrid dão conta que o desastre do cruzador Maine foi
atribuído ao descuido do pessoal de bordo quando procediam à limpeza dos torpedos,
tendo um destes provocado a explosão.
Os jornais continuam acompanhando o caso e informam que uma primeira
conclusão da comissão de inquérito que apurava as causas da explosão era a de que esta
teria acontecido dentro do navio. Mas dias depois a mesma comissão conclui que a explosão
foi provocada de fora para dentro do navio. Desse modo, o atentado teria sido provocado
por um torpedo espanhol, vindo não se sabe de onde. De qualquer modo estava aí nesse
incidente o fogo no estopim da bomba que seria a guerra hispano-norte-americana. Os
Estados Unidos parece que tinha urgência, porquanto tendo a explosão ocorrida em 15 de
fevereiro, em 20 do mesmo mês já o governo de Washington apresentou um ultimatum à
Espanha, pedindo satisfação dentro de três dias. Esse ultimatum era na verdade uma
declaração de guerra pois exigia que a Espanha renunciasse sua soberania na ilha de Cuba
e se retirasse imediatamente. Contudo, as hostilidades não começaram imediatamente. O
Jornal do Comércio do dia 2 de maio, num longo editorial dá conta de todos os preparati-vos
de ambas as partes, reservando as superioridade de fogo para os Estados Unidos. O
mesmo Jornal do dia 5 do mês de maio depois de longos comentários, transcreve todos os
atos do presidente Mac Kinley e do Congresso, relativos às hostilidades entre os Estados
Unidos e a Espanha, inclusive a resolução do Congresso aprovada em 20 de abril e que
serviu de base para a mensagem presidencial que declarava guerra à Espanha. A mensagem
do presidente também foi transcrita. Mas o Jornal do Comércio do dia 10 de maio depois
de tecer comentários vários sobre a guerra noticia compra de navios brasileiros pelos
Estados Unidos e transcreve um trecho do New York Herald de 18 de abril passado: “O
Brasil demonstrou novamente sua amizade para com os Estados Unidos consentido em
abrir negociações para a compra por esta governo de um outro navio de guerra, o Tupy. O
Brasil é a única nação sul-americana que tem tido a coragem de afrontar o desagrado da
Espanha vendendo navios aos Estados Unidos e seu proceder não será nunca esquecido”.
Ainda o Jornal do Comércio, do dia 15-05-98 com o subtítulo A Semana na guerra faz a
seguinte avaliação: “Finda hoje a semana sem que se tenha realizado o esperado encontro
entre as duas esquadras inimigas e sem que um combate decisivo, um fato proeminente
nos sucessos da guerra, dando manifesta vantagem a uma das forças em litígio, nos faça
prever o próximo termo de uma luta, que todos lamentamos”.
Em compensação, numerosos foram os incidentes que durante os sete dias da
semana finda nos anunciaram os nossos telegramas. No dia 9 registramos o aparecimento
da febre amarela nos navios da esquadra norte-americana; (...); no dia 10, as notícias de
Madrid continuam pouco tranqüilizadoras, repetindo-se na cidade e nas províncias motins
e tumultos”. No mesmo dia foi “lida no Congresso de Washington a mensagem do presi-dente
Mac Kinley comunicado a vitória dos norte-americanos contra os espanhóis em
convite, nas Filipinas”. E continua informando a chegada da esquadra espanhola de São
Vicente a Cadiz, e o próximo ataque a Porto Rico. No dia 12 foi nomeado governador
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militar das Filipinas o general Waley-Meritt. Bombardeio de Porto Rico no dia 13 e no dia
14 pormenores do combate de Porto Rico.
O início da guerra Hispano-Americana foi ilustrado na Revista Ilustrada nº 736,
de 1898, com a gravura que se segue.
O Jornal do Brasil do dia 16 de maio publicou, depois de longos comentários,
esta charge em que mostra a grande desproporcionalidade entre as forças navais de ambos
os países. De um lado a Espanha com apenas 17 navios de guerra sucateados, mal armados
JORNAL DO BRASIL
“RIO DE JANEIRO - Terça-feira 17 de maio de 1898
NOTAS AVULSAS, por Celso Herminio”
“A Hespanha acossada por tantos inimigos no interior e no exterior, apexar de tantos elementos de guerra
accumulados contra ella, luta cada vez mais valorosa e destemida”
“A GUERRA E A ATTITUDE DA EUROPA, por Celso Herminio”
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e de outro os Estados Unidos com 28 navios de guerra, todos de metal, armados com os
mais modernos equipamentos da época.
O Jornal do Brasil do dia 17 publica uma gravura em que mostra de um lado a
Espanha com armamentos inadequados e de outro os Estados Unidos a enfrentá-la com
armamentos sofisticados.
O Jornal do Brasil do dia 18 de maio apresenta a Espanha como toureiro a en-frentar
um homem armados (USA) e na assistência, indiferentes à sorte do toureiro estão
representadas as nações européias.
Depois de dois anos de guerra revolucionária com incalculáveis prejuízos socio-econômicos
e políticos, Cuba estava devastada. Os canaviais incendiados, os campos de
tabaco destruídos, a população diminuída e o comércio em decadência. As doenças e os
combates ceifavam numerosas vidas de ambos os lados. Mas se a Espanha não desejava
abandonar a ilha de um lado, do outro ela era de capital importância para os Estados
Unidos sob o ponto de vista econômico e geopolítico. Mas os combates continuavam, ora
com vantagens para os revolucionários, ora com vantagens para as tropas espanholas.
Nesse estado de coisas quem muito perdiam eram os comerciantes investidores estrangeiros
sobretudo norte-americanos. Depois da Espanha o país que maior investimento possuía na
ilha era os Estados Unidos. Daí o seu grande interesse no conflito que era entre espanhóis.
Diante desse impasse começa na ilha um movimento pela anexação de Cuba aos Estados
Unidos. E, então os partidários da causa cubana trabalham para que o presidente Mac
Kinley ofereça à Espanha comprar a ilha de Cuba por 400 milhões de dólares (Jornal do
Brasil, 24-05-97).
A oferta foi feita, o seu valor foi aumentado, mas a Espanha a recusou. Diante
dessa recusa, dentro dos Estados Unidos e na ilha, intensificou-se uma companha pela
anexação de Cuba. (Jornal do Brasil, 20-10-97).
A solução importa aos Estados Unidos era promover essa anexação pela guerra,
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para o que já vinha preparando. Foi iniciada a guerra, conforme já dissemos, com uma
grande superioridade dos Estados Unidos. Este país, usando da sua superioridade procurou
fazer uma guerra total à Espanha, atacando não só as tropas espanholas em Cuba mas nas
Antilhas, Golfo do México e nas Filipinas. Depois de dois meses de uma fulminante
campanha, a Espanha estava praticamente batida. O desenvolvimento da luta logo fez
compreender que se impunha o mais rápido possível a cessação das hostilidades e o
estabelecimento da paz. Então a Inglaterra e França se ofereceram para mediar uma
negociação, com os Estados Unidos. A Espanha aceitou a França, cujo embaixador em
Washington, apresentou ao presidente Mac Kingly em 26 de julho de 1898 uma mensagem
do governo espanhol em que declarava estar disposto a devolver a paz a Cuba e desejava
conhecer as bases sobre as quais o juízo do presidente dos Estados Unidos, poderia apoiar
um estado político definitivo para aquela ilha. A resposta do presidente Mac Kinley (31 de
julho) oferecia “a um adversário valoroso, generosas condições de paz”. E, eram estas: 1ª
Renúncia a Cuba e evacuação imediata da ilha. 2ª A título de indenização de guerra cessão
aos Estados Unidos e evacuação imediata da ilha de Porto Rico e todas as ilhas que a
Espanha possuía nas Índias Ocidentais, assim como uma ilha que a União escolhesse nas
ilhas dos ladrões. 3ª Os Estados Unidos ocupariam Manilha e sua baía até que o tratado de
paz determinasse o controle das Filipinas”.6
A Espanha não estava em condições de fazer exigências, por isso em 10 de
dezembro de 1898 firmou-se o tratado de Paris pelo qual a Espanha renunciou Cuba, Porto
Rico, todas as ilhas que possuía na América, todas as ilhas Filipinas e a ilha de Guam e
recebia uma indenização de 20 milhões de dólares.
Ao término da guerra, Cuba permaneceu sob o controle de uma junta militar dos
Estados, que em 1900 realizou a convenção constitucional cubana. Foi adotada uma
constituição baseada na Constituição dos Estados Unidos, sem estabelecer cláusulas quanto
às relações futuras com esse país. Mas o Secretário de guerra mandou informar à convenção
que a retirada do controle estava condicionada à inclusão de tais cláusulas. Essas conhecidas
por Emenda Platt, foram incorporadas à Constituição cubana e os Estados Unidos retiraram-se
em 1902.
NOTAS
1 CÉSPEDES DEL CASTILLO, Guilermo. “Textos y Documentos de la América Hispánica”, in: TUÑÓN
DE LARA, Manuel (dir.). Historia de España. Barcelona, Labor, 1988, p.430.
2 AGUADO BLEYE, Pedro y ALCÁZAR MOLINA, Cayetano. Manual de Historia de España. Madrid,
Espasa-Calpe, 1964, vol. III, p.746.
3 ESTRADA, Ezequiel Martínez. Martí: el héroe y su acción revolucionaria. Madrid, Siglo Veintireno,
1972, p.14.
4 ROBLES MUÑOZ, Cristóbal. “Negociàr La paz en Cuba (1896-1897)”, Revista de Indias, 1993, Vol.
LIII, nº 198, p.496.
5 ————— . op. cit., p.509/510.
6 AGUADO BLEYE, Pedro. op. cit. p.779.